Racismo,
praga daninha
Cesar Vanucci
“Detesto futebol. Detesto ainda mais porque as pessoas estorvam e inundam as avenidas para fazer com que se demore duas horas para chegar em casa. E tudo para ver um macaco. Brasileiro, mas ainda macaco.”
(Carlos Manuel TreviñoNúñez, político mexicano, em ofensa racista a um atleta brasileiro contratado, anos atrás, por clube de seu país)
O
“Dia Nacional da Consciência Negra”, cuja celebração é criticada em alguns
retrógrados setores políticos, confere-nos a oportunosa ensancha de tecer
considerações sobre o racismo, essa praga daninha. Uma espécie de tiririca. Ou
seja, essa graminha manhosa descrita num saboroso poema roceiro magistralmente
recitado pelo Rolando Boldrim em seu apreciado programa na TV Cultura.
Lamentavelmente, este escriba não conseguiu guardar o nome do autor do poema.
Os versos, de singelo lirismo, falam que “a gente pode arrancar a grama
tiririca, sacudi-la, virá-la de raiz pro ar, mas qua! – um fiapo escondido no
torrão faz a peste vicejar...”.
Aqui
e alhures, defrontamo-nos com iradas manifestações de intolerância merecedoras
de vigoroso repúdio. Nos “arquivos
implacáveis” conservamos um punhado de histórias relacionadas com o
efervescente tema. Se a elas nos reportamos, de vez em quando, é para
documentar ou ilustrar a incômoda permanência da questão racista no rol das
preocupações humanas mais angustiantes. Os Estados Unidos da América acumulam
exemplos de beligerância racista. Numerosos deles, como ocorreu ainda
recentemente, ganham extraordinária retumbância universal. Falaremos abaixo de
um desses desatinos racistas. Fez jus a manchetes.
O desvario mencionado provocou, entre compreensíveis reações de indignação, uma manifestação burocraticamente comedida de censura da alta cúpula governamental estadunidense, que se agarrou à inconsistente tese de que episódios do gênero constituiriam ações isoladas no contexto comunitário. Tese, com absoluta certeza, enganosa. Estrepitosamente desmentida na rotina cotidiana, como comprova o noticiário nosso de cada dia ao relatar confrontos de rua sangrentos produzidos frequentemente pela virulência racista.
Vamos adiante. Às pessoas atentas não passa despercebido o fato de que, em aeroportos dos EUA e Europa, guardas aduaneiros estabelecem pelo olhar carregado de desconfiança uma triagem prévia dos passageiros desembarcados. Em momentos de surto histérico, muitos viajantes são impedidos até de desembarcar. As pessoas claras desfrutam, de modo geral, nesses portais de chegada, de tratamento especial, com garantia de circulação ágil pelos guichês, direito a mesuras e acenos cordiais. Quando chega a vez do grupo dos amorenados, das pessoas de tez escura, pele amarela, aparência oriental, desvanece-se o sorriso cúmplice, substituído por polidez glacial, e por triques-triques que fazem a glória da rotina burocrática. Os semblantes crispados lembram os mal-humorados guardas russos e alemães de fronteira escalados para conferirem passaportes, revistar passageiros e bagagens dos antigos filmes dos gêneros de guerra e de espionagem. Não havia quem na poltrona do escurinho do cinema não sentisse, ao avistá-los, um baita calafrio na espinha.