sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Ato solerte e impatriótico

Cesar Vanucci

“Uma vergonha esse leilão da Amazônia.”
(Gisele Bundchen, abrindo o coro de vozes contra  o decreto que descaracteriza importante reserva estratégica )

Aqui dentro, muita perplexidade e indignação. No estrangeiro, naqueles redutos freneticamente engajados na conspiração contra a soberania brasileira no que concerne ao dadivoso território da Amazônia, feérica exultação.

O decreto do governo brasileiro extinguindo a Renca (Reserva Nacional de Cobre e Associados), com o alegado objetivo de atrair “novos investimentos” para o setor de mineração, pegou de surpresa apenas os brasileiros. Lá fora, de posse já há meses de “informações altamente privilegiadas”, transmitidas – por mais inacreditável que isso possa soar – por fontes governamentais, grandes corporações internacionais vinculadas ao setor do minério, babando de contentamento, já estavam carecas de saber da solerte e impatriótica manobra...

Do que andaram certeiramente cuidando, nesse espaço de tempo previamente prodigalizado, foi das competentes “articulações negociais” com quem de direito, mode quê poderem se habilitar à exploração das colossais jazidas da reserva amazônica, atendendo naturalmente a  conveniências que, como de costume, passarão ao largo dos interesses nacionais em sua plenitude.

Bastante compreensível, à vista da zorra praticada, as vigorosas reações de protesto e inconformismo ouvidas Brasil afora com alusão à medida adotada. Como já se tornou praxe no governo Temer - o mais desacreditado e impopular da história republicana -, deliberações vitais para o país vêm sendo tomadas sem as cautelas  indispensáveis dos diálogos e debates frutíferos com aqueles segmentos da sociedade afeiçoados técnica, politica, econômica e socialmente com as palpitantes questões em foco. É simplesmente inacreditável imaginar que um assunto como esse da Renca - implicando na descaracterização de uma reserva estratégica numa região que é alvo permanente da cobiça estrangeira, abrangendo fatia territorial repleta de riquezas pertencentes ao patrimônio nacional de tamanho equivalente ao Espírito Santo, maior ainda do que a Dinamarca inteira – esteja sendo tratado de forma tão irresponsável, com flagrante desrespeito ao sentimento nacional!

A área afetada é riquíssima em ouro e outros minérios de importância crucial no projeto de crescimento econômico e social de nosso país. Estendendo-se por quase 4 milhões de hectares, abriga verdadeiros tesouros ecológicos, representando um ponto de referência fundamental no processo de proteção ambiental. Qualquer providência concernente à implantação de atividades exploratórias nesse pedaço de chão há que ser subordinada a preceitos rigorosamente compatibilizados com estratégias políticas e militares exclusivamente brasileiras. Um decreto como esse, tirado suspeitosamente, sem mais nem menos, de repente, da cartola, sem o precedente de estudos amplos, gerais e irrestritos por parte de especialistas comprometidos com as genuínas causas de construção do progresso brasileiro, não pode deixar de ser rechaçado pela consciência cívica. Encontra plena justificativa, portanto, a indignação que vem suscitando, a partir das manifestações de figuras de projeção no mundo artístico com histórico de engajamento em causas ecológicas. A modelo Gisele Bundchen foi muito inspirada quando classificou o decreto de “vergonha”, um passo dado na direção de leiloar a Amazônia. A cantora Ivete Sangalo também falou por todos nós, ao lançar o desabafo de que “chega uma hora que a gente não aguenta e dá aquele grito”. O seu brado de protesto foi ouvido com a mesma simpatia das manifestações de Cauã Raymond, Luciano Huck e outros mais, que reconheceram na decisão governamental “uma ameaça de retrocesso”, “uma brincadeira imperdoável com o patrimônio do povo brasileiro”.

Fala-se agora que, no Congresso Nacional alguns parlamentares cogitam fixar urgência e prioridade para discussão do caso. Seria extremamente desejável que eles conseguissem vislumbrar aí oportunidade de ouro para que o Legislativo, forçando o governo Temer a revogar o malsinado decreto, se recomponha, nesta hora, com o sentimento popular. Faça prevalecer, usando de suas prerrogativas, aquilo que o bom senso e o civismo apontam como o caminho a ser trilhado na nevrálgica e candente questão da Renca.


O cotidiano político 
em notas ligeiras

Cesar Vanucci

“Governabilidade é o nome que se dá à compra 
de  apoio parlamentar para aprovar a agenda de um governo.”
(Jornalista Nirlando Beirão, numa definição 
bem humorada sobre o momento político)

“A Lava Jato é imparável.” Foi o que asseverou a presidente do Supremo Tribunal Federal, Carmem Lúcia, durante o fórum “Mitos e fatos – Justiça brasileira”, realizado em São Paulo. Mesmo levando em conta a credibilidade e o respeito que a Ministra desfruta perante a opinião pública, por ser exatamente quem é, não há como resistir à tentação de fazer uma pergunta, depois de ouvir sua declaração. A indagação irrompe naturalmente do aturdimento causado pelas escancaradas articulações (noturnas e diurnas) procedidas com o fito de desativar saneadora operação, envolvendo cidadãos graduados, até nos trasanteontens do tempo, considerados acima de qualquer suspeita: - A senhora jura, Ministra?

Com toda aquela panca estilosa, lembrando empertigado mordomo britânico ( personagem estandardizado em filmes), com que se apresenta diante das câmeras para pronunciamentos, o presidente Michel Temer garantiu, em exposição feita para plateia de banqueiros, que “o governo fez em 17 meses o que não foi feito em 20 anos.” Se vivo estivesse, o irreverente Stanislaw Ponte Preta certeiramente não titubearia, fração de segundo sequer, em incluir a jactância presidencial no famoso “Febeapa” (Festival de Besteiras que Assola o País).

As gafes geográficas cometidas no exercício de mandatos presidenciais constituem iguarias saboreadas pelo jornalismo. Isso vale tanto para detentores do poder estrangeiros, quanto para dirigentes tupiniquins. Quando visitou o Brasil, Ronald Reagan registrou, na descida do avião, o imensurável prazer que dele se apoderou ao pisar pela primeira vez o solo da Bolívia. O despropósito desovado levou criativa agência de publicidade, ato incontinente, a “homenageá-lo” com calorosa mensagem de boas vindas ao “Primeiro Ministro do Canadá”. Donald Trump é outro que vive aprontando confusões indicativas de seu desconhecimento da geografia, pra não dizer naturalmente de sua enciclopédica ignorância a respeito de tudo. Já aqui no Brasil o noticiário se divertiu à pamparra com as constantes “claudicadas” de Lula e Dilma. A vez agora é de Temer. Aqui estão situações, todas recentes, protagonizadas pelo dito cujo. Ao brindar, num ágape no Itamaraty, o chefe de estado paraguaio, Horácio Cartes, nosso dirigente supremo referiu-se a Portugal ao designar o país do visitante. Na Noruega, Temer anotou satisfação em estar na Suécia. Na Rússia, chamou o país de “República Socialista Federativa Soviética”, denominação abolida desde a glasnost e a perestroika em 1991. Repetiu a dose, ao comentar encontros mantidos com empresários russos, rotulados em sua fala como “empresários soviéticos”.

O talentoso jornalista mineiro Nirlando Beirão, herdeiro do nome de seu ilustre pai, empresário que marcou época como dirigente classista, define de forma bem humorada o que vem a ser “governabilidade” no conceito de manjados representantes da fauna politiqueira: “É o nome que se dá à compra de apoio parlamentar para aprovar agenda de governo. Claro que, quando o fazemos, preferimos usar um eufemismo. Dizemos: articular coligações em torno de um projeto patriótico. Você conseguiu? Parabéns, você é um governante de aguda sensibilidade, negociador de fino trato. Seu adversário fez o mesmo? Denuncie a falta de escrúpulos, a atroz barganha de princípios por conveniências, da honradez pela ambição. Já se o seu adversário de recusou a entrar no mercado de congressistas de aluguel, acuse-o de ser politicamente incompetente, incapaz de assegurar a governabilidade.”


Participando de um evento em São Paulo, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa da operação Lava Jato, afirmou: “Tenho para mim que encontros fora da agenda não são ideais para nenhuma situação de um funcionário público. Nós mesmos, no dia da votação do impeachment (Dilma Rousseff), fomos convidados a comparecer ao Palácio do Jaburu à noite e nos recusamos.” Não há como deixar de associar tão sensata observação às notícias concernentes a visitas não devidamente agendadas, ao Jaburu, nas caladas da noite, por agentes públicos influentes, como nos casos do Ministro Gilmar Mendes, do Supremo, e da futura Procuradora Geral, Raquel Dodge.

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