sexta-feira, 24 de abril de 2015

Os “zelotes” e as “contas secretas”

Cesar Vanucci

“Operação Zelote: o desvio é duas vezes
maior do que o escândalo do Lava-Jato!”
(Fábio Serapião, jornalista,
em reportagem na “CartaCapital”)


A grande mídia tupiniquim tem razões que a própria razão desconhece. O faro investigativo e os impulsos denuncistas dos repórteres e comentaristas espicham ou encolhem, volta e meia, de conformidade com imperscrutáveis desígnios.

Peguemos para averiguação a chamada “Operação Zelotes” e o caso das “contas secretas” do HSBC. Ambos os episódios fornecem elementos em demasia para corroborar a tese de que o comportamento de parte dos veículos de comunicação de massa é regido por critérios insondáveis, incompreensíveis à luz do senso comum.

As proporções das falcatruas praticadas na esfera do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), da Receita Federal, a tomar como ponto de partida os indícios já levantados pela Policia Federal, são de estarrecer não apenas um frade de pedra, mas todo o conjunto de estátuas de pedra sabão esculpidas por Aleijadinho no adro do Santuário de Congonhas.

Os valores sonegados ao Fisco, ao que dizem as investigações em andamento, chegarão a cifras estrondosas, nunca vistas dantes. Na alçada de avaliação da CARF acumulam-se, presentemente, 105 mil processos, implicando num montante de 520 bilhões de reais. A fraude tributária de início detectada ultrapassa a casa dos 6 bilhões de reais. O somatório das dívidas de bancos, montadoras de veículos, siderúrgicas e outros grandes devedores de diferenciados segmentos sob a mira das autoridades policiais, correspondendo num primeiro instante a 74 processos, chega às alturas himalaianas dos 19 bilhões de reais.

Não padece dúvida alguma, a esta altura, que se está a falar da maior fraude tributária já descoberta. Um verdadeiro “balcão de negócios” foi montado por alguns conselheiros inidôneos – uns, recrutados nos quadros burocráticos da Receita, outros indicados como representantes dos contribuintes -, com o fito de beneficiar sonegadores contumazes. O esquema criminoso assegurou a “redução”, mediante a generosa concessão de propinas, dos impostos devidos por gente engravatada “acima de qualquer suspeita”. Empresas de fachada, estruturadas pelos agentes infiéis, intermediaram o esquema dos favorecimentos indevidos.

A apreensão gerada nalguns setores específicos da vida econômica, comprometidos nessa tramoia criminosa dos “zelotes”, diante da ação fulminante das autoridades competentes no sentido de deslindá-la, é muito grande. Chega a ser mais intensa, no entender de observadores categorizados, do que até mesmo o susto e os temores provocados pelo “Lava Jato” junto às empreiteiras criminalmente enquadradas nesta operação.

À vista desse tantão de coisas, não deixa de causar espécie o comedimento exagerado, a cautela inusual que a mídia vem se impondo na divulgação dos fatos ligados às apurações sobre a questão. A opinião pública mostra-se surpresa com a ausência de “furos”, de reportagens “exclusivas”, de “vazamentos” assegurados por “fontes idôneas”, de revelações de nomes de projeção empresarial ou política apontados como integrantes da engrenagem mafiosa desarticulada.

A mesma estranheza que se tem quanto à cobertura midiática relativa à gigantesca fraude fiscal cabe ser igualmente aplicada ao noticiário e comentários dedicados às tais “contas secretas” do HSBC. Quase 9 mil cidadãos brasileiros, o quarto  contingente por nacionalidade do conjunto de pessoas investigadas por haverem cometido presumivelmente crimes de evasão fiscal, constam da lista fornecida por investigadores estrangeiros. O máximo a que o assim denominado “jornalismo investigativo”  animou-se a chegar, em matéria de informação antecipada concernente ao assunto, foi a citação de uma meia dúzia de três ou quatro personagens do meio artístico, sabe-se lá, logo eles, por que cargas d’água.

A impressão que sobra é de que não será empreitada tão simples assim a liberação geral da lista. E isso pelo “motivo” de que ela contempla, na realidade, figurões badalados no mundo dos negócios. Poderosos interesses estariam provavelmente atuando nos bastidores mode assegurar que a história das “contas secretas” acabe sendo encoberta, para tranquilidade de muita “gente respeitável”, pelas névoas do esquecimento. Isso aí.



Os argumentos de Guido

Cesar Vanucci

“O perigo de engessamento do pensamento e da cultura é evidente.”
(Guido Bilharinho, historiador)


Guido Bilharinho tem presença marcante na paisagem intelectual mineira. Escritor, historiador, professor, jurista, poeta, membro da conceituada Academia de Letras do Triângulo Mineiro, é autor de obra literária pujante. Tem-se por certo que, na área de ensaios cinematográficos, ninguém de sua geração produziu sequência de livros tão alentada e diversificada. Noutra vertente de sua polimorfa atuação, surpreendemo-lo concentrado em tarefas de pesquisa histórica relacionadas com a região em que vive, o Triângulo Mineiro.

O trabalho executado com talento e persistência tem-lhe permitido dar vida à memoria de fatos e fastos regionais que poderiam permanecer encobertos pelas névoas do esquecimento.

A contribuição que, por força de irrefreável inquietação cultural, traz ao conhecimento público sobre significativas experiências humanas de tempos já transcorridos, confere-lhe suficiente autoridade para postular, como aconteceu dias atrás, a atenção especial dos Senadores da República sobre o candente tema da regulamentação da função de historiador.

Sugiro aos leitores que se inteirem dos respeitáveis argumentos de Guido Bilharinho a respeito do assunto, alinhados na correspondência encaminhada à apreciação do Senado Federal. São considerações que enriquecem o debate.

“Exmos. Senadores da República, O projeto de Regulamentação da Profissão de Historiador, já votado no Senado e na Câmara Federal e agora de retorno ao Senado, ao dispor, no caput do artigo 4º e em seus incisos II e VI, que são atribuições dos historiadores a “organização de informações para publicações, exposições e eventos sobre temas de História” (II) e a “elaboração de (...) trabalhos sobre temas históricos” (VI) e que só os diplomados em curso superior de História podem efetuar tais medidas, implica na vedação aos demais cidadãos brasileiros de fazê-lo, além de constituir cerceamento de sua livre manifestação de pensamento, ferindo o disposto nas normas constitucionais constantes dos incisos IV e IX, do artigo 5º, já que impossibilita a todo cidadão brasileiro no gozo de seus direitos de pesquisar, estudar, analisar, opinar e discorrer no território nacional sobre qualquer tema histórico, nacional e universal, devendo-se levar em conta ainda, no caso, que todo acontecimento “histórico” o é, simultânea e às vezes preponderantemente, político, econômico e social. Em consequência, alijando no território nacional os brasileiros não diplomados em História de pesquisa, estudos, elaboração e publicação de temas históricos nacionais e universais, só lhes deixa alternativa de fazê-lo no exterior. Além disso, se estendida regulamentação semelhante aos formandos em artes plásticas música, letras e cinema por exemplo, ninguém mais, a não ser os privilegiados formandos nessas áreas, poderá publicar análises ou mesmo simples comentários e até noticiários sobre livros, filmes, composições musicais e quadros. O perigo de engessamento do pensamento e da cultura brasileira e seu anquilosamento em nichos ou corporações são evidentes. Assim, face ao exposto, sugere-se e pleiteia-se que os dispositivos citados sejam eliminados do projeto, que, no mais, escoimado dessas medidas cerceadoras, certamente virá contribuir para incrementar o interesse da juventude pela profissão de historiador. Uberaba, 8 de abril de 2015. Guido Bilharinho”.

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