sexta-feira, 28 de junho de 2019


Apesar dos pesares, torcer
Cesar Vanucci

“País na beira do precipício.”
(Titulo de editorial do Diário do Comercio,
 edição de 6 de junho de 2019)

Sinais de tempos diferentes. Diferentes e perturbadores. Onde foi parar aquela ardente, contaminante mesmo, vibração da “torcida uniformizada” à volta da “seleção canarinho”? A empatia, então existente, entre as frenéticas multidões rendidas ao fascínio da coreografia futebolística e o escrete representativo de conquistas memoráveis, deixadas hoje na saudade, vinha envolta em ardor – não é exagero dizer – de feição religiosa. Nem o mais impassível dos indivíduos conseguia manter-se fora das ruidosas manifestações nas vésperas de jogos importantes, ou das comemorações festivas em razão dos cumulativos resultados positivos. E nem, tampouco, alheiar-se às reações de desencanto provocadas por frustradas expectativas.

A situação agora é outra. Aí está a Copa América com começo previsto para já. Não se vislumbra, nas ruas, em que pese o esforço midiático, demonstrações de entusiasmo solto relativas às competições. Em ocasiões passadas, era raro topar com alguém, “torcedor de carteirinha”, ou torcedor esporádico, que não soubesse declinar, de cor e salteado, a composição do time a “adentrar a cancha” (como apreciam dizer nossos esfuziantes cronistas) com a missão de defender as gloriosas cores do (único) país pentacampeão.

Na hora atual, ficou mais fácil ouvir da boca das pessoas a escalação completa dos 11 togados (quase todos de ego exacerbado) que integram o Supremo, do que a dos 11 “malabaristas da bola” designados para os prélios. Quando muito, os adeptos do “esporte das multidões” conseguem mencionar, do elenco convocado, uns dois ou três atletas, o incorrigível Neymar entre eles. Não encontram, de outra parte, facilidade para indicar sequer as posições em que atuam os jogadores “dentro das quatro linhas”, conforme descrição do saboroso vocabulário futebolês. Tem-se por certo que essa ausência de familiaridade do público com os atletas – selecionados, de acordo com suspeitas amiúde levantadas, com “despretensiosa ajuda” de empresários e patrocinadores – se origine da circunstância de os convocados pertencerem, na quase totalidade, à chamada “legião estrangeira”. Noutras palavras, fazem parte de clubes estrangeiros que operacionalizam intensamente o negócio, altamente rendoso, das milionárias transações de passes. Atividade que anda enricando, aqui e acolá, mundão de gente. O recrutamento da “legião” ocorre sempre quase na hora das disputas. Não há tempo suficiente para treinamentos em conjunto. Os jogadores comunicam a desagradável sensação de manterem vínculo emocional reduzidíssimo com a gloriosa escola futebolística que representam nos gramados. Parecem não se deixar empolgar muito com o que se lhes toca fazer. E, em assim sendo, suas performances acabam também não empolgando, nadica de nada, a imensa plateia que torce pela seleção.

Experientes analistas esportivos sustentam que a convocação exclusiva de jogadores dos times em ação nos campeonatos brasileiros seria a opção desejável para formar uma seleção bem treinada, em perfeitas condições de devolver aos brasileiros as alegrias perdidas. Um escrete em tais moldes, garantem ainda, imporia, com facilidade, derrotas ao time dos “legionários”. Resguardaria, com competência e altivez, as glórias e as tradições do genuíno futebol brasileiro. Sabe-se, contudo, que uma reformulação desse porte revela-se impraticável.  Os poderosos interesses por detrás da estrutura dominante no processo não querem saber de mudança alguma.

 Mas, analisada por outro ângulo, a apatia das pessoas advém de outros fatores, bem mais contundentes. A densa e tensa atmosfera dominante na cena brasileira contemporânea contribui decisivamente para o estado de espírito da população. O desalento afivelado nos semblantes das ruas tem como causa o manifesto despreparo de nossas lideranças políticas, que não sabem como fazer o Brasil andar pra frente. Retomar o desenvolvimento, reduzir o desemprego galopante, diminuir as desigualdades sociais, enfim, traçar rota segura que permita a materialização da inequívoca vocação de grandeza do país.

Convidemos a explicarem as razões desse clima de angustiada descrença renomados sociólogos, antropólogos e outros especialistas em ciências humanas. Categoria, como visto, desacreditada por “çábios” (definição tomada emprestada ao Élio Gáspari) detentores de embriagante autossuficiência, responsáveis por aquilo que, ora vigente na praça, vem sendo apelidado de “neo revisionismo histórico”. Eles, os especialistas “rejeitados”, não hesitarão, tiquinho que seja, em apontar que a frustração crescente, em todas as esferas do labor, é fruto daninho da desastrada condução das políticas públicas.

Fique por derradeiro um singelo registro. Diante de tudo quanto exposto, é preciso atentar para algo de suma relevância. Apesar de todos os pesares, levando-se em conta coisas valiosas em jogo, que tocam de perto e fundo nossa vida e nosso destino, uma postura pertinente e razoável é reclamada dos indivíduos de boa-vontade. A cada qual compete entregar-se, nesta hora, em exercício de saudável cidadania, a uma reflexão serena, visão crítica construtiva, sentimento de brasilidade aflorado, aplicando afinco no trabalho empreendido no contexto comunitário.  E torcer, extraindo fervor máximo do coração. Torcer, de passagem, pela seleção. E, sobretudo, torcer muito, demais da conta, de verdade, pelo Brasil.


Nicolau, Cleópatra e Dumas, negros, com orgulho

Cesar Vanucci

“Faz parte do respeito à memória de uma
pessoa negra não embranquecê-la”.
(Joice Berth, escritora)

Leitores destas maldigitadas adicionam curiosas informações às narrativas estampadas neste acolhedor espaço acerca do chamado “Maquiamento preconceituoso”. Estamos falando desses incríveis relatos de descarada impostura social em que célebres personagens negros são representados em textos, quadros, documentos variados como se brancos fossem.

Nos comentários que atraíram a atenção do nobre leitorado, este desajeitado escriba alinhou, como resultado de pesquisas promovidas por especialistas em antropologia, os nomes de duas dezenas de eminentes cidadãos brasileiros que, mercê de seu talento e labor, alcançaram posições de inconfundível realce no panorama brasileiro da construção humana. Cidadãos esses que, deploravelmente, tiveram a memória aviltada em consequência da adulteração, calcada em abominável preconceito, nos registros referentes à sua legítima condição étnica. As informações vindas agora falam de outros personagens de destaque histórico, não brasileiros, igualmente retratados em copiosa documentação como brancos, apesar de serem negros. Negros como a noite.

Alexandre Dumas, universalmente festejado autor de obras como “O Conde de Monte Cristo” e “Os Três Mosqueteiros”, transformadas em filmes épicos que renderam grande bilheteria, teve como pai um general e como mãe uma escrava africana. “Adaptações artísticas” em sua imagem e currículo, com indisfarçáveis motivações discriminatórias, levam a maioria das pessoas a vê-lo como cidadão branco.

Recuando mais longe na história, chegamos à figura lendária, cantada em verso e prosa, da última rainha do Egito. Cleópatra foi sempre representada, em pinturas, filmes e por aí vai, como belíssima mulher branca. A deslumbrante Elizabeth Taylor foi, aliás, por sinal, a atriz escolhida por Hollywood, entre outras beldades, todas também brancas, para representar a mitológica Cleópatra naquele edulcorado enredo que fala do irresistível fascínio por ela exercido em Júlio Cesar (na fita, protagonizado por Rex Harrison) e Marco Antônio (papel vivido por Richard Burton, marido de Elizabeth Taylor). Manda a verdade dizer que a rainha do país dos faraós nada possuía, entretanto, dos traços europeus mostrados nas telas do cinema. Suas características raciais se enquadravam no típico perfil da mulher negra do norte da África.

Até para o Papai Noel – quem haveria de imaginar? - sobrou deturpação fisionômica de cunho racista. O bom velhinho de barbas longas do trenó tocado por renas, venerado universalmente pela criançada, não passa, como todo adulto está calvo de saber, de uma figura de ficção. Todos, também sabemos, porém, que Noel surgiu inspirado na vida e obra de São Nicolau, alguém do mundo real que se fez célebre por práticas de bondade e solidariedade. Tendo em vista que São Nicolau e Papai Noel são convenientemente retratados, ao longo dos tempos como personagens brancos, é oportuno tomar conhecimento de um fato especial. Nicolau de Mira nasceu na Turquia em 270, época em que o país era praticamente uma extensão da África. Tal circunstância conduz muitos historiadores a garantirem que o santo em que se baseia a figura fictícia de Noel era negro.

As situações emblemáticas ora reportadas fornecem argumentos para que analistas da candente problemática racial, repositória de carga histórica volumosa de ignomínias cometidas contra seres humanos de origem africana, proclamem, como anota Joice Berth, escritora, arquiteta e urbanista, líder feminista, que “faz parte do respeito à memória de uma pessoa negra não embranquecê-la”. Mais ainda: “Deveria existir uma lei impedindo isso, o branqueamento premeditado de figuras negras, pra encerrar esse capítulo vergonhoso da história do racismo”.

Klinger Sobreira de Almeida
Mil Ref/Membro ALJGR/PMMG




MALEDICÊNCIA →Efeito Boomerang


“Calarei os maldizentes continuando a viver bem;
eis o melhor uso que podemos fazer da maledicência.”
(Platão)

Maledicência – semeadura de dúvida e discórdia – consiste no hábito, cultivado por indivíduos de baixo nível consciencial, de “enxergar” o próximo pela viseira do mal. A inveja, uma das características do egoísta, é sua fonte primária.

O maledicente, ou maldizente, satisfaz-se, tal qual o urubu ao devorar carniças, intrigando, injuriando, caluniando, difamando... Via de regra, não assiste aprática do suposto mal que, em surdina ou ostensivamente, propaga.  Apanha e deglute boatos por “ouvir dizer. Tira ilações levianas de comportamentos que lhe parecem anômalos. Inventa, fantasia ou engendra situações mentais hipotéticas em relação ao outro. Acresce e agiganta  fatos difusos para detratar. Adora factoides que possam destruir o semelhante. É uma mente doentia, às vezes afetada por ideologia fanatizadora.

A maledicência prospera tanto nas camadas sociais inferiores como nas chamadas elites. Possui nichos na família, vizinhança, escola, trabalho, igreja, caserna, partidos políticos, associações etc... Emerge e expande-se em ambientes turbados pela ausência de amor, coesão e harmonia, agudizando desconfiança, rivalidades estéreis e desequilíbrio psíquico em indivíduos emocionalmente frágeis.

A tessitura de maledicência pode infernizar vidas; provocar separações conjugais, conflito de vizinhos, depressão em pessoas atingidas, suicídios e malefícios de toda ordem. Dos tempos de polícia, muitas lembranças de problemas que desaguavam nas Delegacias, e a origem: maledicência. Uma delas: o marido enciumado matou a esposa honesta, uma bela mulher,julgando-ainfiel; tudo nascera da inveja em rodas de boteco, quando alguns ébrios habituais atribuíram-lhe a condição de “corno”.
Hodiernamente, acompanha-se um festival de maledicência que vem do “alto escalão da pseudointelectualidade”, ora ultraesquerda, ora ultradireita.Neste viés, certo“escritor/fantoche”, brasileiro residente nos EEUU, que se reputa filósofo e guru dos atuais detentores de poder, baseia seu discurso em ofensas gratuitas a autoridades e personalidades que não se alinham à sua “cartilha”.No polo oposto, a Presidente de determinado partido faz da maledicência seu ritual de ataque aos opositores.

A história e a própria experiência de vida evidenciam que os semeadores demaledicência podem alcançar objetivos destruidores imediatos. Podem regozijar-se em assistir o efeito do mal que causaram. Porém, a vida é um enigma decifrável. Quem faz o mal recebe o mal. Todos os maledicentes que se altearam na história, tiveram problemas terríveis ou fim melancólico. Também, aqueles, que conhecemos, obtiveram retorno pessoal ou familiar indesejável. A maledicência foi, raspou o alvo e retornou, fuzilante,ao ponto de origem (efeito boomerang).

O maldizentes, na linha de Platão, sempre tiveram o repúdio dos homens de bem. O Escritor e Médico Neurologista Antônio Austregésilo – 1876/1960 – estudioso da mente humana, retratou-os nesta síntese: “Os maledicentes pensam envenenar a humanidade: envenenam-se a si mesmos. A inveja aflige-lhes os dias, o desânimo completa-lhes a existência. Por fim, eles é que se tornam sofredores.”

sexta-feira, 21 de junho de 2019







Cinema brasileiro brilhou em Cannes


Cesar Vanucci

“Só por ignorância ou má fé alguém poderá
     desconhecer os feitos do cinema brasileiro no Festival”.
     (Domingos Justino Pinto, educador)

O setor governamental incumbido institucionalmente de promover nossas políticas culturais acaba de dar mais uma constrangedora demonstração de desapreço ao que é feito, com talento e reconhecido sucesso, por criativos empreendedores patrícios nesse ramo da atividade artística. Manteve-se mudo e quedo que nem penedo diante das retumbantes conquistas do cinema nacional no recente Festival de Cannes, mais importante mostra da arte cinematográfica universal.  Não se conhece, em momento algum da crônica pública brasileira, precedente de postura tão insólita. A circunstância de que o nosso cinema arrebatou alguns dos principais prêmios do Festival não poderia, jeito maneira algum, passar desapercebida aos olhares de quem esteja investido de conduzir oficialmente a missão de propagar as manifestações da arte e da cultura do país.

Como ignorar a ovação recebida pelo filme “Bacurau”, dirigido pelo pernambucano Kleber Mendonça Filho, com co-direção de Juliano Dornelles, agraciado com o “Prêmio do Juri” e aplaudido de pé durante vários minutos por uma plateia em delírio? Como mostrar indiferença ao fato de que outra película nacional, “A vida invisível de Eurídice Gusmão”, dirigida pelo cearense Karim Ainouz, alvo igualmente de aplausos entusiásticos, conquistou o prêmio de melhor filme da mostra no segmento “Um Certo Olhar” (Um Certain Regard)? Tem mais: o “Prêmio da Crítica” foi atribuído, no monumental certame, à obra “The Lighthouse”, produzida pelo brasileiro Rodrigo Teixeira. Será que isso faz ou não faz jus, também, a louvores? 

Imperioso mencionar ainda, como alvissareiro registro, a escolha de outras produções brasileiras para comporem a estilosa programação da famosa mostra que, nessa sua opulenta versão de 2019, reuniu outra vez mais a elite artística do fascinante mundo do cinema. “Sem seu sangue”, da cineasta Alice Furtado, competiu na “Quinzena dos Realizadores”. As fitas “Indianara”, de Marcelo Barbosa e Aude Chevalier-Beaumel, e “Breve história do planeta verde”, co-produção brasileira, argentina, espanhola e alemã, foram distinguidas em rigorosa seleção,para exibições, pela “Associação para a Distribuição do Cinema Independente” (ACID). De outra parte, o longa em animação “Bob Cuspe – Nós não gostamos de gente”, da “Coala Filmes”, participou do “Animation Day”, evento paralelo ao Festival de Cannes.

 Os sinais da presença robusta da arte cinematográfica brasileira no Festival vão ainda além. Cuidemos de anotar: O filme “Il traditore” (O traidor), do celebrado Marco Bellochio, que narra a história de Tommaso Buscetta, chefe da máfia que viveu e acabou sendo preso no Brasil, extraditado para a Itália, foi considerado excepcional pela crítica. As filmagens foram feitas, em boa parte, na região brasileira em que Buscetta residiu por algum tempo. Película co-produzida por italianos, brasileiros, alemães e franceses, “O traidor” traz no papel de Cristina, esposa do mafioso, a bela atriz brasileira Maria Fernanda Cândido, cuja interpretação arrancou elogios copiosos. A respeito do filme, assim se pronunciou Bellochio: “Minha preocupação era fazer algo não convencional, mas simples, popular. Era necessário representar os tantos delitos da máfia, de uma forma própria que eu busquei na dimensão teatral”.

O cintilante desempenho do cinema brasileiro em Cannes engrandece, sem a menor sombra de dúvida, a cultura e as artes de nosso país. Quem se recuse a admitir isso coloca-se frontal e contundentemente no lado oposto ao sentimento nacional e à verdade histórica.


O fim e os meios

Cesar Vanucci

“O fim justifica os meios.”
(Maquiavel, pensador italiano do século XV,
famoso pelos seus conceitos anarquistas)

Ao contrário do que prega Maquiavel, o fim não justifica os meios. Os valores humanísticos, os princípios democráticos basilares, os direitos civilizatórios repelem o emprego de expedientes antiéticos, subversivos do ponto de vista jurídico, adotados em decisões que possam alvejar a dignidade humana. Se entendimento tão saudável, nascido do bom-senso universal, fruto de uma lúcida e amadurecida interpretação das sagradas regras da boa convivência humana, não prevalecesse como conquista moral da civilização, com toda certeza muita gente estaria advogando aí, de forma aterrorizante, a implantação rotineira de métodos de suplicio e tortura para arrancar confissões de suspeitos, de desafetos, de pessoas que não rezem por sua cartilha. Acontece em momentos trevosos da história, em diferentes épocas.

Ilustres personagens da chamada Operação Lava Jato, em que pesem os meritórios resultados de muitas das ações deflagradas no andamento do complexo e saneador processo, andam um tanto quanto confusos no que concerne aos recursos a serem empregados na execução satisfatória de suas tarefas institucionais. Foram flagrados, outra vez mais, em clara e criticável ultrapassagem de velocidade quanto ao itinerário a percorrer traçado pelo Direito. No afã de executar a contento sua relevante missão, sentem-se inteiramente à vontade para avançar em território situado além dos limites de sua competência. Fique claro que os encargos de que se acham investidos asseguram-lhes poderes especiais, de modo a que as diligências possam ser bem sucedidas. Mas, podendo muito, eles, incontestavelmente, nem tudo podem. Todavia, isso parece, passar desapercebido, não poucas vezes, à sua compreensão.  Bem emblemática desses impulsos despropositados é aquela história, de pouco tempo atrás, da criação, no âmbito da atuação do núcleo operacional da Lava Jato, de um Fundo Social constituído de volumosos recursos que outra destinação não poderiam ter senão os cofres do Tesouro Nacional, como restou comprovado.

O site “The Intercept Brasil” traz, agora, a lume o cometimento de outras exorbitâncias. Élio Gáspari, uma das vozes mais influentes do nosso jornalismo, descreve em texto impecável o aturdimento causado pela postura assumida, na questão em tela, pelo ex-juiz, atual ministro Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol. Classifica de “impróprias” as conversas mantidas por ambos, figuras de participação  exponencial nas investigações pertinentes às fraudes da Petrobras. Elas (as conversas) – sustenta o jornalista – “enodoaram a Lava Jato e fragilizaram a condenação imposta a Lula pelo triplex de Guarujá (SP)”. No modo de ver do jornalista, o ministro posicionou-se de “forma arrogante” (...) às revelações do site “The Intercept Brasil”, obrigando “muitos daqueles que gostariam de defendê-lo a ficar no papel de bobos”. O comentário de Gáspari anota, ainda, “o fato grave de se ver um juiz, numa rede de papos, cobrando do Ministério Público a realização de operações, oferecendo uma testemunha a um procurador, propondo e consultando-o a respeito de estratégias”. Tal procedimento, aduz, leva à constatação de que, “o viés militante de Moro e Deltan na Lava Jato afasta-os do devido processo legal”. Outra incisiva e pertinente manifestação do mesmo comentarista: “Em nome de um objetivo maior, a Lava Jato e Moro cometeram inúmeros pecados factuais e algumas exorbitâncias, tais como o uso das prisões preventivas como forma de pressão para levar os acusados às delações premiadas. Como não houve réu-delator que fosse inocente, o exorbitante tornou-se conveniente. Ao longo dos anos, Moro e os procuradores cultivaram e, em alguns casos, manipularam a opinião pública. Agora precisam respeitá-la”.

Cabe, por derradeiro, registrar, a propósito de tudo quanto acima alinhado, que do site responsável pela divulgação continuam jorrando embaraçosas denúncias. Dizem respeito a outras infringências comportamentais ocorridas nas lides processuais, as quais, pela mesma forma, colidem com as leis, a ética e o bom-senso.

sexta-feira, 14 de junho de 2019


O musical “Olé!” e o programa “Percepção”

Cesar Vanucci

A música é como pão –
elementar e santa, e é de todos.”
(Tristão da Cunha)

● A praça Duque de Caxias, em Santa Tereza, charmosa referência na paisagem artística da capital das Gerais, foi o ponto de convergência popular escolhido para “fecho de ouro” (como era de bom tom dizer-se em tempos de antigamente) da triunfal temporada do espetáculo musical “Olé! É sempre tempo de música”. A multidão que no sábado, 13 de maio, acorreu ao show ao ar livre, gratuito, patrocinado pelo “Olé Consignado” (empresa ligada ao Santander) e Ministério da Cidadania, foi brindada com um recital de invulgar esplendor. Arrebatante, numa definição curta e fiel.
É bastante razoável a presunção de que, nas demais capitais brasileiras onde anteriormente ocorreu a encenação, o musical haja arrancado dos espectadores a mesma estrondosa ovação anotada em plagas belorizontinas. O que rolou no palco, em curso de tempo superior a duas horas, por obra e engenhosidade de um senhor time de cantores, músicos, dançarinos, fez do espaçoso logradouro uma feérica explosão de emoções e alegria genuínas. Maviosa sincronia se estabeleceu entre o festivo alarido do lado de fora e os eletrizantes sons da ribalta brotados das vozes, instrumentos e coreografia primorosos dos criativos intérpretes. O que se viu, em suma, foi uma amostra de impecável integração entre artistas e público.
É hora, a esta altura, de declinar os nomes dos figurantes do elenco responsável pela aplaudida façanha. Eduardo Dussek, com a voz em plena forma e toda aquela bossa que lhe assegura lugar marcante na constelação artística, despontou como figura central na representação. O “Caffeine Trio”, integrado por Carô Rennó, Renata Vanucci e Sylvia Klein (conjunto que em excursão recente encantou plateias alemãs), Mylena Jardim, Adriana, Marcelo Veronez, Marcelo Ricardo e Barulhista, com o concurso da MG Big Band, sob a regência do maestro Marcelo Ramos, conduziram sequência de interpretações abrangendo sucessos inesquecíveis da MPB e da música internacional dos anos 60 a 90. Na apresentação de clássicos do cancioneiro popular, contaram com apoio de enorme coral improvisado da galera presente, composta de gente de todas as faixas etárias. A ficha técnica do show revela que Ray Ribeiro, Marisa M. Coelho e a Pólobh idealizaram o “Olé!”. Chico de Paula e Lilian Nunes cuidaram do roteiro e direção, com consultoria musical de Kiko Ferreira. Excepcional a logística técnica montada.
A audição musical atestou, com exuberância, outra vez mais, a relevância de que se reveste para a vida artística a lei de incentivo à cultura, utilizada pelos promotores do evento. A presença na praça de câmeras de televisão deu guarida à expectativa de que o espetáculo possa ter sido inteiramente filmado, com possibilidade talvez de vir a ser projetado na telinha. Será uma boa.

● Trinta e seis episódios, dos mais de 50 produzidos na primeira temporada do programa “Percepção”, já foram trazidos à apreciação do público via “YouTube”. “Percepção”, como já explicado ao distinto leitorado deste desajeitado escriba, é uma sequência de histórias ligadas à chamada temática transcendente. Ou seja, o “Realismo Fantástico”, expressão bolada pelos pensadores Louis Pauwels e Jacques Bergier, autores dessa obra prima intitulada “O despertar dos mágicos”. Quem se der ao trabalho de clicar no “YouTube” “Percepção – um programa Cesar Vanucci”, irá se deparar com narrativas e depoimentos voltados para a abordagem de assuntos instigantes, insólitos, curiosos, muitos deles na linha dos fenômenos inexplicáveis que rondam a trajetória humana.
A titulação dos episódios já colocados no ar é reveladora do conteúdo. Vamos lá: Predições fantásticas; Recomendação profética de Chico Xavier; Ana Elizabeth Diniz, porta-voz do esoterismo; Pedro Serra fala ufologia como ciência; Uma santa criatura chamada Maria da Glória; Os contatos extrassensoriais de Heloisa Maria Altavilla; Um vaticínio espantoso; Marilena Simões e a linguagem das cartas; Heros Campos Jardim e as investigações do Cicoani (Centro de Investigação Civil de Objetos Aéreos não identificados); Luminosidade e treva, segundo Sai Baba; Marli Medeiros e a Brahma Kumaris; Orestes Debossan Junior e as energias sutis, a terapia psicotronica, e o livro “A Física Quântica e o Poder da Oração”; Revelações impressionantes sobre o lado místico de Guimarães Rosa; Maria Ângela Vaz de Melo e o Realismo Fantástico; Jacques França, o Projeto Rama e a Terapia Regressiva; A Pesquisa Ufológica segundo Marco Antônio Maldonado; Cláudio Carone e o Santuário Místico do Roncador; Intrigantes Sincronicidades; As investigações sobre discos voadores empreendidas por Albert Eduardo.
A cada quarta-feira um episódio inédito em “Percepção”.

quinta-feira, 13 de junho de 2019


Os gols de placa das meninas de Araguari

Cesar Vanucci

“Pioneiras do futebol feminino, elas enfrentaram com
galhardia e coragem os preconceitos talibanistas de sua época”.
(Antônio Luiz da Costa, educador, sobre a luta pelos direitos
femininos sustentada nos anos 50 por mulheres de Araguari)

Refestelado em confortável poltrona, balde de pipoca ao alcance das mãos, atenção fixada na telinha repleta de imagens e sons, este desajeitado escriba deleita-se com as evoluções coreográficas das atletas da seleção brasileira que disputa na França a Copa Mundial de Futebol Feminino. Da memória velha de guerra emergem, de súbito, impetuosamente, imagens marcantes de acontecências registradas no século passado, anos 50.

Revejo, nostálgico, as “ousadas” ações vanguardeiras das meninas de Araguari no campo de futebol do principal clube da cidade. Essas “garotas” foram, saibam todos, senhores e senhoras, as introdutoras da prática futebolística feminina no Brasil. Chefe de redação do diário de maior circulação na região do Triângulo Mineiro, o desassombrado, já extinto, “Correio Católico” (12 mil assinantes na época), fui convidado em determinada ocasião, por amigo dileto, de saudosa memória, o brilhante jornalista Mário Nunes, a assistir, em Araguari, uma partida de futebol de características inéditas, com fitos beneficentes. Os times em campo eram constituídos de moças na “flor da idade”, de diferentes segmentos sociais. Envergavam calções, calçavam chuteiras, naquela época também chamadas de “bicancas”. Algumas protegiam a cabeça, mode que ajeitar cacheados cabelos, com gorros. Seja lembrado que não poucos atletas do futebol masculino costumavam fazer o mesmo.

Minha primeira reação diante dos lances inusitados capturados pelo olhar foi, obviamente, de baita surpresa. A surpresa acabou cedendo lugar a forte sentimento de admiração e solidariedade. Senti-me comovido com as cenas das “minas” fervorosamente convictas da legitimidade do papel que lhes tocava desempenhar, naquele preciso instante, no enredo da vida comunitária. Percebi que iriam precisar de palavras de encorajamento e aplauso naquele seu afã de quebrar tabus e desafiar inclementes regras machistas. “Botando pra jambrar” (como se costumava dizer em tempos de antanho), elas também puserem à mostra, de quebra, insuspeitáveis habilidades no “trato com a pelota”. Cuidei de acompanhar de perto, por razoável lapso de tempo, até que o bom-senso conseguisse finalmente se impor, a tormentosa polemica surgida, então, a respeito da legitimidade de as mulheres virem a jogar futebol. Fomentada por flamejante preconceito, a controvérsia acabou desembocando em raivosas vociferações por parte do falso moralismo entocaiado. O exagero na condenação da prática conduziu aguerridos “adeptos” do indissolúvel “Transanteontem Futebol Clube”, sempre a postos na contestação dos avanços civilizatórios,  à redescoberta, em carcomida legislação dos tempos autoritários do Estado Novo, de um dispositivo contendo taxativa proibição ao futebol feminino, com previsão de severa penalidade aos infratores, ora, veja, pois!... O ânimo das araguarinas não arrefeceu. O valoroso time das jovens manteve-se inabalável na determinação de enfrentar a intolerância talibanista que se valia de mil artifícios para cercear-lhes a atuação. Ao fim e ao cabo, as pioneiras sagraram-se vitoriosas em seus propósitos. Conseguiram implantar uma barricada a mais na defesa dos direitos da mulher e da cidadania.

As “garotas de Araguari” são, na atualidade, quase todas elas, vovós setentonas. Orgulham-se muitíssimo, pelo que se sabe, dos gols de placa marcados. Dentro e fora do campo.

sexta-feira, 7 de junho de 2019


Maquiagem preconceituosa


Cesar Vanucci

“Nunca soube que Nilo Peçanha era negro!”
(Senador José Serra, governador de São Paulo à época da exposição dos
painéis de rua retratando personagens negros de realce na vida brasileira)


Aludimos aqui, ainda recentemente, ao vergonhoso e usual procedimento adotado em certos setores, com a indesculpável complacência de alguns órgãos representativos da atividade intelectual, de se adulterar publicamente a condição étnica de notáveis personagens negros da cultura brasileira. Essa persistente e deploravelmente enganosa disposição de “maquiamento embranquecedor” – chamemos assim – de expoentes da inteligência dotados de cútis negra – “negra como a noite, negra como as profundezas d’África”, retornando à fala do poeta (negro) Langston Hughes – constitui  manifestação de preconceito racial indisfarçável, deslavado e indesculpável. Algo em estridente dissonância com os preceitos democráticos e humanísticos que recobrem de dignidade a caminhada do ser humano.

Como então sublinhamos no comentário de dias atrás, figuras da expressão de um Machado de Assis, de Lima Barreto, de Cruz e Souza, citando apenas alguns nomes estelares no cenário cultural de todos os tempos, são habitualmente retratadas, em imagens caprichosamente retocadas, como “gente branca”. As coisas assim processadas derivam da estrábica concepção de que essa deformação de imagem serviria para “enriquecer-lhes” as biografias, quando, na realidade, muito pelo contrário, serve apenas para aviltar-lhes a memória.

Retomando hoje o desconcertante tema, anotamos outros nomes mais à lista de personalidades negras eminentes que se viram envolvidos em registros históricos inconsistentes no que diz respeito à sua autêntica origem racial. Vem a calhar, a propósito, informação de que em São Paulo, no final da década passada, em promoção das Secretarias de Cultura do Estado e da Capital bandeirante, ao ensejo da celebração do “Dia da Consciência Negra”, painéis medindo 5 metros de altura, projetando retratos de afrodescendentes ilustres, foram afixados nas fachadas de inúmeros prédios públicos e privados. Entre eles, o “Theatro Municipal”. A iniciativa representou, segundo seus idealizadores, contribuição no sentido de resgatar a história de cidadãos negros proeminentes de certa forma “embranquecidos” em ações de flagrante impostura social.

Encarregado, naquela ocasião, da pesquisa que compôs 100 nomes de brasileiros negros com participação valiosa no desenvolvimento do país, o antropólogo Dagoberto José Fonseca, professor da Universidade Estadual de SP, explicou que existe, na comunidade brasileira, uma certa inclinação, sem dúvida censurável, de promover “uma espécie de branqueamento da cultura negra”. A pesquisa proporcionou revelações que deixaram surpreendidos não poucos segmentos comunitários. Muita gente, por exemplo, ignorava – e até hoje isso continua acontecendo – que a notável compositora Chiquinha Gonzaga, autora, entre outras belas canções, da célebre marchinha “Ó, abre alas!”, era negra. Num seriado televisivo que alcançou recordes de audiência, o papel de Chiquinha, que também se notabilizou pela corajosa postura em defesa das mulheres contra a opressão machista dominante em seu tempo, foi vivido por Regina Duarte, atriz branca de grande prestígio popular a ponto de se tornar conhecida como “namoradinha do Brasil”. Da lista em questão faz parte também alguém que, vivendo entre 1867 e 1924, militante político de destaque, chegou a ocupar a própria Presidência da República, Nilo Peçanha.

Mais sugestivos exemplos: é do desconhecimento público que o fundador da Escola Politécnica de São Paulo, o engenheiro de renome nacional Teodoro Sampaio, era um afrodescendente. E, ainda, que uma mulher negra, Virginia Leone Bicudo, fundou a Sociedade Brasileira de Psicanálise.

A divulgação dos 20 personagens negros, de presença cintilante no processo de construção do desenvolvimento cultural, escolhidos para figurar nos painéis mostrados nas ruas da maior cidade brasileira, provocou, fácil deduzir, reações de surpresa. Surpresas derivadas, obviamente, dos efeitos deixados no espírito popular pelo contexto social preconceituoso dos fatos acima narrados.

Eis a relação dos 20 patrícios retratados nos painéis: Clara Nunes, cantora; Carolina de Jesus, escritora; Virginia Leone Bicudo, psicanalista; Gonçalves Dias, poeta; Mário de Andrade, escritor; Milton Santos, geógrafo; Cruz e Souza, poeta; Carlos Gomes, compositor; Lima Barreto, escritor; Chiquinha Gonzaga, compositora; Luiz Gama, advogado; José do Patrocínio, jornalista; Leônidas da Silva, craque de futebol; Juliano Moreira, médico; André Rebouças, engenheiro; Teodoro Sampaio, engenheiro; Machado de Assis, escritor; Castro Alves, poeta; Geraldo Filme, músico; Nilo Peçanha, político.


Discurso de improviso

Cesar Vanucci

“Um bom discurso de improviso
exige pelo menos três semanas.”
(Mark Twain)

Chegou na sede da Associação de Pais e Mestres no finzinho da reunião e foi logo recebendo da presidente inesperada incumbência: saudar visitantes ilustres do exterior. Professores e estudantes da Pensilvânia, campeões de “wakeboarding”. “Enfatize o feito esportivo. Vamos entregar-lhes um troféu. Temos interesse em fortalecer o intercâmbio com eles.” Foi o que disse a presidente, sem conceder-lhe tempo para argumentar, antes de deixar, às carreiras, a sala. Toda festiva, os braços abertos em sinal de fraterna acolhida, caprichando no timbre de voz para os “rauduidus” de praxe, ela conduziu a comitiva até o auditório. “Eles apreciam pontualidade e eu também”, asseverou.

- E essa agora? Questionou-se com os seus botões, pensamento embaralhado, o nosso indigitado orador. Lamentou haver comparecido à reunião. “Não estaria agora a pagar esse baita mico. E que diacho de coisa é esse tal de “wake sei lá o quê?!” Sentiu-se perdido em meio a solitárias e silenciosas indagações. Lançou um olhar súplice ao redor. Percebeu logo que ninguém ali estava a fim de compartilhar suas aflições. A mesa da sessão começava a ser composta. O público numeroso cuidava, em ruidosa movimentação, de se apoderar dos assentos não ocupados no auditório. Suas ruminações mentais não calavam. Tentava, embalde, consolar-se com a ideia de que, diante da inevitabilidade da incômoda situação, o melhor a fazer era relaxar. Classificava, tardiamente, de supina besteira a concordância dada, dias antes, para a inclusão de seu nome, como orador, na chapa da Associação. O hino de abertura da sessão acabara de ser entoado. A hora do pronunciamento se acercava e ele ainda sem saber como se arranjar na fala para os gringos. Pior, consciente da condição de analfabeto de pai e mãe com relação ao tal esporte de nome complicado. Que tal se invocasse ajuda da Medalha Milagrosa? Descartou a opção por lhe parecer oportunista, consideradas as circunstâncias de nunca lhe haver passado pela cachola a intenção de integrar o grupo de devotos fervorosos da santa. Na busca de auxílio providencial, agarrou-se à ideia de invocar São Judas Tadeu. Adepto do santo não podia, em boa e leal verdade, dizer que era. Mas, de qualquer maneira, pesava a favor o fato de haver acompanhado a patroa em celebrações no santuário erigido em louvor de São Judas pela veneração popular. Mesmo após a invocação sentiu a estrutura óssea balançar, no momento crucial da chamada à tribuna. O coração saltitante, esmerou-se em pronunciar pausadamente as palavras. Rodeou toco o quanto pôde, com filigranas retóricas. Não se atreveu, estrategicamente, uma vez sequer, a citar a modalidade esportiva em foco. Com algum domínio da situação, deixou-se arrastar pela empolgação. Proclamou então que os homenageados, educadores de escol e coisa e loisa, cumpriam exemplarmente histórica missão, aplicando os recursos de um esporte tão apaixonante e valoroso no burilamento da têmpera e caráter dos jovens. Lastimou que tão enriquecedora prática não recebesse entre nós o incentivo devido. Arrancou, para surpresa, uma ovação. Os desportistas campeões abraçaram-no efusivamente, impressionados com tão incisivo apoio à sua causa esportiva.

Um grupo de estudantes, seu filho entre eles, trouxe-lhe, na hora dos cumprimentos, inusitada proposta. Já que se confessara simpático à prática do “wakeboargding”, a moçada resolvera elegê-lo, ali mesmo, patrono do nascente time do educandário. Tocava-lhe, à vista disso, a suprema honra de abrir, com substanciosa doação, o livro de ouro instituído para a aquisição do material de treinamento. Meteu o chamegão no livro, sem tugir nem mugir, o sorriso amarelo, com a cara de quem estivesse conquistando o troféu de “cavalgadura do ano”. Recordou-se de uma cena do passado: vovô Querino, num ajantarado dominical familiar comemorativo de suas bodas de ouro matrimoniais, proclamando sentencioso que quem fala demais dá bom dia a cavalo...

Ainda por se refazer das imprevisíveis emoções do dia, sentiu a língua coçar de tanta vontade de perguntar ao filho, na volta de carro pra casa, o que vinha a ser mesmo esse tal de “wake... sei lá bem o quê...”. Faltou coragem...

A SAGA LANDELL MOURA

Uma mulher rodeada de palavras

                             *Cesar Vanucci “Quem traz na pele essa marca Possui a estranha mania de ter fé na vida” (verso da canção “M...