sexta-feira, 24 de junho de 2016

Consulta popular 
na pauta


Cesar Vanucci


“ O ideal é partir para novas eleições e
o plebiscito é uma saída para viabilizá-las.”
(Senador Cristovam Buarque)


A tremenda encrenca armada pela incompetência, inabilidade, arrogância, improbidade de paredros políticos das diferentes tendências fez irromper no espírito popular a tese de que a “solucionática” – como diria nosso Dario -, para toda essa “problemática” vai acabar sendo um plebiscito. Noutras palavras: uma consulta popular que contemple a possibilidade de os eleitores retornarem às urnas mais cedo do que o previsto.

Seja para opinar sobre momentosos itens concernentes às indispensáveis e continuamente postergadas reformas, seja para apontar futuros governantes. Tem-se a esta altura como certo que um grupo representativo de parlamentares, com articulações centradas no Senado, agregando apoio de lideranças influentes noutros segmentos da vida nacional, vem consagrando atenção especial ao assunto. O debate a respeito está colocado na mesa.  E muitos adeptos da ideia não se furtam a fazer públicas suas opiniões.  O senador Cristovam Buarque, ex-Ministro da Educação, é um deles.  Sustenta que, na atual conjuntura, “o ideal é partir para novas eleições e o plebiscito é uma saída para viabilizá-las, pois está previsto na Constituição.” Acrescenta que “ao povo caberá decidir sobre o mandato que ele mesmo outorgou.”

João Capiberibe, Senador pelo Amapá, é outro defensor da proposta de antecipação eleitoral. Criticando o governo interino de Temer pela sucessão de equívocos e pela dubiedade das decisões, sugere que “o plebiscito seja realizado em 2 de outubro, concomitantemente com as eleições municipais.” Diz ainda que “falta aprofundar o debate sobre o modelo das novas eleições, se serão para um mandato-tampão de dois anos ou para um período maior.”

Não carece de dúvida mínima que Dilma Rousseff, mesmo na remota hipótese de vir a ser-lhe favorável a votação plenária sobre o impeachment no Senado, não disporá de condições de governabilidade, por ausência de apoio popular e político. Por outro lado, a administração Michel Temer não tem como, obviamente, garantir-se no comando administrativo por período mais dilargado. Revela-se igualmente desprovida de respaldo popular, maculada por gritantes contradições entre o que é anunciado e o que vem sendo efetivamente executado. Seus arranjos partidários em nada diferem dos esquemas fisiológicos condenados nas manifestações de rua ansiosas por transformações.

O plebiscito afigura-se, à vista dessas sonoras constatações, meio razoável de se desfazer o nó da crise política. Uma eventual eleição a médio prazo, com aval popular, poderá ser o caminho constitucional adequado para a dissolução de impasses daninhos que, neste preciso instante, comprometem barbaridade a atuação produtiva da Nação. O desencanto popular com a conduta de políticos é enorme, sabemo-lo. A consciência cívica e o sentimento democrático repelem “acordões” que possam abrandar as ações da Justiça contra corruptos e corruptores. Mas não desprezam a possibilidade de um acordo político estribado no bom-senso para a encrenca em que nos achamos mergulhados. A consulta plebiscitária é o caminho apontado. A decisão sobre os rumos a seguir fica com o povo, melhor dizendo com o poder supremo do País.


Mexer no time 
que está perdendo


Cesar Vanucci


“Para o diabo vá a razão 
quando o futebol invade o coração.”
(Carlos Drummond de Andrade)


O novo e retumbante fracasso da “legião estrangeira” convocada para representar a seleção canarinho na Copa América fez reacender os temores de que o Brasil venha a ser defenestrado nas eliminatórias para o mundial da Rússia. Em razão da tunda de 7 a 1 aplicada ao Haiti - um escrete de nível comparável aos aspirantes do Boa Esporte -, os “craques” incompetentemente comandados por Dunga, coadjuvado por Gilmar Rinaldi, conhecido agenciador de jogadores, sentiram-se os “maiorais”. Levaram a sério o “oba-oba” da cartolagem deslumbrada e de influentes segmentos da crônica esportiva, “empolgada” com a súbita “recuperação” do prestigio do “melhor futebol do mundo”... O triunfo contra o fraco Peru, “freguês de caderno”, afigurava-se “favas contadas”. A realidade revelou-se cruel. O sofrível desempenho na cancha escancarou, de vez, a indigência atlética do amontoado de jogadores “selecionados”.

Salta aos olhos, a esta altura do campeonato, que uma sequência amarga de fiascos coloca-se à espreita da seleção nos compromissos restantes pela conquista de lugar na representação americana do próximo torneio mundial. A não ser que seja processada urgentemente uma completa reformulação no sistema gestor de nosso futebol. Começando pela substituição do comitê técnico, por sinal já ocorrida, as impostergáveis mudanças precisam contemplar, sem delongas, entre outros tópicos, a escolha criteriosa e a metodologia adequada de preparação dos atletas.

A presença de Tite no comando técnico é, sem dúvida, um avanço. Ele é detentor de qualificações profissionais infinitamente superiores às de seus predecessores. Mas tal alteração não é por si só suficiente para afugentar a possibilidade do temido desastre. Partilhamos, convictamente, do ponto de vista expressado por observadores qualificados do “esporte das multidões” de que, antes de tudo mais, na sequência de medidas a serem adotadas, faz-se recomendável definir seja a base da seleção constituída, daqui pra frente, de elementos projetados nos torneios brasileiros.

O esquema de preparação do time para as competições carece de muita modificação. É essencial que o grupo se reúna com frequência. Nada de intervalos espichados de inatividade.

De outra parte, não há como deixar de classificar de suspeitosa essa desordenada chamada periódica dos “legionários” que militam no futebol europeu. Seja anotado, de passagem, que outros valores individuais também em ação em plagas estrangeiras, áreas geográficas diferentes, mesmo vivendo momentos reluzentes em suas carreiras, têm sido costumeiramente ignorados nas convocações. O foco dos “olheiros” fica fixado apenas no “mercado” europeu, sabe-se lá porque cargas d’água. As consequências desastrosas dessa orientação pouco inspirada estão traduzidas em frustrações contínuas, sobretudo a partir da vergonhosa sova de 7 a 1 diante da Alemanha. Dá pra perceber com nitidez, face aos revezes acumulados, que os “legionários”, despreparados e desmotivados, atenções centradas noutros aspectos de suas badaladas carreiras, não se aplicam nas intervenções em campo com o afinco desejável de alguém que esteja carregando nos ombros a invejável, posto que pesada, responsabilidade de envergar a camisa amarela nas competições internacionais.

Descortina-se, assim, com as experiências francamente adversas já colocadas em prática, a conveniência de se alterar o sistema das convocações. O ideal é que sejam, preferencialmente, abertas a jogadores que participem dos campeonatos nacionais. Assim era nos tempos vitoriosos de antigamente, quando os torcedores, ao contrario do que hoje acontece, sabiam declinar de cor e salteado os nomes dos integrantes da seleção. É óbvio que as escolhas desses atletas, ao lado de outras providências relevantes a serem adotadas, além das já citadas, obedeçam rigorosa e exclusivamente a critérios técnicos.  Fundamental que os gestores do trabalho de preparação do escrete saibam reagir com firmeza às pressões e intromissões provindas do jogo interesseiro de patrocinadores, agenciadores e outros que tais.


sexta-feira, 17 de junho de 2016


Cesar Vanucci

“Ele foi brilhante em tudo que botou a mão.”
(Antônio Luiz da Costa, comentando a obra de Mário de Ascenção Palmério)

Minha gente, eu vi! Vi de perto, testemunha ocular privilegiada, repórter e aluno atentos, a ascensão de Mário Palmério no cenário cultural. Bom lembrar, entre parênteses, que o homem já carregava orgulhosamente no meio do nome, desde a pia batismal, um Ascenção ao jeito de vaticínio. Disponho-me então a contar aqui, naturalmente preso às limitações do espaço, um pouco do que sei.

O ponto de partida foi um prédio adaptado às pressas na Manuel Borges, entre as ruas Major Eustáquio e Senador Pena. Ficava ao lado do Hotel Regina, dando frente pra sede da antiga Escola Normal. O Liceu do Triângulo Mineiro começou a funcionar no local com curso de admissão ao ginásio. Trocou as improvisadas instalações, em curtíssimo espaço de tempo, pelas edificações na Guilherme Ferreira. Esta avenida, recém-aberta, surgiu paralela à Vigário Silva, também conhecida por rua Grande (“tão grande, meu Deus, que dentro dela cabia todo o mundo maravilhoso da minha meninice”, na fala lírica do poeta-médico Paulo Rosa). Localização central, imediações do Mercado e da Penitenciária que, anos depois, se tornaria Escola de Medicina. O calçamento ainda não havia chegado àquele trecho da cidade. Um dos braços do Córrego das Lages – então, viçosa referência paisagística de Uberaba, ainda não soterrado em nome de questionável “modernice urbanística” -, escorria pachorrentamente por aquelas paragens em convite aberto a inofensivas peraltices dos estudantes “gazeteiros”. A moradia de Palmério e dona Cecília estava plantada no centro do vasto terreno, rodeada dos pavilhões reservados às salas de aula. O Liceu, da noite pro dia, virou Colégio e Escola Técnica de Comércio Triângulo Mineiro. Oferecia ginasial, científico, clássico e contabilidade em três turnos, além da novidade das salas mistas. As “inovações” escandalizaram os “tradicionalistas” daqueles tempos, tão submissos quanto os de agora a regras de vida rançosas. Seja anotado, a guisa de ilustração, que esse regramento dogmático das coisas costuma reproduzir-se que nem tiririca, desde que o mundo é mundo, como elemento cármico indissociável da aventura humana.

Minha gente, eu vi! Do arrojo empreendedor de Palmério nasceu um conjunto educacional opulento, sem similar (considerada a época) nos domínios da iniciativa privada.  A obra colossal foi sendo acrescida rapidamente de um punhado de Faculdades. Começando pela de Odontologia com sua policlínica de portas democraticamente escancaradas. Tudo na grandiosa empreitada suscitava compreensível admiração. E, também, um cadinho de desconfiança e ciumeira em redutos refratários a transformações sociais. “Onde é que esse cara, simples professor de Educação Física, pouco conhecido, pretende, afinal de contas, chegar com tantas “iniciativas temerárias” e esse jeito de ser ousado, rebelde a ponto de negar o indispensável tributo de vassalagem às elites dominantes?” Perguntas do gênero eram lançadas no ar em razão da impetuosidade das ações deflagradas. A acomodada paisagem citadina e regional foi sacudida com o incrementado projeto educacional pioneiro naquele momento. Uberaba tornou-se vanguardeiro polo de irradiação do ensino superior em vasto território de Minas e de Estados próximos. As conquistas foram extraordinárias. Influenciaram pra valer os hábitos comportamentais. O núcleo universitário operou como um verdadeiro laboratório de experiências sociológicas. Todos adquirimos nítida percepção do que andava rolando de totalmente novo nas atividades culturais, na política, na produção de bens de consumo, em todos os negócios comunitários, enfim.

Não saberia precisar com exatidão se Palmério quis, desde o princípio, chegar até onde chegou. O que sei é que ele enveredou, de repente, abrindo clareiras, em marcha batida de êxitos cumulativos, pelas veredas da política. Deputado Federal, liderou galhardamente grupamento partidário composto de elementos recrutados na vida acadêmica e meio operário. Comandados seus assumiram Prefeituras, assentos na Assembleia Legislativa e Câmaras Municipais, elegendo de quebra Juízes de Paz. Por conta de seus dons, entre eles o de bom tribuno, foi convocado a exercer as funções de Ministro de Estado e de Embaixador.

A invejável vocação literária aflorou durante o mandato parlamentar. Com os magníficos “Vila dos Confins” e “Chapadão do Bugre” Mário foi catapultado, pelo aplauso e reconhecimento da inteligência literária, a uma posição de inconfundível relevo na galeria dos grandes romancistas. Concederam-lhe na Academia Brasileira de Letras a cadeira que havia sido ocupada por João Guimarães Rosa. A singular capacidade de criação artística de Palmério manifestou-se ainda, pra surpresa de muitos, no plano musical. Na ocasião em que serviu como Embaixador no Paraguai, onde sua atuação foi considerada de invulgar brilhantismo, o homem notabilizou-se como autor de guarânias.  Apreciadores desse gênero musical relacionam suas composições entre as mais representativas da música popular paraguaia.

Minha gente, aqui está um pouco do que estou em condições de contar, neste minifúndio de papel (como diria o saudoso Roberto Drumond), o que testemunhei a respeito desse brasileiro genial, mineiro de Monte Carmelo, cujo centenário as letras literárias nacionais estão agora a festejar, que escolheu Uberaba como sua segunda terra natal e que nela, como em toda a região do Triângulo Mineiro, deixou vestígios inapagáveis de cintilante trajetória no processo da construção humana.



A charada de Nazca


Cesar Vanucci

 “Nazca saiu da sombra de um passado esquecido,
 para tornar-se célebre no mundo inteiro
 por seus extraordinários enigmas.”
(Simone Waisbard, escritora)

Visto do alto, da cabine do bimotor utilizado nos sobrevoos turísticos, o imponente “candelabro dos Andes”, incrustado na parte superior do imenso tabuleiro de granito da baia de Paracas, é uma sinalização muito bem feita com o claro intuito de chamar a atenção de supostos “viajantes do espaço”. Bem próximo dali, com seus incríveis bordejos pontilhados, espalhados por, aproximadamente, 500 quilômetros dos pampas desérticos, emitindo o mesmo tipo de sinalização, voltada para os céus, ficam as famosíssimas e enigmáticas linhas geométricas de Nazca. Uma charada de decifração quase impossível.

Ninguém que passe pela experiência do sobrevoo, ou mesmo se contente em utilizar, para a contemplação das pistas, os postos de observação, em pontos elevados, existentes no gigantesco sitio arqueológico, consegue conter a emoção que tudo aquilo provoca. O estado habitual dos espectadores, diante do espetáculo soberbo alcançado pelo olhar, é de puro êxtase. A visão costuma provocar lágrimas, quando não choro convulsivo.

Imersas num estado de espírito desses, entre comovidas e perplexas, as pessoas acabam se interrogando: mas, afinal de contas, o que foi mesmo que os geniais e ignotos construtores das pistas de Nazca e do “Tridente dos Andes” pretenderam deixar registrado com essa colossal “tapeçaria de pedras”, de sinalização copiosa, voltada exclusivamente e estridentemente para o alto?

O ciclópico quebra-cabeças, montado há milênios, foi produzido como? Com qual tipo de instrumentos mecânicos? Para quê? Por quem? A ideia de que representa algo correspondente a um cabo Canaveral da antiguidade remota faz sentido – como não? - para muitos. Essa conjectura remete a especulações infindáveis a respeito da suposta existência, repelida com veemência nos círculos acadêmicos, de uma astronáutica terrena, ou extraterrena, sabe-se lá, anterior à tecnologia espacial destes nossos tempos modernos. Mais uma fantástica ocorrência, de origem milenar, envolta nas brumas espessas do mistério.

Essas gigantescas figuras estilizadas de pássaros, plantas, seres envergando roupagens de astronauta para alguns, ou com aparência de “deuses” para outros; essas estranhas linhas, que lembram pistas de aterrisagem, encravadas no solo de areias lunares e rochas oxidadas da região de Nazca, no sul peruano, emitem sinais desconcertantes. E levantam interrogações sem conta. Perguntas inesgotáveis. Alguns cientistas, como é o caso notório da célebre arqueóloga francesa Maria Reiche, já falecida, com quem mantive agradável bate-papo há 30 anos, na primeira visita que fiz aos sítios arqueológicos peruanos, procuram encaminhar respostas convincentes às indagações que pipocam sem cessar, a respeito dos enigmas de Nazca. O que não é nada fácil.

O escritor J.J.Benitez (autor da fascinante saga “O cavalo de Tróia”) é de parecer que o mistério de Nazca continua de pé, desafiante. As teorias aventadas – e são muitas – coincidem em uma circunstância indiscutível: as figuras teriam sido executadas “para alguém que voava.”
Já no que concerne ao “candelabro” de Paracas, a tese defendida por Maria Belli de Leon parece ser a que melhor sintetiza as opiniões dominantes entre os estudiosos: o desenho gravado misteriosa e magneticamente na rocha direciona viajantes aéreos para as pistas de Nazca.

Uma coisa é absolutamente certa. A resposta definitiva às questões propostas pelo insondável mistério das linhas geométricas do deserto ainda está para ser dada. Se é que vai poder ser dada algum dia.


Uma maravilha 
no teto dos Andes

 Cesar Vanucci

“Um grande mistério petrificado!”
(Jacques de Lacretelli)


De volta ao Peru. É lá mesmo que os investigadores dos chamados fenômenos insólitos tropeçam, a cada momento, com alguns dos enigmas mais perturbadores deste nosso planeta azul. O foco de nossas atenções irá se concentrar agora em Machu Picchu. Localizada no teto dos Andes é considerada a “oitava maravilha do mundo”.

Estamos falando de um prodigioso complexo arquitetônico, erguido no fundo dos tempos, por toda a extensão, das fraldas à cumeeira, de um imponente maciço montanhoso da deslumbrante Cordilheira dos Andes.  Ninguém consegue explicar com precisão quais foram os recursos técnicos utilizados nas ciclópicas edificações. Para chegar até Machu Picchu a grande maioria dos turistas vale-se do transporte ferroviário. Mas não deixa de ser expressivo o contingente de pessoas, naturalmente dotadas de espírito aventureiro e bom preparo físico, que se embrenha, todos os dias, pelas chamadas trilhas sagradas na direção da “cidade perdida dos Incas”.

O trem que a gente pega em Cuzco serpenteia por paisagens de lindeza estonteante. A viagem dura mais ou menos seis horas. Os caminhantes, com seus pendores para o montanhismo, demoram de quatro a seis dias para cobrir a jornada, extenuante, mas repleta de fascínios. Uns e outros, carregando prazerosas emoções, que se vão acumulando na incessante contemplação de cenários de mágica beleza, se defrontam, no final do trajeto, com um espetáculo difícil de descrever em palavras. Machu Picchu esmaga. Extasia. Costuma arrancar lágrimas, quando não soluços. Não há como resistir ao seu encantamento.

Alcançamos o topo da montanha, após haver percorrido as diversas plataformas que abrigam incríveis muralhas e áreas presumivelmente dedicadas, em tempos imemoriais, a cultivo agrícola. De onde nos encontramos dá pra avistar um conjunto soberbo de montanhas, várias recobertas de neve. O olhar alcança, também, lá embaixo, quase ao nível da gare ferroviária do sopé da montanha, um fio prateado que avança por interminável desfiladeiro. É o célebre rio Urubamba, que nasce no alto dos Andes, atravessa o Vale dos Reis, onde engenheiros de tempos antiquíssimos represaram-no de forma impecável, de molde a causar espanto e deixar maravilhados seus colegas de profissão dos tempos de agora, indo despejar suas águas, centenas de quilômetros adiante, no Amazonas.

Do que está sendo retratado parece emanar um convite indeclinável à genuflexão. O impacto é muito forte. A mente é tomada por fervilhantes reflexões. As interrogações jorram. O que vem a ser, afinal de contas, tudo isso? Quem foram os construtores desse portento de engenharia dir-se-á sobre-humana? Quem habitou Machu Picchu? Quando? Quais – voltamos a perguntar - os recursos tecnológicos empregados na ciclópica empreitada?

Admitamos, para argumentar apenas, sejam procedentes as informações de alguns historiadores, que insistem em apresentar os incas dos tempos da colonização como os construtores da cidade. Como entender, a partir daí, que esses mesmos nativos, que somavam, de acordo com historiadores, milhões de criaturas à época da invasão espanhola, executada por uma legião numericamente insignificante de militares-aventureiros, se revelassem tão despreparados militarmente para enfrentar os vorazes e implacáveis conquistadores de suas cidades, terras e riquezas?

Foi em julho de 1911 que Hiram Bingham, apontado nos compêndios como “descobridor” dessa maravilha arquitetônica, seguindo roteiro traçado por peruanos conhecedores do complexo incrustado na montanha conhecida por Machu Picchu, divulgou para o mundo, além das fronteiras daquele país andino, a existência das colossais edificações. Nascia ali uma prodigiosa saga, vastamente explorada pelos estudiosos de civilizações desaparecidas, que crivaram o fabuloso achado arqueológico de interpretações as mais variadas e imaginosas, numa disputa que se arrasta até os dias de hoje. Jacques de Lacretelli resume a lendária história de Machu Picchu numa frase: “Um grande mistério petrificado.”



sexta-feira, 10 de junho de 2016






Por falar em vazamentos


Cesar Vanucci

“Transparência é uma coisa. Vazamento de informações  parciais, sabe-se lá com que intuito, é coisa bastante diferente.”
(Antônio Luiz da Costa, educador)

Vou logo avisando: ao contrário do que sucede com muitos colegas de profissão, não tenho qualquer acesso às chamadas “fontes bem informadas”. De outra parte, não mantenho contatos chegados com próceres que circulem desembaraçadamente em domínios onde vicejam tricas e futricas de bastidores que acabam fomentando versões as mais variadas dos acontecimentos políticos. Tampouco faço parte de qualquer movimento de militância partidária ou ideológica, redutos sempre férteis em informações e especulações em torno de questões momentosas que atraem os holofotes da mídia.

O que me impele a escrever as coisas que digo, no prazeroso desfrute de uma liberdade de expressão que cuido de preservar em singela trajetória profissional, é sempre fruto de meras percepções pessoais. Intuições – chamemo-las assim – brotadas de razoável leitura dos fatos históricos e de despretensiosa busca como simples cidadão de explicações relativas à conduta comportamental humana.

Escorado em tais premissas é que me animo a anotar, outra vez mais, a impressão de que esses desconcertantes vazamentos de trechos de delações feitas em segredo de justiça, escancarando situações estarrecedoras e diálogos chocantes, vêm obedecendo a um método encaixado em sibilinos propósitos. Mesmo que se tenha em conta – seja sublinhado em boa verdade -, como consequência altamente positiva, a circunstância desse tipo de divulgação proporcionar condições para desmascaramento de conluios perversos e de conjuras mafiosas processados em “arranjos” clandestinos de rematada politicagem.

Se a liberação dos dados, abrangendo geralmente papos altamente comprometedores obtidos via “arapongagem eletrônica”, obedece realmente, como tudo leva a crer, a um determinado padrão, não fica difícil a observadores atentos concluírem revestir-se de suma importância, para compreensão exata dos fatos, entender qual o verdadeiro propósito, em última instância, desse singular procedimento de característica sistemática.  É lógico o pressuposto de que os responsáveis pela condução das investigações judiciais alusivas aos malfeitos cometidos por dirigentes políticos, agentes públicos e empresários inidôneos, condenem os tais vazamentos. Afinal de contas, eles não se enquadram nos ditames da lei. Como acontecem com frequência, a despeito disso, fica evidenciado que pessoas ainda não formalmente identificadas, com acesso privilegiado aos processos sigilosos, vêm se sentindo inteiramente à vontade para antecipar revelações escolhidas que, a exclusivo critério delas (quem são?), produzam forte repercussão midiática. Quais os reais intuitos desses atos de manifesta infringência institucional? Dessa estratégica propagação de informações que, fácil deduzir, expõem mazelas, sem dar garantias de que não estejam também, estrategicamente, a omitir coisas desabonadoras? O que se esconde, vamos e venhamos, atrás dessa divulgação seletiva?

A sociedade sabe o que quer. Exige transparência absoluta nas palpitantes questões nacionais. Caso, sem tirar nem por, das averiguações legais em curso concernentes ao salutar combate à corrupção da hora atual. A transparência é medida de irrecusável significado ético no regime democrático.  Não pode jamais ser ignorada pelos poderes competentes como instrumento valioso de aprimoramento institucional. Nada de confundi-la, todavia, com esquemas de divulgação sem paternidade definida nascidos nas sombras que respondam a propósitos difusos ou obscuros, obviamente, inquietantes.


Num passado bastante remoto


Cesar Vanucci

 “Os vestígios estão aí. (...) Um desses incríveis e misteriosos  vestígios surgiu em um deserto peruano (...) nos arredores de Ica.”
(J.J.Benitez, jornalista e escritor espanhol)


O Peru é um espanto. E Ica, lugar rodeado pelas areias brancas e pedregosas do deserto de Ocucaje, merece ser apontada como um espanto dentro do espanto maior. A região adquiriu notoriedade mundial com descobertas assombrosas que ficaram conhecidas como “as pedras gravadas de Ica”. Uma espécie de “biblioteca na pedra”, pode-se dizer.

A capacidade investigativa e a perseverança à toda prova de um professor chamado Javier Cabrera Darques, peruano de inquebrantável vontade, colocaram a humanidade inteirada de achado fantástico. Um achado que desafia a argúcia de pesquisadores experimentados e coloca em xeque teorias e teses científicas pacificamente assimiladas no conhecimento consolidado dos homens. Está claro que sobrou para o desassombrado professor uma carga bastante pesada de incompreensões e doestos, como decorrência dos arrojados conceitos que ousou estabelecer à volta das descobertas.

A explicação trazida para os milhares de seixos gravados, de tamanhos diferenciados, que Cabrera conseguiu resgatar, de datação antiquíssima, consideravelmente distante dos tempos conhecidos (há quem fale até em milhões de anos), é desnorteante. Tudo aquilo nada mais significaria senão uma espécie de documentação deixada por civilização tecnologicamente avançada, que pretendeu passar para os pósteros a essência de suas experiências de vida.

E aí, como é que ficam as coisas? As pedras estampam cenas inacreditáveis do ponto de vista científico. Registram realizações inteligentes produzidas por alguém que dominava saberes incomuns nas áreas da astronomia, da astronáutica, da medicina. Falam das relações desse “alguém” com o meio ambiente, com a terra que povoava, com sua fauna e flora. Divididas em séries, ou capítulos, as pedras gravadas de Ica, no Peru, estão recolhidas em dois museus. Um deles pertencente ao Estado. Outro, mais bem provido de peças, organizado pelo próprio professor Cabrera.

Ao contemplarem os enigmáticos registros, as pessoas experimentam emoções fortes, que vão do deslumbramento à perplexidade. As revelações mexem com a cabeça. Revolvem conceitos solidamente enraizados na mente coletiva. Deixam os observadores comovidos. Por mais espantoso que possa parecer, entre as informações assombrosas transmitidas nos seixos existem descrições pormenorizadas acerca de transplantes de órgãos; sobre o código genético; sobre espaçonaves utilizadas em deslocamentos pelo campo azul infinito do céu.

Como é que haveremos de nos comportar diante desse recado fabuloso, provavelmente deixado por uma civilização que tomou rumo ignorado, após passagem por este nosso planeta azul? Um dos “capítulos” do documentário das pedras gravadas de Ica alude a uma viagem cósmica de colossais proporções. Seres desconhecidos, à maneira de um êxodo, provocado talvez pela proximidade de grande cataclisma, “anunciam” sua partida com o destino de um ponto qualquer na constelação das Plêiades.

O professor Javier Cabrera Darquea, num livro precioso, intitulado “As mensagens gravadas de Ica”, considera que os seixos “explicam, racionalmente, muito mais do que, até o momento, a humanidade atual tem considerado enigmas e fantasias em torno da existência passada do homem.” Vale a pena ler o livro. Vale a pena visitar Ica.




terça-feira, 7 de junho de 2016


UM CONVITE AOS APRECIADORES DA ARTE MUSICAL


Transformação social é a experiência que crianças e adolescentes vivem na ONG Orquestra Jovem das Gerais. Há dezoito anos, a Instituição desenvolve arte, cultura e educação na vida de seus alunos, que são moradores de localidades em situação de vulnerabilidade social em Contagem e municípios limítrofes.

Em agosto de 2015, a Orquestra Jovem das Gerais fez uma apresentação para a Comitiva do Vice Governador de Yamanashi (província Irma de Minas Gerais), em visita ao estado. A delegação  ficou emocionada  com a apresentação dos jovens musicistas, iniciando um dialogo para participação do Encontro Internacional de Orquestra de Jovens naquela província. Após verificação das possibilidades, o Governo de Yamanashi confirmou a Turnê Japão 2016 para o período de 28 de junho a 12 de julho, oferecendo a OJG o suporte necessário para a realização dos concertos e de um curso dentro da Fundação do Método Suzuki, em Matsumoto, a todos os músicos participantes da viagem. A OJG utiliza o Método Suzuki em seus ensinamentos e a oportunidade de um curso ministrado dentro da Fundação irá acrescer na formação musical de cada um dos jovens, que irão atuar futuramente, como jovens multiplicadores do projeto social.  No total, 28 alunos atendidos pelo projeto serão contemplados com a viagem.

Faz parte da programação da turnê, a participação nos encontros internacionais nas demais províncias  e concertos nos principais teatros de Yamanashi  com apresentação para um público  em torno  de 2000 pessoas.

Para ajudar na arrecadação de recursos financeiros para os custos da viagem, estamos promovendo o “Concerto do Bem”, no Teatro Francisco Nunes, no dia 16 de junho, quinta feira, às 19h30.
O programa do concerto é mesclado de obras eruditas e populares, além de músicas japonesas. Contará ainda com apresentações de danças japonesas e de taiko (tambores japoneses).

Assim, vimos convida-los para o Concerto, e contar com sua participação para ser mais um elo nesta corrente,  divulgando e convidando  seus familiares, amigos e colaboradores para assistirem o  “Concerto do Bem”, que tem como objetivo  arrecadar recursos para esta incrível viagem. Em anexo, segue o convite.

Ingressos antecipados:
- Consulado Geral Honorário do Japão em Belo Horizonte – Rua Paraíba, 1352  - Sala 1301 Savassi
- Sede da Orquestra Jovem das Gerais – Rua Dinamarca, 40 – Bairro Gloria/Contagem

Bilheteria do Teatro –Somente no dia 16/06/2016
 Av. Afonso Pena – Parque Municipal 
  Venham prestigia-los!!!

Agradecemos o apoio, o empenho e a colaboração de todos. Cordial abraço,  
 Yukari Hamada
Escritório do Cônsul Geral Honorário do Japão em Belo Horizonte





Mário Penna, Chico e Augusto

Cesar Vanucci


“Estou boquiaberto. Chico Xavier
anteviu este nosso encontro.”
(Augusto Cesar Vanucci, setembro de 80)



Em recente assembleia da Academia Mineira de Leonismo, braço cultural do Lions Clube, o Instituto Mário Penna, representado pelo diretor executivo Adair Fraga, homenageou a memória do mano Augusto Cesar Vanucci, antigo diretor da linha de musicais e humorísticos da Rede Globo, benfeitor da grande obra social sustentada por aquela organização.

O público tomou conhecimento, na ocasião, dos detalhes invulgares que tornaram o homenageado, de saudosa memória, colaborador importantíssimo, em hora decisiva, da benemérita instituição. Conto abaixo como isso se deu.

Atendendo a convite do Lions Inconfidência, à época presidido pelo engenheiro Reginaldo Sólon Santos, Augusto esteve em BH, setembro de 1980, para uma palestra na Federação das Indústrias. O então diretor do núcleo de programas musicais e humorísticos da Globo fez uma exposição, para plateia numerosa, sobre as infinitas perspectivas que se abririam, no futuro, na comunicação social em função dos vertiginosos avanços tecnológicos da era eletrônica.

Na recepção no aeroporto, Augusto Cesar, que acabara de conquistar o cobiçado “Emy” nos Estados Unidos com o programa “Vinicius para crianças”, aludiu ao fato de que estivera, horas antes, em São Paulo, com seu grande amigo Chico Xavier, cujo nome acabara de lançar, numa campanha que ganhou dimensão nacional, ao Prêmio Nobel da Paz.

Antes da assembleia, os promotores do encontro foram procurados pelo casal Adalberto e Beatriz Ferraz, de lembrança saudosa. Eles expressaram desejo de contato com Augusto, a fim de colocá-lo a par de um problema social aflitivo com pedido de que examinasse a possibilidade de se engajar, com outras pessoas de boa vontade, na cata de solução para o assunto. Ficou acertado um papo a respeito após a palestra. Numa máquina de escrever da secretaria da Fiemg foi elaborado ofício postulando apoio, assinado por Beatriz, Adalberto, Reginaldo, esposa Julinha e este escriba. O destinatário do ofício só tomou conhecimento dos fatos depois da exposição e, aí sim, participar da reunião com os signatários do oficio.

A correspondência entregue deu a conhecer a situação extremamente dramática vivida pelo Mário Penna, um hospital criado na base do idealismo e abnegação por um punhado de pessoas abrasadas pelo sentimento da solidariedade social. Concluído o relato acerca do drama enfrentado pela instituição, Augusto, possuído de forte emoção, revelou algo que causou estupefação geral.

Começou dizendo desconhecer, até o momento, a existência do hospital. Informou, ainda, que no contato em São Paulo, Chico Xavier lhe pedira, com empenho, naquele tom suave de voz todo seu, que não deixasse, jeito maneira, de atender a um apelo angustiado que lhe seria feito, em Belo Horizonte, no sentido de prestar ajuda a uma organização dedicada a assistir pessoas carentes. “Estou boquiaberto”, asseverou. “O Chico anteviu este nosso encontro”.

Os desdobramentos da história podem ser assim sintetizados. Augusto colocou-se, com ardor e entusiasmo, a serviço da causa. Tornou-se um de seus grandes benfeitores. O “Fantástico”, programa que criou e dirigia, reservou espaço em edições sucessivas ao problema das dificuldades do Mário Penna em se sustentar. A instituição foi inserida entre os beneficiários do “Criança Esperança.” No Palácio das Artes e no Mineirinho foram realizados, um atrás do outro, espetáculos de artistas famosos, inclusive do exterior, com renda carreada para a organização. A série de reportagens na televisão estimulou o governo federal a aplicar recursos na obra. O hospital Luxemburgo surgiu dentro desse contexto.

Creio desnecessário anotar que, em momento algum, Chico Xavier foi procurado, por qualquer dos elementos que conduziram a conversa com Augusto Cesar naquela noite na Casa da Indústria para atuar como intermediário na busca de auxílio ao hospital. Sua misteriosa intercessão correu por conta de desígnios situados bem além dos fundamentos lógicos aceitos nas relações sociais cotidianas.


Novo retrato de Deus

Cesar Vanucci

“Entre a provocação da fome e a superexcitação
 do ódio, a humanidade não consegue pensar no infinito.”
(Jean Jaurés, pensador francês)

Conformamo-nos, na rotina pachorrenta do dia-a-dia, com um desenho insuficiente de Deus. Um desenho espantosamente acanhado, pobre, limitado. Os traços brotam de concepções inseguras, falhas em definição, tudo no justo peso e medida das humanas fragilidades.

Vez por outra, uma sacudidela forte retira todos nós da acomodação, forçando reflexão mais aprofundada a respeito do real retrato do Criador de todas as criaturas e coisas visíveis e invisíveis.

Como aconteceu, pouco tempo atrás, com as eletrizantes fotos captadas pelo telescópio espacial Chandra nos confins do espaço sideral. Uma supernova - uma das quatrilhões, sextilhões ou mais de supernovas que vagueiam pelo campo azul celeste interminável do Cosmos - foi fotografada à distância inimaginável de seis bilhões de anos luz.

Cabe aqui fazer uma operação aritmética de queimar a mufa de qualquer vivente. De quantos segundos se compõe mesmo um ano inteiro? E seis bilhões de anos? Qual é mesmo, medida em segundos, minutos, horas, quilômetros, a distância que separa este nosso minúsculo planeta azul, uma ilhota perdida na infinita imensidão oceânica, pela velocidade da luz, que é de 330 mil quilômetros por segundo, dessa colossal supernova?

Tenha-se em vista, além de tudo isto, que o corpo celestial fotografado pelo telescópio, conforme atestam os cientistas, possui volume e luminosidade correspondentes a 10 (dez) trilhões de uma estrela do tipo do nosso imponente sol.

Seja considerado, também, que esses registros numéricos assombrosos são fragmentos minúsculos da incomensurável obra da Criação.

Não será o caso, aí, num momento tão especial de constatações fulgurantes mas óbvias, de a gente repensar a maneira de traçar o desenho real de Deus? 


Titicaca e o salto do jaguar

Cesar Vanucci

 “A quantidade de coisas que chama a atenção
 ajuda o bom senso na pista da explicação.”
(Gotthold Ephraim Lessing, 1729-1781)

Conhecidos que andaram visitando recentemente a Bolívia e o Peru comentam, embevecidos, as lembranças anotadas a respeito das deslumbrantes paragens percorridas. Seus relatos encorajam-me a falar de minhas experiências como repórter e turista em alguns dos locais citados. São sítios geográficos que representam, com seus marcos indecifráveis, um testemunho vivo do passado misterioso e eletrizante deste planeta azul.

Comecemos pelo Titicaca. Não é apenas um gigantesco lago. É mais uma porção de mar, de grandes proporções, que um colossal deslocamento dos elementos naturais em tempos imemoriais inseriu na acidentada geografia andina. A flora e fauna são típicas de água salgada. Pontilhado de ilhotas, o Titicaca abriga vestígios de civilizações desaparecidas. As famosas fortificações atribuídas aos incas aparecem em diversos pontos. O estilo arquitetônico é o mesmo observado em centenas de sítios arqueológicos dos altiplanos bolivianos e peruanos. Navios turísticos percorrem o trajeto entre um porto boliviano, próximo a La Paz, e o porto peruano de Copacabana, num espaço de tempo estimado em oito horas. Tempo razoável para que se possa admirar o cenário soberbo de um recanto cravejado de lendas e enigmas.

Um dos enigmas, provavelmente o mais atordoante, relaciona-se com a denominação dada a esse mar suspenso. No idioma aymara, falado pelos nativos da região, “titicaca” significa “o salto do jaguar”. Anotou aí? Vamos em frente. Nos anos 60, satélites estadunidenses colheram, a grandes altitudes, imagens do misterioso lago. As fotos deixaram cientistas embasbacados. A configuração do Titicaca é inacreditavelmente, precisamente, a de um jaguar saltando. A indagação irrompe inevitável: explique quem puder, como é que o povo aymara teve acesso a revelação tão estonteante, transmitida desde priscas eras de geração para geração? De quais recursos tecnológicos se teriam valido os ancestrais do Presidente Evo Morales, aymara com muito orgulho conforme confessa, para estabelecer essa inconcebível conexão entre o desenho geográfico, captado do alto, e a realidade prosaica de uma cena retirada de seu cotidiano como caçadores?

Perto do Titicaca existe um “museu antropológico” de idade remotíssima. Tiahaunaco, a uns 30 quilômetros de La Paz, é uma verdadeira maravilha arqueológica. Menos procurado do que outros sítios famosos dos Andes, como Machu Picchu e todo o conjunto fabuloso de fortificações das imediações de Cuzco (Peru), como Sacsuyaman, Pizac, Ollantaitambo, oferece grandiosidade equivalente a todos eles. No entender de reputados pesquisadores, a construção de Tiahaunaco se situa numa época que antecede em muito aos outros monumentos megalíticos bolivianos e peruanos. Acham até que as grandiosas edificações teriam surgido antes das próprias pirâmides do Egito, do México, da Guatemala, do Camboja.

A fabulosa “Porta do Sol”, com incríveis frisos e imagens, focalizada em numerosas obras dedicadas à arqueologia e ao estudo de fenômenos transcendentes, é uma das manifestações arquitetônicas impactantes do lugar. Das escavações emergiu também uma cidadela impressionante, menos conhecida. Com a dimensão de quarteirão urbano amplo, é constituída de pátios espaçosos e rodeada de colunatas. Na parte externa, esculpidas na rocha, aparecem incontáveis efígies com características anatômicas humanas. Entre uma efígie e outra há sempre uma diferenciação morfológica. Um rosto achatado ali, um nariz pontiagudo aqui, uma orelha abanada adiante, um terceiro olho na testa noutro desenho, tudo trabalhado com requinte artístico. Na interpretação de alguns arqueólogos, o que vem projetado é um culto de povos primitivos aos seus deuses... Já as lendas aymaras falam de coisa bem diferente. A cidadela seria uma espécie de museu antropológico. As imagens retratariam seres representativos de civilizações que, em tempos recuados da história, povoaram aquelas bandas misteriosas de nosso planeta.

Tem mais: os monumentos de Tiahuanaco pertenceriam, por suas características, a um instante da arquitetura diverso de outros monumentos, nos Andes, atribuídos ao engenho e arte da decantada civilização inca.




A SAGA LANDELL MOURA

Uma mulher rodeada de palavras

                             *Cesar Vanucci “Quem traz na pele essa marca Possui a estranha mania de ter fé na vida” (verso da canção “M...