A contraofensiva do Sistema
Cesar Vanucci *
“Nosso “spread”, como todos nós sabemos,
ainda é o maior do mundo.”
(Antônio Delfim Neto)
A leitura atenta dos jornais deixa-nos conhecedores de que o sistema financeiro já armou, nos devidos conformes, sua contraofensiva às ações da Presidenta Dilma em favor da redução dos juros. A estratégia montada é no sentido de tentar desqualificar as medidas saneadoras tomadas. Apontá-las como inócuas à luz dos sagrados cânones econômicos. E, até mesmo, atribuir a decisões governamentais menos inspiradas a culpa inteira no cartório pelas aberrações cometidas no rendoso jogo do crédito generosamente ofertado à incauta clientela.
Fica claro que a lengalenga marota, que encontra acolhedora cobertura midiática, não conseguirá sensibilizar a sociedade por inteiro. Mas, de qualquer maneira, o ingente esforço despendido com o fito de semear a confusão nos espíritos servirá a algum propósito menos edificante no terreno da contradita política. Ou poderá criar alguma celeuma que venha – quem sabe? - redundar em acertos de bastidores capazes de reduzirem, tiquinho que seja, a quota da contribuição esperada das instituições financeiras, dentro dos critérios definidores da responsabilidade social, para a almejada diminuição das taxas. Diminuição essa que, decididamente, não irá empobrecê-las, mas que, certeiramente, ajustará em termos civilizados a lucratividade descomedida, sempre crescente ano a ano, registrada em suas trilionárias operações.
A falta de sensibilidade social nesses meios confessadamente refratários à nova política de juros, louvavelmente implantada com gestos decididos pela Chefe do Governo, está refletida num sem número de comentários. Neles se projeta visível a intenção de ridicularizar o posicionamento oficial. Indiferentes, como é do feitio da espécie, ao sentimento popular, fingindo não saber do apoio e simpatia maciços da opinião pública às medidas anunciadas, portavozes do complexo financeiro vêm procurando, por todos os meios ao alcance, desacreditar a política de juros colocada em vigor. O economista chefe da Febraban, Rubens Sandesberg, deu o tom da contraofensiva. De forma sarcástica, anotou em relatório concernente a queda de juros, que o cavalo pode até ser levado à beira do rio, mas isso não significa obrigatoriamente que ele se disponha a beber a água. A parlatice foi de tal tamanho que alguns banqueiros, percebendo a indignação que a besteira cometida produziu no Planalto, resolveram maneirar um tanto quanto a barra, desautorizando a fala intempestiva de seu intérprete.
Mas a má vontade com relação ao assunto não cessou. O que levou Dilma a reiterar, com gestos expressos e com declarações peremptórias, batendo forte na cangalha pra turma entender, a convicção governamental – que de resto é a de todo vivente razoavelmente lúcido deste país – de que as taxas de juros não podem continuar situadas nos patamares himalaianos escalados pela ganância e irresponsabilidade social. “Os bancos não podem continuar cobrando os mesmos juros para empresas e para o consumidor, enquanto a taxa básica Selic cai, a economia mantem-se estável e a maioria esmagadora dos brasileiros honra com presteza e honestidade os seus compromissos”, foi o que disse no pronunciamento presidencial no “Dia do Trabalhador”.
No arremate destas considerações, nada mais apropriado para acentuar o acerto das medidas governamentais no tocante aos juros do que estas palavras de um economista que passa, costumeiramente, a impressão de saber do que está falando: “O governo age corretamente, com uma política absolutamente transparente para baixar os juros. O que o Ministério da Fazenda e o Banco Central especialmente têm feito é conversar com os bancos e analisar os componentes do “spread” que, como todos nós sabemos, ainda é o maior do mundo. É razoável, portanto, que se deva esperar uma redução desse “spread”. O nome do economista é Antonio Delfim Neto.
Neobobice vernacular
“Essa língua (...) é a nossa língua”
(Raquel de Queiroz)
Até hoje o Congresso Nacional não aprovou o projeto do ex-deputado Aldo Rebelo, hoje Ministro dos Esportes, que regulamenta o emprego de expressões estrangeiras em eventos públicos, meios de comunicação, estabelecimentos comerciais, educandários, embalagens de produtos, por aí. Traduzindo, de certo modo, o inconformismo da sociedade diante dessa onda abobalhada de estrangeirices vocabulares que nos assola, o projeto é visto, por muita gente de peso intelectual, como uma tentativa louvável de se deter o processo, em marcha acelerada, da desnacionalização idiomática, com todos os seus nefandos desdobramentos culturais nas práticas cotidianas. Tudo fruto de indigência cívica, pauperismo intelectual e de rematada panaquice, sinais inequívocos da atmosfera que se respira em ambientes despojados do sentimento de brasilidade.
Mesmo não conhecendo na íntegra o projeto e imaginando, à vista disso, possa uma que outra disposição do texto comportar questionamentos, ou mudanças, como propõem alguns, não há como deixar de aplaudir na essência essa iniciativa, por representar reação que já vem tarde contra a neobobice vernacular que nos agride nos lares e nas ruas.
Muita gente, atingida pelos modismos moderneiros, encontra dificuldades em entender coisa tão curial: o idioma é a pátria. É o símbolo – o mais reluzente – da nacionalidade. Projeta, com dinâmica própria, o nosso modo normal de expressão, o nosso jeito de ver e sentir. As emoções puras e generosas da gente do povo. O idioma conta e canta a nossa cultura, nossos feitos e realizações. Mantém-nos íntegros e individidos em nossos sagrados domínios territoriais. Domínios territoriais, aliás, tão cobiçados pelo aventureirismo beligerante e ardiloso destes tempos de globalização fajuta.
Posto que a língua falada no Brasil é o brasileiro, um dos muitos idiomas saídos do português, já vem passando a hora de uma vigorosa resistência contra a tendência, de inocultável frescurice, da utilização, a três por quatro, em tudo quanto é canto, de vocábulos estrangeiros para classificar situações e coisas óbvias.
O aprendizado de outros idiomas é parte relevante na preparação do homem para o instigante jogo da vida. É o caso do inglês e do espanhol, por exemplo, ou o mandarim, talvez mais na frente. Mas a busca do aprendizado de outras línguas não pode significar que a gente deva ou precise esquecer a língua da gente. Isso remete a texto precioso de Eça de Queiroz. “Um homem só deve falar, com impecável segurança e firmeza, a língua da sua terra; todas as outras as deve falar mal, orgulhosamente mal, sem aquele acento chato e falso que denuncia logo o estrangeiro.” Como? O ilustre leitor destas maldigitadas acha que a tintura nacionalista do mestre está forte por demais?
Respondo à observação com uma pergunta: mas será que o momento, face às heresias vocabulares soltas por aí, com base no inglês “more or less”, não está a clamar por posições desse jaez, de claro destemor cívico, que resguardem o nosso patrimônio cultural? Muitos os abusos. Os impropérios linguísticos. O idioma do Brasil é o idioma brasileiro. Ponto final.
É preciso deixar explícito que aos brasileiros aborrece – e muito – esse negócio de cardápio em restaurante e de saldo de retalho de loja anunciados em língua de gringo; de veículo carregando no pára-choque bobagens do tipo “My other car is a plane”, ou de “God bless America”; de repórter de tevê a falar de “break”, e de incontáveis babaquices assemelhadas. Isso sem falar na nomenclatura aplicada aos dispositivos que acionam as engenhocas eletrônicas que estes tempos tecnológicos introduziram estrepitosamente na vida do cidadão comum.
Isto posto não há como não classificar de bem-vinda a disposição parlamentar de se por freio nisso tudo.
Levar logo o projeto para discussão, alterações nas Comissões, voto em plenário e sanção presidencial é uma boa.
* Jornalista, (cantonius1@yahoo.com.br)