sábado, 11 de junho de 2022

 

Racismo sem disfarces

 

Cesar Vanucci

 

“...estão afastados de nós como as

espécies animais da verdadeira espécie humana.”

(Adolf Hitler)

 

Causa espécie a insistência com que, em vários lugares, notadamente na Alemanha, Áustria e Itália, algumas pessoas procuram passar, na atualidade, a ideia de que Adolf Hitler surgiu para o mundo mantendo oculta, sob o disfarce de cordeiro, sua arrepiante condição de lobo voraz. Nada menos real. O Fuhrer chegou ao palco mundial – que nem uma bateria de escola de samba adentrando avenida com os tambores tonitruantes – a fala e pose “messiânicas”, anunciando a que vinha. Quem, dentre os líderes políticos, militares, religiosos da época, conservou os olhos acesos para enxergar e os ouvidos atentos para escutar, cansou de ver e ouvir, com sonora clareza, o recado assustador. 

Sem essa agora, portanto, de se querer confundir omissão e conivência com desconhecimento de causa. O chefão nazista escancarou, desde o comecinho de seu tenebroso itinerário, as garras afiadas do movimento luciferino de que se fez arauto. Apregoou, com palavras e atos, seu pérfido propósito de desmantelar estruturas de vida nucleadas nos valores humanísticos. Impulsionado por misticismo mórbido, com a cumplicidade das multidões de fanáticos aglutinadas em torno de sua desvairada doutrina, prometeu uma “nova era” refulgente para os “puros da raça ariana”. Intitulava-se o “redentor” prometido numa “curva decisiva do mundo”. Uma “hora mágica”, em que a “biologia mística” iria confrontar a “falsa rota do espírito”. A humanidade, segundo tão tresloucada linha de pensamento, abandonaria a crença nas coisas divinas, “ascendendo” a novos patamares em sua “evolução”. 

Nas Olimpíadas de Berlim, o Fuhrer deixou a tribuna furibundo, à hora em que um soberbo atleta negro, dos Estados Unidos, subiu ao pódio, depois de derrotar os oponentes “arianos”. Hitler não jogava com meias palavras para traduzir seu odioso racismo. Propagava sandices como esta: “judeus, negros e ciganos estão afastados de nós como as espécies animais da verdadeira espécie humana”. As perseguições ignominiosas aos judeus, que desembocaram no holocausto, irromperam antes mesmo de haver se apoderado do poder. Fica impossível admitir que a enlouquecedora conspiração contra os direitos humanos pudesse ser posta em marcha sem apoios ponderáveis da sociedade alemã, compreendidos aí militares, intelectuais, cientistas, políticos etc. No plano internacional, a grande maioria dos que viram e não gostaram, preferiu calar-se. O Fuhrer agregou simpatias declaradas ou prudentemente silenciadas em várias estruturas de poder. A Itália e o Japão renderam-se ao seu “fascínio”. Na Espanha, Franco assumiu o comando com sua ostensiva ajuda militar. Salazar, em Portugal, não ocultava admiração pelo ideário hitleriano. No Brasil, os integralistas bolaram um modelo de atuação de nítida concepção nazista. Nas vestes, no símbolo e na ridícula saudação. No sul do país, a suástica era desfraldada em algumas colônias germânicas. Nossa polícia política andou, em certa época, cooperando com a famigerada Gestapo. A Argentina de Perón, premida pela pressão internacional, só aquiesceu em considerar a Alemanha inimiga da humanidade no instante da capitulação do “Reich”. Os bolchevistas russos, durante o pacto de não beligerância, dividiram com a Alemanha o território polonês. Comunistas franceses chegaram a recepcionar as tropas alemãs em sua chegada triunfante a Paris. Caíram, mais tarde, na clandestinidade e tiveram papel preponderante na resistência. Na França ainda, houve o colaboracionismo da “República de Vichy”, liderada pelo marechal Petain, herói da primeira guerra mundial. 

Esses registros todos fazem-se oportunos pela circunstância de andarem soltos hoje por aí, em vários lugares, em atividades políticas e religiosas, à testa de correntes fundamentalistas rancorosas e radicais, repelidas pela consciência democrática universal, muitos apavorantes arremedos do “fuhrer”. 

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