sexta-feira, 3 de abril de 2020


O ser humano em primeiro lugar

Cesar Vanucci

“A economia é um meio pra se atingir um fim social.”
(José Alencar Gomes da Silva, saudoso homem público e líder empresarial)

Proteger vidas, proteger a economia! Palavras que ressoam longe, ouvidas, com insistência mântrica, nesta hora de perplexidade e preocupação generalizadas. Importa anotar, no contexto atual, sutil observação. A observação deriva de inarredável princípio contido na cartilha humanística. O primeiríssimo lugar, nas ações cogitadas com o objetivo de apontar soluções para os problemas que se enfileiram na trajetória da pandemia do coronavírus, terá que contemplar, sem tergiversações, o ser humano. Ele, ser humano, há que ser sempre visto como medida suprema e correta de tudo. Alvo prioritário em todo e qualquer projeto elaborado com o propósito de construção e valorização da vida.

Instrumento imprescindível, extremamente valioso no ordenamento institucional do processo civilizatório, a economia faz jus, a seu turno, a especial atenção. Cabe aqui, entretanto, enfatizar: tanto quanto a ciência, a educação, a política, a tecnologia e outros relevantes mecanismos criados pelo labor e engenhosidade humanos, a economia não é fim em si mesma. Um bocado de gente, por esse mundo de Deus afora, pensa que é. Labora em tremendo equívoco. O equívoco dá margem a indesejáveis efeitos sociais. A economia é, sim, meio eficaz para se atingir um fim. O fim é sempre social. No centro de tudo, como beneficiário das atividades econômicas, situa-se o homem. Assim reza a lei da vida, superior a todas as demais leis e normas instituídas.

O conceito alinhado, como já dito na cláusula humanística, recolhe inspiração nas lições espirituais transmitidas, desde o começo dos tempos. Homens e mulheres de boa-vontade sinceramente empenhados na construção de um mundo melhor conhecem disso, à saciedade. Embora saibamos que, em numerosas e cruciais ocasiões, na marcha da história, tal conceito seja desprezado, descartado, relegado a plano inferior, por força de egoísticas conveniências, de ambições hegemônicas, por carência de solidariedade, é essencial mantê-lo bem aceso nas mentes e corações generosos de forma a assegurar  condições a que possa prevalecer, acima de outros interesses, em situações e circunstâncias complexas e difíceis como as que agora atravessamos.

Proteger a vida representa, portanto, magna prioridade. Reconhecer isso implica, naturalmente, em decisões que reservem o maior quinhão dos recursos a serem carreados ao enfrentamento vigoroso da crise para os menos favorecidos. Para quem esteja, sob o ponto de vista financeiro, inteiramente desguarnecido. Para os desempregados e para quem se veja ameaçado de perder renda e não disponha das reservas necessárias a própria sobrevivência e de familiares. Os melhores e mais graduados especialistas em políticas sociais, dentro ou fora das organizações executivas governamentais, devem ser convocados a participar da ampla coalizão de forças vivas da Nação encarregada de promover ações emergenciais que propiciem assistência a esses contingentes populacionais da sociedade, de maneira a minorar seus padecimentos. Esta frente de ação social se junta à frente da ação médica desencadeada desde o aparecimento do primeiro caso de contaminação detectado.

Outra frente de trabalho fundamental que também requer urgência, diz respeito a proteção da economia. O óbvio ululante: as iniciativas humanitárias emergenciais recomendadas, oriundas de irrevogável imposição social, não excluem, jeito maneira, a imperiosa necessidade de providencias que resguardem as atividades produtivas quanto aos riscos de colapso. De grupos técnicos e administrativos qualificados, recrutados no serviço público e na iniciativa privada, a sociedade brasileira espera também uma série de providências, urgentes, que impulsionem os pequenos negócios, as minis, pequenas e médias empresas. Enfim, mantenha a sobrevivência, com condições de superar as adversidades deste instante, o complexo produtivo, nele injetando estímulos de ordem tributária e financiamentos de longo prazo a  custos módicos. Será de ajuda inestimável, a entes privados, jurídicos e mesmo governamentais – caso dos Estados que compõem a Federação – a prorrogação das quitações das dívidas tributárias ou de outra natureza contraídas com a União.

Por último, ainda a propósito dos problemas suscitados pelo surto do Covid-19 mais este registro. Os posicionamentos ambíguos e extravagantes pronunciamentos recentes do presidente Jair Bolsonaro estão provocando, dentro e fora do país, compreensíveis reações. As críticas vão desde a estupefação até a indignação, partindo do mundo científico de organizações internacionais, círculos políticos, culturais, classistas e religiosos, meios de comunicação social, enfim, de todos os segmentos representativos da opinião pública. Até mesmo entre integrantes da esfera governamental dá pra perceber, em manifestações vindas a público sinais de desaponto e constrangimento, nos semblantes, nos gestos e nas falas. Tudo isso é lamentável.

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