quinta-feira, 5 de novembro de 2020

 

Fábrica de moleque malcriado...

 

Cesar Vanucci

 

“Nenhum taverneiro poderá vender farinha em cuia, que é ladroeira..."

(De um edital da Câmara da Vila de Catimbal, Minas Gerais, publicado no ano de 1868)

 

Na reorganização, tempos atrás, de minha biblioteca, meti a mão no fundo do baú, desencavando algumas preciosidades em matéria de livros e textos soltos. Foi assim que andei redescobrindo um exemplar do “Elixir do Pagé”, sobre o qual João Dornas Filho assim se expressa: “Um injustiçado pudor sempre dificultou a leitura do que eu considero os melhores versos de Bernardo Guimarães, os seus poemas eróticos. Sugeri, por mais de uma vez, a inclusão desses versos numa antologia galante, que contivesse outras joias líricas da nossa poesia e continuo a pensar que constituiriam um escrínio precioso da nossa poética”.

 

Uma outra publicação rara, ofertada pelo próprio autor, a pessoa de meu apreço pessoal por ocasião de visita que lhe fez, na década de 30, em sua fazenda em Ponte Nova, é o livro que contém o desassombrado pronunciamento nacionalista de Arthur Bernardes, na sessão de 18 de junho de 1937, na Câmara dos Deputados, sobre a Itabira Iron.

Sem que me veja em condições de poder explicar em detalhes, recorrendo apenasmente à memória, como foram parar em meus “arquivos implacáveis”, deparei-me, também, nessa mexida, com documentos de nítido caráter picaresco que me disponho, agora e em dois outros momentos na sequência, pelo seu sabor hilário, a trazer ao conhecimento de meus preclaros leitores. Os textos republicados ajudam a quebrar a sisudez dos comentários sobre a temática política e econômica desta hora de pandemia e pandemônio.

 

O que vem aí é a transcrição de uma portaria editada pela Câmara Municipal de Catimbau, Província de Minas Gerais, no ano de 1868. Foi encontrada nos arquivos do INPM.

“Antônio Pires de Noronha Franco, fiscal aprovado pela Câmara desta Vila de Catimbau Minas Gerais:

Faço saber aos povos desta vara que no dia 1° do mês que vem sairei em triunfo de correção aferindo os pesos de todos, bem como as respectivas.

Art. 1°- Ficam proibidos os regos. Aqueles que não mandarem tapar os que tiverem, bem como todos buracos, serão multados em 20$000 cobre.

Art. 2°- Nenhum animal de ordem das cabras poderá roer pelo vizindário.

Art. 3°- Nenhum negociante ou taverneiro, ainda mesmo Coronel da Guarda Nacional, poderá vender farinha em cuia, que é ladroeira.

Art. 4°- Negro sem bilhete, tarde da noite na rua, é ladrão. Multa no senhor de 6$000.

Art. 5°- Português de braço dado com negra cativa, alta noite, é fábrica de moleque malcriado e sem-vergonha. Cadeia nos dois, um em cada xadrez, para evitar dúvidas.

Art. 6°- Boi ou vaca deitado na rua de noite, sem lamparina no chifre, do modo que os andantes não o vejam bem, multa de 5$000.

E para que não digam que não sabiam mando afixar este edital e mais outro na porta de frente e de trás do boticário, que é o lugar onde se fala da vida alheia.

Em 4 de março de 1868.”

 

Ofereço, na sequência, a transcrição de uma decisão distribuída no âmbito do Juizado de Direito da comarca de Porto de Folha, Bahia, datada de 15 de outubro de 1833.

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