quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Horror na Tanzânia


Cesar Vanucci *


“Eu decidi fazer alguma coisa.”
(Peter Ash, canadense, dirigente de uma ong
que vem denunciando o extermínio de albinos no leste-africano)

A estupidez, a superstição, a selvageria deram-se as mãos na Tanzânia, um país africano que frequenta as manchetes como palco de constantes tragédias, para produzir uma inimaginável história de terror.

Os albinos, ou seja, seres humanos portadores de anomalia congênita caracterizada pela ausência total ou parcial de pigmento da pele, dos pêlos, da íris e da coróide, vêm sendo, em certas regiões daquele país, caçados e massacrados. Partes dos corpos retalhados são vendidas para indivíduos obviamente insanos. Indivíduos que acreditam sejam os albinos, por conta da singularidade genética, detentores de poderes mágicos. Poderes capazes de influenciar o destino das pessoas. Eles, albinos, passam assim, inacreditavelmente, a ser equiparados a alguns animais inferiores, também perseguidos e abatidos com o intuito de extração de componentes anatômicos considerados de “excepcional qualidade” na produção de “preparados miraculosos”. Tais “preparados” são tidos e havidos, em redutos dominados pela ignorância e superstição doentia, como “infalíveis” na solução de graves padecimentos físicos e psicológicos. Proporcionam “ainda”, ajuda eficaz na superação de aflitivos problemas financeiros. E por aí vai...

As proporções assumidas pelo extermínio sistemático de albinos na Tanzânia levaram o empresário, ex-pastor religioso canadense, Peter Ash, ele próprio albino, a constituir uma ong empenhada no objetivo de fazer chegar ao conhecimento mundial as atrocidades e de sensibilizar o governo daquele país do leste africano a assumir uma posição vigorosa contra a revoltante e aterradora situação. A Tanzânia, de acordo com as estimativas da ong – a “Under the same sun”, em tradução, “Sob o mesmo sol” -, possui uma população de 170 mil albinos.

No leste-africano, o chamado albinismo apresenta incidência mais elevada do que em outros lugares do planeta. Admite-se que, para cada três mil bebês, um nasça albino. Os criminosos responsáveis pelo sequestro e trucidamento das indefesas vítimas nessa conspiração hedionda contra os direitos humanos agem às claras. Apostam na impunidade. Nenhum dos quase 200 indivíduos já acusados oficialmente de pertencerem a gangues “especializadas” na “caça” a albinos foi até agora submetido a julgamento. Jornalistas britânicos que estiveram na Tanzânia colhendo informações sobre o que vem acontecendo apuraram que os bandidos, portando entre outras armas facões afiados, invadem residências de albinos, executando as vítimas na frente dos próprios familiares. Retalham, alí mesmo, os corpos, carregando as partes que interessam ao apavorante “negócio”. Um repórter conta que, diante de seu “manifesto interesse” pela aquisição de “material mágico”, foi-lhe oferecido o cadáver de um albino pela “módica” soma de três mil e seiscentos reais...

Os sequestradores dão preferência a pessoas jovens. Cortam pernas, braços, cabeças e genitálias. Retiram pele e órgãos. Escalpelam. Recolhem sangue das vítimas. Propagam, junto à “clientela” em potencial, que a “mercadoria” à venda torna as pessoas que se disponham a adquirí-la mais prósperas e mais bem protegidas dos maus agouros. A gama de “produtos” oferecidos é ampla. Poções com sangue, sapatos feitos de pele, amuletos de ossos, redes de pesca com fios de cabelo humano entrelaçados às tiras de nylon, por aí. Um horror sem tamanho!

A ong que trouxe a si a tarefa de revelar ao mundo essa descomunal ignomínia está convencida de que as autoridades da Tanzânia não dispensam atenção alguma à palpitante questão, apesar das reiteradas manifestações do presidente do país de que irá atuar com extremo rigor na repressão às gangues. Muitos agentes de polícia, assevera a ong, acobertam as atividades criminosas, quando não fazem parte dos grupos de extermínio. Bota horror nisso!



Saneamento em regra


Poucas coisas conseguem aterrorizar tanto o cidadão
pacato quanto o conluio de bandidos com maus policiais.”
(Antônio Luiz da Costa, professor)

São episódios, ambos, que deixam o Poder Público muito mal em sua política de combate ao crime organizado. Num deles, tragédia de certo modo anunciada, que coloca em xeque a apregoada pacificação dos conflagrados morros cariocas, desassombrada representante da Justiça, Patrícia Acioli, foi eliminada por uma gangue fardada, chefiada por ninguém mais, ninguém menos, do que o próprio comandante de uma unidade da Policia Militar do Estado do Rio de Janeiro.

Noutro episódio, que ofereceu prenúncios de tragédia similar à da juíza, prestes a se consumar, cidadão com mandato parlamentar em curso, no mesmíssimo território fluminense, viu-se forçado a optar pela aceitação de um convite da Anistia Internacional para deixar o País por algum tempo, com familiares, mode que proteger-se das ferozes ameaças de grupos milicianos. Só nos últimos meses somaram 27 os atos de intimidação disparados contra o deputado em questão, Marcelo Freixo. Autor da CPI que mapeou o atemorizante sistema de milícias implantado no Rio de Janeiro, compostas predominantemente de policiais militares e civis, Freixo recorreu à Secretaria de Segurança Pública, à cata de proteção permanente. Tornou-se, no dizer do próprio titular da pasta, o cidadão mais bem protegido de todos os tempos nos rincões cariocas. Circunstância que ele não nega, ressalvando, entretanto, não mais conseguir conviver com as ameaças, e afirmando, enfaticamente, que o problema das milícias, que aumentaram de 170 para 300 em três anos, não pode ser considerado um problema exclusivamente seu. O parlamentar explicou, antes de embarcar para o exterior com destino por óbvias razões ignorado, que o grande debate da vida fluminense na atualidade é o enfrentamento das milícias. Os milicianos, vinculados a corporações encarregadas institucionalmente de “garantir o sossego e a ordem”, já torturaram jornalistas, extorquiram, mataram, inclusive uma magistrada, e ameaçam, agora, a vida de um parlamentar, sem que ações concretas – segundo ele - sejam tomadas, por quem de direito, no sentido de eliminar-se o braço econômico e territorial de que se valem nas sortidas criminosas que tanta intranqüilidade e temores espalham.

Para o parlamentar, nada é feito. Pior: por conta do que classifica de “cinismo oficial”, finge-se que o problema gravíssimo das atuantes milícias, que disputam, na marra, o controle de aglomerados com as quadrilhas de traficantes dos morros, não existe. “Minha saída do País é um protesto”, afiança.

Esses registros atordoantes reafirmam a certeza de que o contundente problema da insegurança urbana no Rio de Janeiro, com ou sem unidades pacificadoras, ou o emprego (ou não) de forças militares federais, tem que passar, inexoravelmente, na busca da solução ardentemente almejada pela sociedade, por um saneamento em regra do aparelho policial carioca. Sem a extirpação de todos os componentes dessa aterrorizante engrenagem o Rio de Janeiro continuará a ser, para imenso desgosto nacional, uma referência incômoda na crônica dos atentados contra a vida e o patrimônio.

A gravidade da situação atinge tal proporção que a opinião pública tende a admitir como verdadeira a alegação feita pelo “inimigo público” Nem – recentemente capturado depois de tentativa de suborno repelida com toda dignidade pelo grupo de policiais decentes que localizou seu paradeiro – de que só na Rocinha o tráfico destina 50 por cento de seus ganhos à chamada “banda podre” da polícia carioca.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

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