quinta-feira, 21 de março de 2024

A função social da riqueza


 

*Cesar Vanucci

 

"Eu resolvi financiar alunos da Einstein para sempre.”

(Professora Ruth Gottesman)

 




Na semana retrasada, todos os alunos da faculdade de Medicina Albert Einstein, localizada na região socialmente mais carente de Nova York, o bairro de Bronx, Estados Unidos, foram surpreendidos por convocação da  Reitoria, para uma reunião de emergência, sem pauta previamente anunciada. A chamada provocou alvoroço, dando origem a toda sorte de especulações. Na hora aprazada, diante de auditório lotado, mudo e quedo que nem penedo exprimindo algum receio quanto ao que iria ser dito, o Reitor da Instituição comunicou, em tom solene e pausado, que os estudantes da Albert Einstein ficariam desobrigados para sempre do pagamento das anuidades. Nos segundos seguintes o silêncio registrado foi ensurdecedor. Mais ensurdecedor ainda foi quando o público tomou consciência do lance extraordinário que deu origem ao auspicioso anuncio, explodindo em aplausos e gritos de incontida euforia. A explicação a respeito da gratuidade foi dada quando a multidão aquiesceu à ideia de uma pequena trégua para que o Reitor pudesse concluir sua bonançosa fala.   Aconteceu  o seguinte: uma antiga professora da escola, herdeira de fortuna deixada pelo marido super milionário, resolveu destinar um 1 bilhão de dólares, ou seja algo equivalente a 5 bilhões de reais, como quitação completa dos custos de graduação. O nome da benemérita, educadora é Ruth Gottesman, de 92 anos. Sua doação é tida como a maior já registrada na história de universidades americanas.

 Ruth é membro do Conselho da universidade, com mais de meio século de atuação em atividades pronunciadamente sociais. É doutora em Educação pela Universidade de Columbia. Era casada com um dos homens mais ricos do mundo, David “Sandy” Gottesman, recentemente falecido. Esta não foi sua primeira doação com fins filantrópicos. Em 2010, o casal destinou, para a mesma instituição agora contemplada, 25 milhões de dólares (125 milhões de reais). Os recursos foram aplicados na implantação de um instituto de Pesquisa com Células-Tronco e Medicina Regenerativa.

Essa magnífica história de solidariedade, projetando figura humana admirável, com percepção bastante nítida da função social da riqueza, remeteu este desajeitado escriba a um episódio guardado entre suas reminiscências mais ternas e sugestivas. Em meados dos anos 40, o grande educador Mário Palmério, que ainda não se tornara o romancista famoso que todos hoje aplaudimos, implantou em Uberaba, Minas Gerais, o Liceu do Triangulo Mineiro, pouco depois Colégio Triangulo Mineiro. O educandário foi a célula embrionária da conceituada Universidade de Uberaba.

Alunos do curso ginasial - um bom contingente deles -, pertencentes a famílias de condição financeira inferior, foram contempladas inesperadamente sem delongas burocráticas, com bolsas de estudo integrais. Os recursos carreados para essa nobre finalidade procederam de doação de um cidadão nascido em Uberaba e radicado em Uberlândia. Empresário dinâmico, que fez riqueza na atividade agropecuária e setor de serviços, Afrânio Azevedo firmou parceria com o nascente conglomerado educacional, beneficiando muita gente. Um registro que faço com emoção. Entre as centenas de estudantes favorecidos com a providencial ajuda figurávamos eu e Augusto Cesar, meu saudoso irmão, primeiro brasileiro a conquistar um Emmy e um Ondas, os mais importantes lauréis da televisão mundial.

Ao longo dos anos tomei conhecimento de outros gestos de solidariedade social praticados, sempre de forma silenciosa, por Afrânio Azevedo. Guardei dele sem ter podido desfrutar da honra de conhecê-lo pessoalmente, a lembrança de um cidadão dotado sensibilidade social, pertencente ao invejável mundo dos corações fervorosos, receptivos à ideia de que a riqueza possui indeclinável função social. Tal qual a generosa educadora estadunidense.

 

Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

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