sexta-feira, 26 de junho de 2015



    Indícios encorajantes


Cesar Vanucci

“O Governo estava aparentemente perdido (...), mas tenta agora recuperar
 a iniciativa com bons projetos de concessões e estímulos às exportações.”
(Delfim Neto)

Otimista de nascença, conservo acesas a fé e a confiança no Brasil. O que não me impede de perceber a carga, mais avolumada agora do que em passado recente, dos desafios cruciais a encarar na caminhada da construção nacional. Não me deixo, tampouco, levar pelo exagero de contemplar a realidade pelas lentes de aumento do doutor Pangloss, mitológico personagem de Voltaire.

Os sinais de que muita coisa não anda funcionando a contento são abundantes. Desconhecê-los traduz grotesca ingenuidade. Mas, mesmo atento ao que vem pintando no pedaço, não dá pra embarcar de corpo inteiro nessa onda borbulhante de desalento surfada por frenéticas “cassandras do catastrofismo” espalhadas na praça. O Brasil não está à beira do abismo, nem rolando despenhadeiro abaixo pro fundo do poço. A realidade, conquanto amarga, não se mostra tão assustadora quanto alguns querem fazer crer.

De outra parte, para os males detectados existe, sim, receituário eficaz. É preciso saber empregá-lo com bom senso, sem abrir mão das conquistas essenciais acumuladas. Elas derivam das ações bem sucedidas, ao longo dos tempos, das forças vivas da Nação. Uma dessas conquistas se projeta com nitidez solar na pujança do nosso sistema democrático. Um sistema que respalda, mercê de Deus, o funcionamento em plenitude das instituições republicanas que nos regem. Atentemos, a propósito, para o roteiro eleitoral (de décadas) impecavelmente cumprido. A liberdade ampla de expressão é outra referência brasileira refulgente. Nessa sequência costumeira de “rankings” divulgados pelos veículos de comunicação não haverá como não atribuir ao país, na modalidade registrada acima, lugar no topo da lista.

Afigura-se relevante, nesta hora, preservar as conquistas jurídico- trabalhistas e os avanços sociais. São indicativos de um estágio de desenvolvimento que vem sendo alvo de louvores no mundo inteiro.  Dias atrás, por exemplo, o embaixador Raffaeli Trombeta, da Itália, em declaração aos jornais, sublinhou que “tirar o Brasil do mapa da fome foi uma lição para o mundo!”

E nem se queira também ocultar, em meio às turbulências econômicas, os indícios encorajantes de ações voltadas para  a retomada do desenvolvimento. O cenário do chamado empreendedorismo não se quedou inerte. O comportamento do agronegócio chama a atenção positivamente. Delfim Neto registra que “o Governo estava aparentemente perdido, concentrado apenas na defesa do necessário “ajuste fiscal”, mas tenta agora recuperar a iniciativa com bons projetos de concessões e estimulo às exportações”. Exemplifica “com o excelente Plano de Safra para 2015-2016”. Segundo o festejado  economista, os agricultores expressaram total apoio a essa empreitada: “Afinal, são quase 190 bilhões de reais alocados ao setor para custeio, investimento e comercialização da safra!” Ele sabe do que está falando.

Os resultados superavitários da balança de pagamentos nos últimos meses e a notória expansão do segmento da comunicação eletrônica noticiam igualmente a ingente mobilização de esforços da sociedade no enfrentamento dos problemas. Outros setores produtivos confessam-se igualmente articulados na tarefa de promover o desenvolvimento. Boa amostra disso: na edição de 1º de junho do “Diário do Comércio”, dirigentes de importante rede hoteleira anunciaram que, de seus 75 projetos em implantação, 43 unidades já estão em fase de construção com inauguração prevista no prazo de 36 meses. Outro grupo do mesmo setor, na mesmíssima edição, fala também da implantação em diferentes regiões do País de 30 novas unidades de hotelaria, várias em Minas. Dentro desse mesmo diapasão construtivo encaixa-se o comentário conclusivo a respeito do substancioso ciclo de debates que, recentemente, reuniu líderes empresariais e elementos de proa na área do estudo econômico, formulado pelo diretor geral da “VB Comunicação”. Responsável pela realização do “Conexão Empresarial de Araxá”, o jornalista Paulo Cesar de Oliveira, ao registrar o êxito alcançado pelo magno evento, afirmou que “a crise é fabricada e os empresários já estão em busca de soluções”. Acrescentou que “a desaceleração é passageira e o momento é de oportunidade.” Levando em conta também o que declaram dirigentes empresariais da expressão de Murilo Ferreira, da Vale, Tadeu Carneiro, da CBMM, Luiza Trajano, do Magazine Luiza, e Lúcio Costa, da Suggar, obstinados (ao lado de tantos outros) construtores do progresso, não há como recusar a evidência de um avantajado empenho nas áreas produtivas de sobrepujar, com ousadia, persistência e criatividade, as dificuldades desta hora.

De outra parte, depois das expectativas extremamente favoráveis geradas pelas negociações ocorridas por ocasião da visita da delegação governamental e empresarial chinesa, acenando com a injeção de recursos da ordem de 53 bilhões de dólares na economia, o lançamento do plano governamental de concessões em infraestrutura é uma proposta de trabalho merecedora de ser vista, conforme frisou Dilma Rousseff, como um sopro de “oxigênio do otimismo e da esperança.” O pacote de investimentos para projetos prevê quase 200 bilhões de reais, a serem aplicados em ferrovias, rodovias, aeroportos e portos.

Oportuno repetir a fala conceitual de Louis Pauwells: não pega bem mesmo, na contemplação do mar, falar apenas dos enjoos das travessias de curta duração.


       Falando de livros

Cesar Vanucci

“Olhem o céu. Perguntem: Terá ou não terá o carneiro
comido a flor? E verão como tudo fica diferente...”
(Trecho de “O Pequeno Príncipe”)

Nos anos 50 – conservo a cena bem viva na memória –, “O Pequeno Príncipe” foi tema de uma tertúlia literária realizada no auditório da Radio Difusora de Uberaba. O livro de Antoine Saint Exupéry, traduzido para o idioma brasileiro por Dom Marcos Barbosa, andava encantando o público com sua lírica proposta humanística, espalhando certa perplexidade nos círculos intelectuais ortodoxos, infensos a fórmulas narrativas de cunho renovador.

Atuando como expositor, com aquela fecundidade de ideias que iluminou sua trajetória como professor e filosofo, o saudoso amigo e conterrâneo Moacir Laterza interpretou de forma magistral a mensagem da obra, fornecendo provisão para um debate que não se esgotou no encontro havido. Prolongou-se noutras reuniões mais, com os participantes, já aí, melhor inteirados da obra do autor. Os títulos com o seu nome, disponíveis nas livrarias da cidade, esgotaram-se da noite para o dia.

Não me surpreende nadica de nada por conseguinte que, ao longo dos 60 anos já transcorridos, a historieta poética bolada pelo jovem e criativo escritor francês siderado em aviação, falando das peripécias do garoto curioso que nunca, na vida, renunciava a uma pergunta que houvesse feito, continuasse a despertar atenção e carinho por tudo quanto é canto. Mas, mesmo assim, deixo-me arrebatar por indizível sentimento de ternura, por uma emoção que não sei caracterizar com exatidão, ao tomar conhecimento, aqui e agora, em meio à lufa-lufa destes tempos conturbados, de um registro perdido nas páginas da “Veja”, seção que aponta os “livros mais vendidos” segundo verificação feita nas maiores livrarias, de que “O Pequeno Príncipe” é o segundo título mais procurado pelos leitores de ficção na extensa lista dos “best sellers” da hora.

Encontro dificuldades – perdoem-me – para saber traduzir com palavras corretas a sensação de deleite que isso produz.

Decisão histórica.
O Supremo Tribunal Federal acaba de tomar outra decisão histórica. Jogou por terra estrepitosamente a exigência da autorização prévia para publicação de biografias. Até aqui prevalecia o entendimento – considerado por eminentes juristas lesivo ao exercício pleno dos direitos assegurados pela Constituição – de que a editoração e circulação de uma obra biográfica só poderia ocorrer com autorização do biografado ou de seus herdeiros. Esse consentimento prévio, que inviabilizou, ao longo dos anos, a efetivação de importantes projetos concernentes a figuras de relevo histórico, passa a ser, doravante, página virada na crônica cultural.

A medida decretou, em suma, a eliminação do que era visto, de há muito – repita-se –, por influentes correntes do pensamento jurídico, como inequívoca “censura prévia”. O respeito à liberdade de expressão, “uma liberdade preferencial” por tratar-se de pressuposto para o exercício dos demais direitos fundamentais, como definido no voto do Ministro Luiz Roberto Barroso, foi a base de sustentação do posicionamento assumido na alta Corte. Para quem, a partir da medida aprovada, se sinta molestado face a qualquer texto biográfico relativo à sua vida e obra, ou de personagem público do qual seja descendente direto, haverá sempre disponível o recurso judicial, com a perspectiva de ressarcimentos moral e pecuniário.

Nas manifestações a respeito da matéria, que foi suscitada por ação proposta pela Associação Nacional de Editores de Livros, os magistrados deixaram anotado seu apreço e respeito a um preceito basilar na vivência democrática: a livre manifestação das ideias. “O peso da censura, ninguém o suporta”, afirmou o Ministro Celso de Melo. “Pela biografia não se escreve apenas a vida de uma pessoa, mas o relato de um povo, os caminhos de uma sociedade”, afiançou também a Ministra Carmen Lúcia, juntando à afirmação um saboroso dito popular: “Cala boca já morreu...”
Vou dizer a verdade

Gaudêncio Torquato *


Senhor Juiz, sobre essa Bíblia Sagrada, vou dizer a verdade, nada mais que a verdade. O Brasil é a terra da ética, do respeito aos valores morais que dignificam o Homem. Aqui, nenhum cidadão deixa de cumprir a lei. O caráter do povo é imaculado, fruto de uma herança cultural profundamente alicerçada no civismo, na solidariedade, no culto às tradições, na religiosidade, no respeito aos mais velhos, no carinho e proteção às crianças e na repartição justa dos bens produzidos. Somos uma Nação onde a Justiça não tarda, onde os juízes decidem sob o véu que cobre os olhos de Themis, a deusa da Justiça. Neste território, atingir a honra de um cidadão equivale a ferir a alma da Pátria. Preservamos o abençoado lema: "todos por um e um por todos". Longe daqui o bárbaro costume de “tirar vantagem em tudo”. 
Os representantes do povo cumprem religiosamente suas promessas. São exemplos de civilidade, magnanimidade, correção e desinteresse pessoal. Estão todo tempo próximos dos eleitores, não aparecendo em suas regiões apenas no período de campanhas eleitorais. Nosso sistema federativo vive em harmonia e equilíbrio. Estados e Municípios repartem equitativamente com a União suas partes do bolo federativo. Os recursos recebidos são suficientes para prover as necessidades fundamentais da população, principalmente nas áreas da saúde, onde os equipamentos são de última geração e o corpo médico propicia atendimento rápido, sem filas. Nossas escolas são de primeiro mundo, desde as do ensino básico às Universidades. Professores dão aulas magníficas, não faltam às suas obrigações, nunca fazem greve porque ganham salários dignos. Não se veem assaltos nem criminosos nas ruas. Nosso povo é pacífico e a igualdade entre as camadas da população é responsável por inserir o Brasil nos primeiros lugares mundiais do PNBF – Produto Nacional Bruto da Felicidade.
Os potenciais das regiões se somam e a racionalidade administrativa gera bolsões de riquezas, que se repartem pelas comunidades. O excedente é exportado e acarreta bilhões de divisas que, da mesma forma, são distribuídos pelas áreas exportadoras. Os estoques reguladores suprem todas as carências, não havendo crise hídrica e nenhuma ameaça de crise energética. Fornecemos energia aos nossos vizinhos mais necessitados. E até abrimos os cofres do nosso Tesouro para a consolidação de projetos de infraestrutura em Nações mais distantes. 
Nossas Casas congressuais votam apenas leis fundamentais. E fazem reformas necessárias ao aprimoramento e moralização dos costumes políticos. Agora mesmo, uma reforma política está em tramitação, podendo-se garantir que acentuará a modernização dos costumes, por meio de uma revolução de métodos comprometidos com a ética e com a moral. Em nossas plagas, não se produzem coisas desnecessárias. Quase não se fazem emendas a projetos de lei, do Legislativo ou do Executivo, porque eles são tão bem feitos, que dispensam reparos. Temos uma Constituição concisa, precisa e clara. Por isso, não há necessidade de interpretações da Letra Constitucional por parte da Corte Maior, o Supremo Tribunal Federal. Não se perde tempo com discussões inócuas. Gasta-se dinheiro com parcimônia e cada tostão é comprovado. Os credos evangélicos cobram dinheiro também com parcimônia, sem prometer o paraíso como troco ao dízimo. Não há ficção orçamentária, razão pela qual o Tribunal de Contas da União não encontra um real fora do lugar. 
Nas CPIs, tudo é muito rápido e objetivo. Os convocados aparecem nas sessões e respondem a todas as perguntas, sem fazer pressão sobre os componentes. Os políticos de maior renome recebem o mesmo tratamento emprestado aos mais simples e modestos. Temos uma representação regrada pela solidariedade, amizade, companheirismo, modéstia e simplicidade. Graças à modéstia do caráter, nossos parlamentares preferem se refugiar nos espaços do trabalho a encenar no palco do Estado-Espetáculo. Os fatos estão sempre acima das pessoas. Afinal de contas, não se cultiva no Brasil aquele sentimento exibicionista e sensacionalista de países do Hemisfério Norte. Aqui o sim é sim, o não é não. Nunca se emprega o talvez, o mais ou menos ou o “depende”. Nas campanhas políticas, não se gasta acima das posses de um candidato. Tudo às claras. Mesmo os mais ricos se impõem um compromisso ético de não usar o poder financeiro. Mandato é missão, não profissão. Empreiteiras, bancos, grupos econômicos estão longe de campanhas; isso é uma vergonha de países bárbaros. Os lucros dos bancos são repartidos em obras sociais. Por isso, o povo brasileiro exibe um dos mais altos índices de qualidade de vida do mundo. 
Quando um partido chega ao poder, executa fielmente seu programa. A honestidade é comum a todas as siglas. As entidades da sociedade civil se alimentam do pão cívico, que é, aliás, o grande alimento da Pátria.
Por aqui, a vaidade passa longe. Nosso Poder Judiciário não se corrompe como em Nações retrógradas. Não se conhece o caso de um juiz sequer que tenha sido flagrado cometendo um desvio. Adotamos uma linguagem de decência, de pureza e de respeito. Aboliu-se o palavrão. As mídias sociais são o espaço de respeito, compreensão e diálogo entre interlocutores. A cordialidade irmana a todos e não existe desamor. As mães são o símbolo da virtude e não geram imprecações desastradas na boca de ímpios.
Sobre a capa desta Bíblia Sagrada, juro que sei a verdade! 



* Jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação.

(Fonte: Diário do Comércio de BH - edição de 24/06/2015)

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