quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

 

Se podes conservar a fé... 

Cesar Vanucci

 

Tu serás um homem, ó meu filho!”

(Fecho do poema “SE” de Rudyard Kipling)

 

O poema “SE” (IF) do indiano Rudyard Kipling, falecido aos 70 anos em 1936, ainda hoje o escritor mais jovem laureado com o Nobel de Literatura, é uma reflexão soberba e enlevante sobre a conduta humana, figurando na lista dos textos literários mais difundidos universalmente. Nos tempos, já distantes, da meninice e adolescência, fazia parte, obrigatoriamente, do repertório de todo declamador que prezasse seu ofício. 

Parece-me oportuno relembrar, a propósito, que nas escolas, em grêmios literários e outras instituições havia o costume de se promover sessões de recitativos, sempre concorridas. Não sei dizer porque cargas d’água esse tipo de promoção cultural bastante aplaudida, “caiu de moda”, por assim dizer... 

Estimulado pela minha querida e saudosa mãe, Tonica, decorei, conservando até estes dias outonais da existência bem vivos na memória velha de guerra, para apresentação no programa infantil na PRE-5, de Uberaba, os versos dessa bela peça literária, na versão assinada por Guilherme de Almeida. Descobri, mais tarde, que havia outras versões do “SE”. 

Reconhecendo o conteúdo precioso de cada uma delas, entendo que a versão gravada na infância traduz melhor a mensagem humanística de Kipling. Tomo aqui, por sinal, a liberdade de anotar as primeiras estrofes de uma dessas outras sugestivas versões. O leitor poderá compará-la, mais à frente, com a versão de Guilherme de Almeida, reproduzida na inteireza para, naturalmente, o deleite de meu reduzido, posto que assíduo leitorado. Estes os termos da tradução do poeta.   

Aqui vêm os versos do poeta Félix Bermudes.

“Se podes conservar o teu bom senso e a calma/Num mundo a delirar para quem o louco és tu.../Se podes crer em ti com toda a força de alma/Quando ninguém te crê...Se vais faminto e nu/Trilhando sem revolta um rumo solitário.../Se à torva intolerância, à negra incompreensão,/Tu podes responder subindo o teu calvário/Com lágrimas de amor e bênçãos de perdão.../Se podes dizer bem de quem te calunia.../Se dás ternura em troca aos que te dão rancor/Mas sem a afectação de um santo que oficia/Nem pretensões de sábio a dar lições de amor...(...)” 

Vem, agora, a versão de Guilherme de Almeida.

“Se és capaz de manter a tua calma quando/Todo o mundo ao teu redor já a perdeu e te culpa;/De crer em ti quando estão todos duvidando,/E para esses no entanto achar uma desculpa;/Se és capaz de esperar sem te desesperares,/Ou, enganado, não mentir ao mentiroso,/Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares,/E não parecer bom demais, nem pretensioso;/Se és capaz de pensar --sem que a isso só te atires,/De sonhar - sem fazer dos sonhos teus senhores./Se encontrando a desgraça e o triunfo conseguires/Tratar da mesma forma a esses dois impostores;/Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas/Em armadilhas as verdades que disseste,/E as coisas, por que deste a vida, estraçalhadas,/E refazê-las com o bem pouco que te reste;/Se és capaz de arriscar numa única parada/Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,/E perder e, ao perder, sem nunca dizer nada,/Resignado, tornar ao ponto de partida;/De forçar coração, nervos, músculos, tudo/A dar seja o que for que neles ainda existe,/E a persistir assim quando, exaustos, contudo/Resta a vontade em ti que ainda ordena: "Persiste!";/Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes/E, entre reis, não perder a naturalidade,/E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,/Se a todos podes ser de alguma utilidade,/E se és capaz de dar, segundo por segundo,/Ao minuto fatal todo o valor e brilho,/Tua é a terra com tudo o que existe no mundo/E o que mais - tu serás um homem, ó meu filho!”

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