segunda-feira, 21 de novembro de 2011

As grandes potências


Cesar Vanucci *

“Toda grande potência troça dos demais.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)

As grandes potências são contra a bomba. Dos outros. Possuem estocados artefatos nucleares suficientes para destruir a galáxia inteira. Falam, de vez em quando, até em colocar em órbita permanente no espaço sideral, em caráter naturalmente “preventivo", satélites equipados com suas armas de devastação definitiva. Continuam a desbravar os assustadores domínios bélicos da energia atômica, patrocinando experiências nunca interrompidas, apesar dos propósitos de não beligerância proclamados em exasperante retórica. Viram bicho, vociferam ameaças de fazer estremecer céus e terras quando um país não pertencente ao seu fechadíssimo clube, dá mostras de querer "quebrar a paz e a harmonia mundiais", que elas, as grandes potências, tão bem têm sabido preservar, sabe lá Deus como. Entenda-se como tentativa de ruptura com a paz, tranquilidade e harmonia reinantes neste nosso planeta qualquer iniciativa que leve à construção de uma bomba como aquelas que reduziram a pó as cidades japonesas de Hiroshima e Nagazaki. As grandes potências fazem sempre questão, em seu alardeado apego à paz, de deixar consignada sua posição contrária à bomba. Dos outros.

As grandes potências manifestam-se contrárias também às armas bacteriológicas e quaisquer outras armas que provoquem a destruição em massa de vidas e patrimônios. Armas dos outros, bem entendido. No que lhes diz particularmente respeito, têm na conta de um direito de outorga divina o armazenamento, em silos subterrâneos, de milhões de frascos com toda sorte de vírus mortíferos. Tão mortíferos que podem, a umas poucas aplicações na atmosfera, em reservatórios de água, em locais de grande concentração, varrer da face da terra, em curtíssima fração de tempo, toda manifestação de vida humana.

As grandes potências, em passado não muito distante, demonstraram não ser favoráveis à derrubada de aviões clandestinos que eventualmente possam cruzar o espaço aéreo dos territórios nacionais. Dos outros. Fizeram saber, na ocasião, por intermédio de suas chancelarias, que lhes aborreceria imaginar nações emergentes, como (por exemplo) o Brasil, a aporem sua concordância num pacto internacional favorável ao abate de aeronaves que violassem sua soberania. Por conta dessa recomendação das grandes potências, o Brasil (por exemplo) colocou-se, anos a fio, até uma ruptura com o abuso tomada no governo FHC, na condição de impotente espectador diante do fato perturbador de aviões de diferentes procedências, transportando drogas, contrabando, produtos de pirataria ecológica, a singrarem de lado para outro os céus da Amazônia. Onde, aliás, sem permissão oficial, andou circulando, também, algum tempo atrás, todo desenvolto, com “direito” a aterrissagem e tudo mais, sem pedido oficial prévio de pouso, um avião de transporte militar francês conduzindo oficiais de alta patente para negociar resgate de reféns com guerrilheiros colombianos. Depois da intolerável façanha, diante de protesto formal do Itamarati, a chancelaria do “Champs Elysées” formulou pedido de esfarrapada desculpa.

As grandes potências declaram-se sempre, além do mais, contrárias a violentação do meio ambiente. Quando praticada pelos outros. É claro. Costumam recusar-se, na parte que se lhes toca, a botar em prática, mesmo quando as subscrevam, resoluções que forcem seu parque industrial a reduzir a carga de poluentes despejada na atmosfera, causa principal do constante adelgaçamento da camada de ozônio.

As grandes potências são contra ainda os subsídios agrícolas e outras formas de protecionismo mercadológico. Dos outros. No plano doméstico, deitam e rolam com relação aos mesmíssimos procedimentos que, farisaicamente, condenam em ações alheias. Não se enrubescem em adotar, no tocante às ações dos outros, ferozes represálias.

Conclusão a extrair dos fatos. As grandes potências estão contra. Os outros.



Um artista gigantesco


“Precisamos de afeição e doçura.”
(Charles Chaplin)

Charles Chaplin não foi apenas grande, ele foi gigantesco. É o que constata – fico sabendo pela “Wikipédia” – o escritor estadunidense Martins Sieff ao comentar livro que focaliza a vida do criador do imortal Carlitos.

Alçado à categoria dos cineastas do time titular desde o cinema mudo, onde usou e abusou com talento e originalidade dos recursos da mímica na chamada “comédia pastelão”, Chaplin encantou, enterneceu e arrebatou multidões. Alguns dos filmes que produziu e interpretou - caso, por exemplo, de “Luzes da Cidade” - conseguiu mesclar imagens e lirismo num grau de intensidade quase impossível de ser reproduzido em qualquer tipo de entretenimento, por mais criativo e refinado que possa ser.

Sua contribuição ao desenvolvimento do cinema, como produtor, diretor, autor, ator, empresário (ele bancava seus filmes) valeu-lhe prêmios e condecorações que, bem provavelmente, ninguém do ramo, depois dele, jamais conseguiu alcançar. Falecido aos 88 anos, em 1977, tornou-se personagem lendário na história cultural do planeta.

Menos conhecidas de que suas obras cinematográficas, suas citações e registros literários ajudam a compor-lhe o perfil de homem sábio, genial, sensível aos dramas humanos.

Aqui estão algumas amostras de sua interpretação das coisas da vida.

Sobre a humildade: “Pensamos demasiadamente / Sentimos muito pouco / Necessitamos mais de humildade / Que de máquinas. / Mais de bondade e ternura / Que de inteligência. / Sem isso, / A vida se tornará violenta e / Tudo se perderá.”

Sobre o homem: “Conhecer o homem – esta é a base de todo o sucesso.”

Assunto importante: “O assunto mais importante do mundo pode ser simplificado até ao ponto em que todos possam apreciá-lo e compreendê-lo. Isso é – ou deveria ser – a mais elevada forma de arte.”

Sobre a vida: “A única coisa tão inevitável quanto a morte é a vida.”

Sobre a felicidade: “Não preciso me drogar para ser um gênio. Não preciso ser um gênio para ser humano. Mas preciso do seu sorriso para ser feliz.”

Uma proposta de reformulação do ciclo da vida (recentemente um outro cineasta lançou curioso filme em que o personagem, a exemplo do que é colocado linhas abaixo por Chaplin, nasce idoso e vai se tornando mais jovem à medida que o tempo rola): “A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina. Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás pra frente. Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso. Daí viver num asilo, até ser chutado pra fora de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante pra poder aproveitar sua aposentadoria. Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara para a faculdade. Você vai para colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta pro útero da mãe, passa seus últimos nove meses de vida flutuando. E termina tudo com um ótimo orgasmo! Não seria perfeito?”

Sobre o relacionamento humano: “Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha, é porque cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e não nos deixa só porque deixa um pouco de si e leva um pouquinho de nós. Essa é a mais bela responsabilidade da vida e a prova de que as pessoas não se encontram por acaso.”

Nada é permanente: “A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos. Nada é permanente nesse mundo cruel. Nem mesmo os nossos problemas. A vida é uma tragédia quando vista de perto, mas uma comédia quando vista de longe.”

Pecado e virtude: “Creio que o pecado é realmente um mistério tão grande como a virtude.”

Sobre a beleza: “A beleza existe em tudo – tanto no bem como no mal. Mas somente os artistas e poetas sabem encontrá-la.”

Homens e máquinas: “”Não sois máquinas! Homens é o que sois!”

Humanidade: “Mais do que máquinas precisamos de humanidade. Mais do que inteligência precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes a vida será de violência e tudo estará perdido.”

O melhor autor: “O tempo é o melhor autor. Sempre encontra um final perfeito. Cada segundo é tempo para mudar tudo para sempre.”

A busca do céu: “Se não consegues entender que o céu deve estar dentro de ti, é inútil buscá-lo acima das nuvens e ao lado das estrelas. Por mais que tenhas errado e erres, para ti haverá sempre esperança, enquanto te envergonhares de teus erros.”

(cantonius1@yahoo.com.br)

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Histórias de quadrinhos


Cesar Vanucci *

“Nocivo alimento mental proporcionado
à infância e à juventude.”
(Vivaldo Coaracy, numa critica,
nos anos 50, aos quadrinhos)

Meninos, eu vi. Ninguém me contou. Eu é que vi. Deu-se nos distantes tempos da meninice. A escola primária ficava perto de casa. As sacolas para carregar livro, caderno, lápis, borracha, régua e apontador eram submetidas, dia sim, outro também, a revistas executadas no capricho pelas diligentes ajudantes da secretaria, com seu olhar inquisidor e disposição nada complacente.

Tais revistas colocavam sob dardejante mira – o trocadilho no caso vem pronto – “revistas inconvenientes”. Publicações que adultos cônscios de seus sagrados deveres, guardiões impertérritos dos valores familiares, catalogavam na conta de atentatórias à moral e aos bons costumes. Material vulgar, despojado de mérito literário, subversivo do ponto de vista pedagógico e cultural, na abalizada e inquestionada avaliação da zelosa diretora e conspícuos integrantes do abalizado corpo docente do estabelecimento. Desenhos e textos nocivos que desestimulavam os jovens a desenvolverem o gosto pela leitura, o saudável hábito da frequência aos livros.

Agravando tudo, a opinião inquestionada dos eméritos educadores batia com a de extremosos pais e a de doutos representantes do Juizado de Menores. Os comissários do Juizado, geralmente voluntários, orientados pelo titular da Vara, costumavam, até mesmo, de quando em vez, em sortidas moralizantes, aplaudidas pela comunidade, visitar bancas de venda, com o meritório propósito de impedir o repasse a menores das extravagantes publicações, que tanto mal disseminavam pela aí. Ler ou ter sob posse um gibi era coisa inominável, deletéria, malsã. A restrição severa fazia da “infração” pecado mortal, a ser expungido da consciência pesada dos garotos enredados nos “delitos” com manifestações sinceras de arrependimento, se possível, no confessionário.

Meninos, eu vi. Vi, muitas vezes, escolar pego no flagra com histórias de quadrinhos na sacola a receber exemplar punição pela gravíssima falta cometida. Revistinha apreendida, na sala da diretora, o guri ouvia, cabisbaixo, severa admoestação. Se configurada reincidência, era convidado a estender a mão para receber os impactos doridos da temível palmatória. O castigo podia comportar outra alternativa. Quinhentas ou mil linhas depois das aulas. Uma repetição interminável, no caderno, de frase contendo o solene compromisso de nunca mais incidir no abominável erro.

Rememorando esses lances desconcertantes, relacionados com o absurdo preconceito vigente, muitas décadas atrás, quanto aos quadrinhos, sinto até um certo embaraço em acrescer ao relato feito outra cabulosa revelação, pertinente a ocorrências das quais fui também testemunha, com estes olhos que um dia a terra vai comer (só que, dependendo de minha exclusiva vontade, daqui um tempão). Gibis arrancados das mãos e pastas da petizada devorados por “saneadoras” labaredas no pátio da escola, debaixo de gáudio inquisitorial, para não sobrar dúvida alguma quanto à influência daninha que essa modalidade marginal de comunicação exercia no inocente espírito infantil.

Tão efervescentes relembranças chegam por causa de mais um FIQ. Festival Internacional de Quadrinhos, evento realizado sempre com absoluto sucesso, na capital das Gerais. Reconhecido como o maior evento de quadrinhos da América Latina, com convidados de todas as partes do mundo, contando com o patrocínio da Fundação de Cultura e ilustres parceiros. A programação abrange, a cada versão, exposições, oficinas, palestras, debates, mostras de filmes e, obviamente, enorme e esplêndida feira de quadrinhos. Na realidade, o que se vê e se aplaude nessa iniciativa cultural é uma explosão feérica de talento, criatividade e arte. Uma demonstração exuberante da importância do quadrinho como expressão nobre da cultura popular.

E os contestadores, daqueles tempos, das histórias em quadrinhos, que consideravam o gênero um processo terrorista destinado a abalar os alicerces da cultura e da inteligência humana? E aqueles que viam nos cosmonautas do gibi, singrando o campo azul do céu em suas espaçonaves, atiçando a imaginação infantil e devassando os horizontes insuspeitados do porvir, um símbolo repulsivo de degradação cultural? Será que algum dia qualquer, mais pra frente, tiveram consciência de terem estado presos a fossilizados paradigmas culturais, à uma acanhada percepção dos fenômenos sociais, que impediam compreendessem a extraordinária revolução que se processava debaixo de seu vesgo olhar de censura e desconfiança? Será que entenderam, nalgum momento, que as historietas tão bem boladas de Flash Gordon, para ficar num único exemplo de “herói dos quadrinhos”, tanto quanto os livros de astronomia, ajudaram a escancarar nossa visão para os prodígios da vastidão cósmica? Fizeram desabrochar as potencialidades da mente com relação a achados tecnológicos assombrosos?

As fogueiras acesas com gibis, as machucaduras produzidas pelas palmatórias, as cansativas e exasperantes linhas, as admoestações com toque policialesco não conseguiram, visto está e o FIQ comprova isso, sofrear os avanços humanos, em matéria de interpretação da vida, propostos pelas fascinantes histórias em quadrinhos. Isso aí!



O que querem os Professores



“Grevista é alguém que deixa,
às vezes, de trabalhar para poder trabalhar.”
(Julio Camargo)

Houve considerável esforço, com o prestimoso concurso de boa parte da mídia, em se rotular de “política” a recente greve dos professores da Rede Estadual de Educação.

O movimento, com extensão de quase três meses e repercussões marcantes em todas as áreas da comunidade, agregou compreensivelmente expressivos apoios políticos, em todos os partidos por sinal, mas não foi inequivocamente uma “greve política”, na caracterização depreciativa incorretamente propagada. O que a incalculável multidão composta de profissionais da educação, concentrada diariamente nas imediações do Parlamento Mineiro, cuidou de transmitir às autoridades e à sociedade foi seu justificável inconformismo diante do tratamento injusto que se lhe tem sido dispensado ao longo dos anos em razão de uma política remuneratória que faz questão solene de ignorar direitos elementares e que, arrogantemente, menoscaba até decisões transitadas em julgado. Diante da incompreensível resistência dos setores competentes em se sentarem à mesa para as negociações recomendáveis, à categoria não sobrou outra alternativa senão a da paralisação das aulas, com todas as consequências desagradáveis daí advindas. Ninguém de bom senso ousará por certo classificar de extravagante ou absurda a pretensão dos educadores. O que simplesmente almejam é se verem contemplados com salários que respeitem o piso fixado pela Suprema Corte, ou com estipêndios (vá lá!) equivalentes, pelo menos, aos de outras respeitáveis categorias do serviço público. Soldados da PM em início de carreira, pra ficar num exemplo.

A providencial intervenção de parlamentares, conscientes da extensão e gravidade do problema e da legitimidade das reivindicações trazidas pelos agentes da Educação, recolocou a candente questão nos trilhos certos. Fica-se a esperar agora, com as portas finalmente abertas ao diálogo, instrumento democrático importantíssimo na construção de convergências, infelizmente desprezado a princípio pelo Governo, que se chegue logo, nos entendimentos em curso ao tão almejado desfecho dessa situação. Um desfecho que implicará inapelavelmente, a prevalecerem o bom senso e a consciência social, no reconhecimento das postulações da classe, que outra coisa não significam além de um brado carregado de expectativa e esperança em favor da dignidade profissional.

Estou sendo posto a par, no momento preciso em que estas considerações são encaminhadas à publicação, de uma inesperada contramarcha nas negociações entre as partes. Faço votos para que o impasse seja o mais rapidamente possível contornado, de maneira a ficarem resguardados todos os respeitáveis interesses colocados em jogo nessa momentosa questão.


* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

sábado, 12 de novembro de 2011

O lado místico de Rosa

Cesar Vanucci *

“Mexendo em velhos papéis, encontrei
um texto precioso de Guimarães Rosa...”
(Luiz de Paula Ferreira, escritor)

Guima são muitos. O universo literário rosiano, povoado de pontos cintilantes, parece ser regido pela mecânica cósmica da expansão contínua. Ganha, de tempos em tempos, nova dimensão. Os observadores deparam-se, ao devassar com suas lunetas os horizontes ilimitados da obra do autor de “Sagarana”, com descobertas as mais fascinantes. Nenhuma delas ofusca a outra. Tudo faz parte de um todo harmonioso, que fala das múltiplas e inesgotáveis facetas de um gênio da criação literária. Um intelectual que escalou altitudes himalaianas e soube, como bem poucos, valer-se do recado artístico para atingir, certeiramente, as profundezas da alma humana.

Guimarães Rosa são muitos. E, singularmente, único, sem que se possa vislumbrar na afirmativa qualquer paradoxo. Revela-se único ao ostentar - categorizado mensageiro da boa palavra literária, da palavra que encanta e arrebata - essa profusão de saberes incomuns que tornam tão reluzente o seu legado de idéias.

Há o Guimarães recriador de linguajares de ricas cadências e tinturas. Há o paisagista de um sertão bravio, espantosamente real. Uma faixa de chão de consideráveis proporções dominada por ritmos e critérios peculiares de vida, inalcançáveis na visão utilitarista urbana. Há o retratista portentoso de perfis inesquecíveis. Desenhista de tipos esfuziantes na maneira singela de agarrar as dádivas da vida, projetados das emoções e paixões das multidões anônimas. Há o contador insuplantável de estórias brotadas das vivências simples da gente do povo, com seus ditames éticos rudes que costumam ressoar incompreensíveis em ouvidos eruditos. E há, ainda, o prosador clássico dos achados poéticos inebriantes, das metáforas antológicas e das alegorias eletrizantes. “O alquimista do coração”: é assim que ele é mostrado em livro do escritor mineiro José Maria Martins. Sua literatura, segundo ainda o escritor citado, é levada a extremos de sutileza e inovação, ampliada “a recantos do mar da existência nunca d’antes explorados”, já que ele “tinha a capacidade de transpor a fronteira que separa o universo das manifestações temporais daquele da casualidade profunda”.

E eis que, agora, de repente, nas imediações dos 55 anos do lançamento de “Grande Sertão, Veredas”, desponta um Guimarães Rosa de insuspeitados (e confessos) envolvimentos com as manifestações mágicas, de certo modo inextricáveis, da paranormalidade. A intrigante revelação chega por intermédio de um respeitado intelectual, com apreciável contribuição à causa da cultura. O meu dileto amigo, Luiz de Paula Ferreira, escritor, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas, figura de relevo na cena empresarial. A carta que me envia diz tudo: “Prezado Cesar, Mexendo em velhos papéis, encontrei um texto precioso de Guimarães Rosa, publicado há quase 40 anos no “Estado de Minas”, citando fenômenos paranormais presentes na vasta produção literária que lhe valeu merecidamente ser incluído na relação dos 100 maiores escritores de todos os tempos. Conhecendo seu gosto pelo estudo de fenômenos dessa natureza, estou anexando o texto que é muito rico e merece ser avaliado e divulgado em suas crônicas. Referindo-se ao “Grande Sertão, Veredas”, ele diz: “Quanto ao “Grande Sertão, Veredas”, forte coisa e comprida demais seria tentar fazer crer como foi ditado, sustentado e protegido por forças ou correntes muito estranhas.” Do amigo, Luiz de Paula Ferreira”.
No artigo em questão, Guimarães solta o coração para confissões que abrem instigantes perspectivas na avaliação de sua fabulosa obra. Comenta seus “sonhos premonitórios, telepatia, intuições, séries encadeadas fortuitas, toda a sorte de avisos e pressentimentos.” Um texto preciosissimo que deixa evidenciados, em boa interpretação parapsicológica, os dons paranormais de que o escritor era, indiscutivelmente, possuidor. Na sequência, a reprodução desse escrito surpreendente.


A confissão de Guimarães

“Sua obra suscita mais tentativas de decifração
do que a de qualquer outro escritor.”
(Paulo Rónai)

Conforme já contado, Guimarães Rosa confessou, 40 anos atrás, em artigo no “Estado de Minas”, reavivado pelo escritor Luiz de Paula Ferreira, seu entranhado envolvimento com fenômenos ligados às percepções extra-sensoriais. Do instigante texto ressalta claro que sua obra literária – obra que “suscita mais tentativas de decifração do que a de qualquer outro escritor”, segundo Paulo Rónai – foi marcada, desde sempre, por intuições e impulsos mágicos, de nítida configuração parapsicológica, inexplicáveis à luz do conhecimento consolidado.
Mas já é tempo de satisfazer a curiosidade do leitor, a respeito da confissão do autor de “Tutaméia”, falando de seus dons paranormais. O artigo tem por título “Vida – arte – e mais?”.
“Tenho de segredar que – embora por formação ou índole oponha escrúpulo crítico a fenômenos paranormais e em principio rechace a experimentação metapsiquica – minha vida sempre e cedo se teceu de sutil gênero de fatos. Sonhos premonitórios, telepatia, intuições, séries encadeadas fortuitas, toda a sorte de avisos e pressentimentos. Dadas vezes, a chance de topar, sem busca, pessoas, coisas e informações urgentemente necessárias.
No plano da arte e criação – já de si em boa parte suplinar ou supraconsciente, entremeando-se nos bojos do mistério e equivalente às vezes quase à reza – decerto se propõem mais essas manifestações. Talvez seja correto eu confessar como tem sido que as estórias que apanho diferem entre si no modo de surgir. À Buriti (Noites do sertão), por exemplo, quase inteira, “assisti”, em 1948, num sonho duas noites repetido. Conversa de Bois (Sagarana), recebi-a, em amanhecer de sábado, substuindo-se a penosa versão diversa, apenas também sobre viagem de carro-de-bois e que eu considerara como definitiva ao ir dormir na sexta. A Terceira Margem do Rio (Primeiras estórias) veio-me, na rua, em inspiração pronta e brusca, tão “de fora”, que instintivamente levantei as mãos para “pegá-la”, como se fosse uma bola vindo ao gol e eu o goleiro. Campo Geral (Miguilim e Manuelzão) foi caindo já feita no papel, quando eu brincava com a máquina, por preguiça e receio de começar de fato um conto, para o qual só soubesse um menino morador à borda da mata e duas ou três caçadas de tamanduás e tatus; entretanto, logo me moveu e apertou, e, chegada ao fim, espantou-se a simetria e ligação de suas partes. O tema de O Recado do Morro (No Urubuquá, no Pinhém) se formou aos poucos, em 1950, no estrangeiro, avançado somente quando a saudade me obrigava, talvez também sob razoável ação do vinho ou do conhaque. Quanto ao Grande Sertão: Veredas, forte coisa e comprida demais seria tentar fazer crer como foi ditado, sustentado e protegido – por forças ou correntes muito estranhas.
Aqui, porém, o caso é um romance, que faz anos comecei e interrompi. (Seu título: A Fazedora de Velas). Decorreria, em fins do século passado, em antiga cidade de Minas Gerais, e para ele fora já ajuntada e meditada à massa de elementos, o teor curtido na idéia, riscado o enredo em gráfico. Ia ter principalmente, cenário interno, num sobrado, do qual – inventado fazendo realidade – cheguei a conhecer todo canto e palmo. Contava-se na primeira pessoa, por um solitário, sofrido, vivido, ensinado. Mas foi acontecendo que a exposição se aprofundasse, triste, contra meu entusiasmo. A personagem, ainda enferma, falava de uma sua doença grave. Inconjurável, quase cósmica, ia-se essa tristeza passando para mim, me permeava. Tirei-me, de sério medo. Larguei essa ficção de lado. O que do livro havia, e o que se referia, trouxou-se em gaveta. Mas as coisas impalpáveis andavam já em movimento. Daí a meses, ano-e-meio, ano – adoeci, e a doença imitava, ponto por ponto, a do Narrador! Então? Más coincidências destas calam-se com cuidado, em claro não se comentam. Outro tempo após, tive de ir, por acaso, a uma casa – onde a sala seria, sem toque ou retoque, a do romanceado sobrado, que da imaginação eu tirara, e decorara, visualizado frequentando-o por oficio. Sei quais foram, céus, meu choque e susto. Tudo isto é verdade. Dobremos de silêncio.”


Acontecências paranormais

“Tudo isto é verdade. Dobremos de silêncio.”
(Guimarães Rosa, em artigo escrito há mais de 40 anos)

Restou cabalmente provada, no depoimento do próprio autor, a incomum capacidade de Guimarães Rosa de poder atingir, com prodigiosa frequência, latitudes superiores na captação das energias sutis que compõem este nosso universo povoado de inexplicabilidades. Energias essas ainda indecifráveis do ponto de vista do conhecimento científico consolidado.
Depois de anotar que, por formação ou índole costumava opor “escrúpulo crítico a fenômenos paranormais”, o escritor viu-se obrigado a reconhecer que sua vida, sempre e desde cedo, “se teceu de sutil gênero de fatos.” E que fatos tão singulares, “entremeando-se nos bojos do mistério e equivalente às vezes quase à reza”, são mesmo esses, afinal de contas? A resposta chega de imprevisto, fulminante, de forma a esmorecer costumeiras dúvidas suscitadas pela proverbial dificuldade humana em avaliar situações consideradas fantásticas, misteriosas ou enigmáticas: “sonhos premonitórios, telepatia, intuições, séries encadeadas fortuitas, toda a sorte de avisos e pressentimentos.”
Foi, por exemplo, num sonho premonitório, “duas noites repetido”, que a estória de “Buriti”, constante de “Noites do Sertão”, tomou forma em 1948. É o que atesta, com franqueza e sem rebuços, o autor de “Tutaméia”. Os estudiosos dos fenômenos abarcados pela Parapsicologia não hesitarão em apontar, nessa revelação, a faculdade de precognição entre os dons singulares do escritor. E qual classificação atribuir ao relato de Guimarães concernente a “Conversa de bois”, do enredo de “Sagarana”? “(...) Recebi-a, em amanhecer de sábado, substituindo-se a penosa versão diversa, apenas também sobre viagem de carro-de-bois e que eu considerava como definitiva ao ir dormir na sexta”, sublinha o autor. O ato de haver “recebido” dá o que pensar. Esse mesmo processo intrigante de “recepção”, dir-se-á (à falta de definição melhor) mágica, ocorre em muitos outros momentos da fecunda trajetória literária de Guimarães, segundo informações dele próprio. É assim em “A terceira margem do rio” (“Primeiras estórias”). Assim, igualmente, em “Campo Geral”. (“Miguelim e Manuelzão”). Uma das estórias brotou na rua, “em inspiração pronta e brusca”, vinda “de fora”. A outra “foi caindo já feita no papel” (...) “e, chegada ao fim, espantou-se a simetria e a ligação de suas partes”. Será que a hipótese da “escrita automática”, também conhecida por psicografia, pode ser encaixada como tentativa de explicação? Ou o que aconteceu guardará sinais de similitude, de alguma maneira, com um “esclarecimento” que me foi passado, de certa feita, pelo consagrado autor espanhol J.J.Benitez? Perguntei-lhe em quais fontes se inspirara para o impressionante relato sobre a vida de Cristo que compõe a saga “Operação Cavalo de Tróia.” Pelo que deduzi da resposta, tudo provinha de um manancial de conhecimentos existente num plano superior. As informações teriam sido obtidas por percepção extra-sensorial, um tipo de “canalização” ainda não devidamente codificado. Guimarães Rosa parece querer dizer coisa parecida em seu artigo, quando fala de “Grande Sertão, Veredas”: “(...) forte coisa e comprida demais seria tentar fazer crer como foi (o livro) ditado, sustentado e protegido – por forças ou correntes muito estranhas”.
A precognição ganha sentido, mais uma vez, no caso de um outro romance que “faz anos, comecei e interrompi” (“A fazedora de velas”). A doença que veio a acometer o escritor, bem como a visualização antecipada que teve do interior de uma casa visitada, anos depois, “por acaso”, que haviam sido projetadas no romance, causando-lhe “choque e susto”, são elementos a mais a considerar na análise das fantásticas situações, de características iniludivelmente paranormais, vividas pelo genial Guimarães Rosa.
Não há como negar: as intrigantes revelações acerca da paranormalidade do escritor, ouvidas de sua própria boca, reclamam atenções maiores dos estudiosos de sua fabulosa obra.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)



quarta-feira, 2 de novembro de 2011



A Assembléia e a Dívida




Cesar Vanucci *

“Em 1998, a dívida do Estado era de 18 bilhões.
Agora é superior a 64 bilhões.”
(Revelação do SindFisco)


Assumindo posição vanguardeira face à incandescente questão da dívida pública mineira, a Assembléia Legislativa do Estado implantou a “Frente Parlamentar em Defesa da Renegociação da Dívida Pública do Estado de Minas Gerais.”

Esse bloco pluripartidário, iniciativa dos deputados Adelmo Leão e Carlin Moura, nasce da imperiosa necessidade de se descobrir, por meio de debate amplo, em termos de cristalina transparência democrática, alternativas para a quitação dos débitos contraídos pelo Estado, de forma que se mostre financeiramente viável aos cofres públicos estaduais e sem molestar, ao mesmo tempo, as contas da União. O levantamento dos números da dívida mineira pegou todo mundo de surpresa. Afinal de contas, a realidade estampada de repente desmoronou a história, intensamente alardeada, do chamado “déficit zero”.

No lugar do “déficit zero” o que despontou nos registros contábeis, por força de diligente trabalho de auditoria, foi um déficit astronômico, estimado entre 67 bilhões e 70 bilhões de reais. Dinheiro para encardir, como se costumava dizer noutros tempos. A dívida, que só vem fazendo crescer em consequência de perversa acumulação de juros e correção, carece ser paga. Mas, na opinião de especialistas na matéria, não há como fazê-lo sem produzir um impacto com feição de tsunami social. Sem arcar com pesadíssimos ônus, a médio e longo prazos, em detrimento – ta claro - de respeitável interesse público. A renegociação desenha-se inevitável.

Faz-se oportuno, nesta hora, recompor a história dessa dívida pra entender como as coisas foram se processando até que os números conseguissem galgar a altitude himalaiana inimaginável das apreensões gerais. Em 1998 (governo Eduardo Azeredo), quando totalizava R$ 18,5 bilhões, a dívida de Minas foi objeto de negociação com o governo federal (FHC). Proclamou-se, na ocasião, em verso e prosa, que o pacto firmado havia sido bastante satisfatório. Não foi bem assim. Mais de uma década transcorrida, Minas já despendeu a bagatela de R$ 40,12 bilhões (valores corrigidos) em pagamentos aos credores. Nada obstante, continua devendo mais, muito mais mesmo do que já pagou.

Mas, porque cargas d’água, a dívida, pretensamente tão bem negociada, cresceu desse modo assustador? Ela foi – e isso provocou o surgimento da Frente Parlamentar – negociada com base na Tabela Price: juros de 7,5% ao ano, com correção, mais IGP-DI, um dos maiores índices de cálculo da inflação no país – ressalte-se -, com a fixação de um limite de comprometimento de até 13% da Receita Líquida Real, pelo prazo de 30 anos.

Pela Tabela Price, o devedor inicialmente paga mais juros, ao mesmo tempo que vai amortecendo parcelas menores do montante. Do meio do contrato em frente, os juros diminuem à medida que o saldo devedor vai sendo reduzido.

Mas veja, agora, a situação nua e crua vivida pelo Estado no tocante ao assunto. Os gastos onerosos com o pagamento da dívida não têm sido suficientes para cobrir sequer os juros. Via de consequência, o volume do débito não parou de crescer entre 1998, quando se fechou a negociação, e 2009. Crescimento – pasmem - de “apenasmente” 205 por cento.

Pelo refinanciamento feito, o Governo Federal estipulou pesadas obrigações quanto a metas e compromissos. Fixou parâmetros pra tudo: dívida em relação à Receita Líquida Real (RLR), resultado primário, despesa com o funcionalismo público, arrecadação com receita própria, privatizações, permissão ou concessão de serviços públicos, reforma administrativa e patrimonial, aumento nas despesas de investimento em RLR. Minas Gerais viu-se forçada, com tamanha carga de imposições, a aplicar, anualmente, em juros e amortização, algo por volta de R$ 3 bilhões. Cifra equivalente a quase um orçamento inteiro da Saúde Pública. Enquanto isso - repita-se -, a dívida pública só cresceu.

Não bastassem todos esses perturbadores elementos, defronta-se o Estado, ainda, como devedor, com a obrigação de se enquadrar rigorosamente nas regras da Lei de Responsabilidade Fiscal, posta para vigir no governo Fernando Henrique. Essas regras definem o bloqueio das receitas dos Governos Estaduais que se revelem inadimplentes no que concerne à quitação no prazo exato dos valores acordados.

A encrenca, percebe-se por tão copiosos registros, é colossal. A renegociação da dívida assume características dramáticas. Virou, por assim dizer, questão de vida ou de morte. O problema suscitado – não há como deixar de reconhecer - é de suprema magnitude. A busca empenhada de soluções passa por uma discussão ampla, geral e irrestrita. Pede reflexão e estudos de todos os setores engajados em políticas públicas e empreitadas voltadas para o desenvolvimento econômico e social.

A Assembléia Legislativa de Minas age com bom senso ao colocar em sua febricitante agenda tema tão momentoso e relevante.





Renegociação inevitável





“A proposta de renegociação da dívida, feita pelo Parlamento
mineiro, passa a ser, agora, uma bandeira de todos nós.”
(Antônio M. Bernardes, leitor)


Por onde circulo, constato que a reação das pessoas diante da inesperada revelação acerca da dívida pública mineira é de completo aturdimento. Não poucos cidadãos, alcançados em cheio pela retórica marqueteira do “déficit zero”, chegam até a expressar dúvidas quanto a legitimidade da informação.

Mas, falando francamente, não há mais como ignorar a linguagem nua e crua dos números. A dívida do Estado, que era da ordem de 18 bilhões de reais em 1998, oscila hoje entre 64 bilhões e 70 bilhões. Isto vem devidamente enunciado nos trabalhos feitos pelos qualificados especialistas em matéria fiscal e auditagem que embasaram a decisão vanguardeira da Assembléia Legislativa de Minas – vanguardeira em termos brasileiros - de trazer a debate público a conveniência de se renegociar o acordo firmado, no mencionado ano (governos Eduardo Azeredo e Fernando Henrique Cardoso), envolvendo o pagamento da dívida mineira com a União.

Como acentuado na justificativa da proposta de constituição da Frente Parlamentar multipartidária para a Renegociação da Dívida Mineira, encabeçada pelos deputados Adelmo Leão e Carlin Moura, integrada por 51 parlamentares e aprovada pelo presidente da Casa, deputado Dinis Pinheiro, Minas Gerais já despendeu, no serviço da dívida, 44 bilhões em valores corrigidos, sem conseguir reduzí-la um ceitil que seja. Em 2010, a assim chamada dívida contratual pulou para 64 bilhões, ficando em termos gerais assim composta: dívida interna, compromisso assumido pelo Estado com a União, 61.4 bi; dívida externa, 3.7 bi. O total apurado abarca dívida com a Cemig, estatal mineira, da ordem de 5 bilhões. As explicações fornecidas a propósito do débito (também sempre ascendente, ao que se revela) com a Cemig, assinalam que, na época de implantação do Plano Real, foi criada uma conta contábil, a Conta de Resultados a Compensar (CRC), gerada a partir das insuficiências tarifárias das concessionárias de energia elétrica, em razão da circunstância de que, até 1993, era garantida às empresas uma remuneração legal mínima de 10% ao ano. As tarifas eram definidas a partir do custo de serviço da concessão, mas, até essa ocasião, foram usadas pelo Governo Federal como instrumento para conter a inflação. Com isso, as empresas de energia não conseguiam atingir a rentabilidade mínima e o Governo Federal passou a gerar créditos para as concessionárias na CRC (Conta de Resultados a Compensar). A União arcava com a diferença entre o que deveria ser cobrado e a tarifa que era efetivamente praticada pelas empresas de energia, de modo que estas não apresentassem déficit.

Em 1994, o Governo Federal autorizou a utilização desses créditos de CRC para liquidar pendências das concessionárias com entidades do próprio Governo Federal e outras empresas do setor. A Cemig, no entanto, não utilizou a totalidade desses créditos de CRC no encontro de contas permitido pela Lei 8727, de 1993, passando a contar com expressivo saldo positivo. Em 1995, quando renegociou sua dívida com a União, o Governo de Minas usou os créditos de CRC que a Cemig possuia, cedidos ao Estado por meio de um contrato de cessão de créditos, a fim de quitar parte da dívida de Minas. Foi desta forma que o Estado tornou-se devedor da estatal de energia.

A negociação de 1998 - alvo de severas críticas, como se recorda, do governador Itamar Franco - estabeleceu o oneroso IGP-DI como índice de correção, fixando também em 7.5% o juro a ser pago. Não deixa de ser intrigante o fato de que, noutros Estados, onde ocorreram à mesma época negociações do gênero, o valor acertado no tocante ao juro tenha sido menor: 6%.

A dramática situação posta à apreciação do Governo, classe política e sociedade conduz uma certeza: nos termos vigentes, a dívida é impagável. Compromete irremediavelmente o futuro de Minas.

A renegociação, como pretende o Parlamento de Minas, se faz assim inevitável. A alteração do indexador de correção, a redução do índice de juro são medidas obviamente cogitáveis. Mas não se pode deixar de pensar também no recálculo da dívida, no conhecimento cristalino e transparente da natureza dos débitos.


* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

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