sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Espantoso recado



Cesar Vanucci

“Há muito mais coisas entre o Céu e a Terra
 do que pode imaginar nossa vã filosofia.”
(Shakespeare)


As mensagens dos leitores são iguarias saboreadas com especial deleite pelos praticantes do oficio da escrita. Mesmo quando as observações registradas fiquem em desacordo com as ideias expostas. Se todos os que acompanham com habitualidade os textos dos articulistas se dessem conta do prazer proporcionado por esse gênero de manifestação é certo que um proveitoso diálogo, com valiosas sugestões, poderia ser estabelecido entre as partes.

Falo disso para anotar, com satisfação, mensagem encaminhada pelo leitor Clésio Lima, reportando-se a uma história por mim narrada há um bocado de tempo, por ele considerada “comprovação irretorquível da continuidade da vida após a morte”. Atendendo à sua solicitação, reproduzo-a linhas abaixo.

Em meados de 1965, vim de muda para Belo Horizonte. Advogado do SESI em Uberaba fui distinguido, pelo saudoso Fábio de Araújo Motta, com convite para assumir a Superintendência Geral da Federação das Indústrias. Dias antes da partida recebi carinhosa homenagem, organizada por instituições classistas e culturais, entre elas a ACIU - Associação Comercial e Industrial de Uberaba, à época presidida por amigo de infância, dinâmico empresário, homem de muita sensibilidade social, Aurélio Luiz da Costa.

Alguns meses transcorridos fui surpreendido com a infausta notícia da morte de Aurélio, por afogamento, num rio que banhava as terras de sua fazenda em Mato Grosso, trazida pelo amigo Joaquim Roberto Leão Borges, valoroso deputado estadual, de saudosa memória. A convite de Leão Borges, acompanhei-o a Uberaba, participando da cerimônia de despedida do dileto companheiro que havia “partido primeiro”. No avião, em tom confidencial, pedindo-me reserva, Joaquim expressou preocupação quanto a rumores circulantes em torno da hipótese de que Aurélio houvesse sido vítima de um atentado. Por força da imprecisão e inconsistência dos dados colhidos a respeito, estava havendo compreensível relutância dos parentes em pedir a abertura de um inquérito formal. Guardei a informação debaixo de reserva. Não abordei jamais o assunto com nenhuma outra pessoa, a não ser o próprio Joaquim Roberto e, ao que me lembre, em apenas uma outra oportunidade.

Vinte anos se passaram. Numa noite de sexta-feira, durante viagem que costumava fazer quase que mensalmente em visita a familiares radicados no Rio de Janeiro, acompanhei meu saudoso irmão, Augusto Cesar Vanucci, então diretor da linha de espetáculos musicais e programas de humor da Rede Globo, a um centro espírita de Caxias. Espiritista convicto, Augusto era recebido ali como uma espécie de patrono da instituição, coordenando também ações humanitárias promovidas em favor da inclusão social.

Nessas suas idas semanais ao Centro levava sempre conhecidos e colaboradores. Fazia parte do grupo de acompanhantes daquela noite uma cantora famosa, às voltas com problemas que acreditava pudessem ser solucionados com a orientação espiritual fornecida no local. Cerca de doze sensitivos movimentaram os chamados trabalhos de incorporação mediúnica. Faziam-se intérpretes de mensagens, em sua totalidade de tom edificante, em meio a citações de passagens evangélicas de inspirado conteúdo. Ao final de cada mensagem era declinado o nome do autor, figura conhecida no meio artístico, já desapartada de nosso convívio.

Na última manifestação ouvida declinou-se também, no final, um nome: Aurélio. Tendo em conta os antecedentes exclusivamente artísticos dos outros nomes mencionados, palpitei, de mim para comigo, que o tal Aurélio tivesse sido, talvez, violoncelista da Sinfônica Brasileira. Mais não avancei em especulações, ansioso que estava, com o almejado final da extensa reunião, em poder deixar o local, para colocar, com o mano, em lugar mais apropriado, a prosa familiar em dia.

No exato momento da saída, aproximou-se, semblante acolhedor, gestos profusos de simpatia, o último dos sensitivos a se pronunciar. Foi logo dizendo que o Aurélio da derradeira mensagem era alguém que, em vida, partilhou de minha convivência. A reação sincera que tive, de pronto, foi registrar que não me lembrava de ninguém, de minhas relações, com esse nome. Sem me dar tempo para reflexão, o médium retornou à carga, revelando, para meu completo aturdimento, nada mais nada menos do que isso: o nome todo do ser desencarnado responsável pela mensagem era Aurélio Luiz da Costa, falecido há 20 anos. Ele, Aurélio, pedia-me – asseverou meu interlocutor – passasse um recado ao seu também amigo, Joaquim Roberto Leão Borges, a fim de desfazer um tremendo equívoco. Sua morte, por afogamento, no rio, fora acidental, causada por uma convulsão, e não fruto de qualquer ação criminosa.

Foi exatamente desse jeito, sem tirar nem por, que se passou essa história incrível vinda a lume por meio de um processo desconcertante e misterioso de comunicação com o além. Um processo que, naturalmente, cria para muita gente dificuldades intransponíveis de entendimento e explicação.



Argutas ponderações

Cesar Vanucci

“Há décadas mantemos a maior taxa de juros real do universo.”
(Delfim Neto)


Delfim Neto continua proporcionando com análises objetivas, despojadas do passionalismo ideológico frequentemente empregado por outros comentaristas de presença destacada na praça, uma visão bastante lúcida da política econômica vigente. Vale a pena conhecer um pouco das avaliações por ele feitas nesta hora de tantas leituras equivocadas.

A revista “CartaCapital” estampa semanalmente seus comentários. Num deles, edição nº 874, de 4 de novembro passado, deparamo-nos com revelações sumamente relevantes que convidam à reflexão.

O respeitado economista assinala que defrontamo-nos na atualidade com “a destruição do equilíbrio estrutural numa velocidade assustadora”. Depois de registrar que o déficit fiscal médio no período de 2011 a 2013 foi bem comportado (2.6 por cento do PIB), lamenta que em 2014 os efeitos do que chama de “voluntarismo” sobre a evolução da economia emergiram em plenitude, disso resultando “inacreditável aumento de 16% na relação Dívida Bruta/PIB em apenas quatro anos!” Delfim não deixa por menos: compara nossa taxa de juros a um animal teratológico. Emite conceitos a respeito que lembra a pregação persistente, desassombrada, contra o juro alto, de um personagem ilustre da história política e empresarial brasileira, o saudoso vice José Alencar. Constata: há décadas cultivamos a maior taxa de juros real do universo. Faz um prognóstico desagradável: vamos continuar a tê-la, a não ser que nos mostremos dispostos a alterar os rumos das coisas. Aponta saídas: “a coordenação entre a política fiscal, a política monetária e a política de administração da dívida pública, tecnicamente muito boa, precisa de uma mudança radical para transformar a economia brasileira numa economia “normal”, com taxa de juro real “normal”, que reflita as condições e as expectativas de um país com sólidas instituições (as nossas estão cada vez mais fortes), com uma política econômica inteligente, adotada com cuidado e respeito às restrições físicas, históricas e geográficas.”

Delfim Neto lança uma pergunta no ar. Abre aspas: como um governo que começou tão virtuoso em 2011 perdeu-se num emaranhado de intervenções setoriais que conduziram à confusão que estamos vivendo em 2015? Fecha aspas. Na resposta à própria interrogação emite a hipótese de que o governo Dilma Rousseff não entendeu corretamente a sinalização dos acontecimentos à sua volta. “A virtude de 2011 elevou a aprovação do governo Dilma a 92 por cento no início de 2012 (65% de “ótimo-bom”, mais 27% de “regular”, segundo a “Data Folha”), mas ela a leu muito mal. Apoiada nesses números iniciou uma intervenção arbitrária na taxa de juros.” Deu no que deu. Os movimentos da taxa Selic influenciaram negativamente os negócios afetos às atividades produtivas. Conclui, então: “Com o juro arbitrariamente no nível mais baixo e sua aprovação no máximo, ela aprofundou o voluntarismo ativo: emitiu a Medida Provisória 579, em setembro de 2012, com o objetivo louvável de construir a “modicidade tarifaria” e tornar o setor produtivo mais competitivo, o que, infelizmente, terminou no desastre antecipadamente anunciado... Daí para a frente, as intervenções voluntaristas se sucederam nos portos, nas concessões etc. Nunca, na história deste país, tanta boa intenção, com tanto apoio na sociedade, terminou tão mal...”

Argutas ponderações!


A assustadora tragédia de Mariana


Cesar Vanucci

“Perdão foi feito pra gente pedir”.
(Verso do cancioneiro popular brasileiro)


Tenho também algo a dizer sobre a espantosa tragédia de Mariana.

A esperança é a última que morre, como consta da saborosa fala das ruas. Abranda as asperezas da caminhada. Esse impulso generoso da alma bebe inspiração nas fontes humanísticas. E o humanismo, no sábio modo de pensar de Oto Maria Carpeaux, representa para o ser humano a própria razão de viver.

Mas, “pera” lá! O que têm a ver os edificantes conceitos acima alinhados - interrogarão, por certo, os condescendentes leitores destas mal datilografadas – com o aterrorizante acidente de Mariana que este desajeitado escriba se propõe a comentar? Explico tudo, com detalhes, mais adiante.

O que toca reconhecer na história reportada, antes de mais nada, é que não há mesmo como desfazer o estado calamitoso de coisas gerado a partir do rompimento das barragens. A avalancha de rejeitos de mineração consumiu vidas preciosas. Varreu do mapa povoados inteiros. Destruiu plantações. Assoreou de forma irreparável rios e pequenos cursos d’água. Danificou seriamente o meio ambiente. Estilhaçou empreendimentos produtivos. Afetou o abastecimento de água em dezenas de localidades. Arrasou monumentos históricos, entre eles a Capela de Bento Rodrigues, erguida em 1718. Em suma, instalou o caos em vastíssima extensão geográfica, revolvendo dramaticamente o cotidiano de milhares de pessoas.

É de se presumir que, a esta altura, já tenham sido mapeados e avaliados os avassaladores efeitos do tsunami que desabou da montanha de minério. Enquanto se processam as investigações dos órgãos técnicos competentes, com vistas a precisar causas e a definir responsabilidades legais, acumulam-se no ar perguntas suscitadas pela indignação e sofrimento das vitimas e pela perplexidade e inconformismo da sociedade. Paralelamente a isso, como decorrência do clima de comoção existente, assiste-se também a mais uma exemplar demonstração coletiva de solidariedade, sob a forma de substanciosa ajuda popular aos desabrigados.

Até aqui, o que se tem, em termos formais de prestação de contas, por parte do poderoso complexo empresarial responsável pela atividade minerária na região e dos setores oficiais com explícito protagonismo no palco da dolorosa ocorrência, deixa muito a desejar. Nas fugidias manifestações trazidas a público pouca coisa foi feita ou dita que possa ser considerado, mesmo com boa vontade na apreciação, em condições de amortecer ligeiramente o desencanto, pra não dizer a revolta reinante no seio da opinião pública. As apurações apontam imperdoável displicência na forma de agir dos donos do negócio da exploração mineral de Mariana, no pertinente à prevenção de riscos. A constatação soa como crítica, igualmente, à atuação dos órgãos fiscalizatórios.

O que vem de ser exposto remete a irretorquível certeza. A comunidade alvejada pelo traumatizante episódio sente-se desamparada. Reclama esclarecimentos indispensáveis até aqui sonegados.

Aí, precisamente neste ponto, é que me permito encaixar os conceitos alinhados no preâmbulo do comentário. Ponho-me a imaginar, com a força de uma aspiração legítima, carregada de inquieta esperança – eco, como não? do sentimento popular – que a qualquer momento desses, com atraso que a indulgente opinião pública saberá relevar, os dirigentes das empresas e os representantes dos órgãos públicos envolvidos no desgastante processo convocarão rede de televisão e cadeia de jornais e rádios para um mea culpa histórico. Abandonando a postura arredia assumida, que enodoa a história pessoal de cada um, farão um anúncio solene, começando com pedido de desculpas à sociedade, das providências completas que, a curto, médio e longo prazos, pretendem colocar em execução no sentido da reconstrução, reparação e compensação exigidas por essa situação terrível que virou de cabeça pra baixo a vida de tanta gente.

Perdão, como se diz na canção famosa, foi feito pra gente pedir. Quanto à esperança, repita-se, ela é a última que morre. O tempo, no caso reportado, ainda não se esvaiu de todo. Isso alenta a expectativa de que, de súbito, um sopro de bom senso e lucidez possa brotar no coração dos personagens que detêm o poder das decisões nessa tormentosa história, animando-os a adotar a atitude correta aguardada. Mesmo que eles se vejam forçados, em seus efervescentes afazeres cotidianos, a lidar por vezes com interpretações equivocadas e utilitaristas da aventura da vida. Interpretações essas suscetíveis de desencorajar gestos de grandeza como o que acima se preconiza.




O AMARGO FIM DO RIO DOCE


O Engenheiro Agrônomo Augusto César Soares dos Santos, membro da Academia Mineira de Leonismo, é o autor deste elucidativo vídeo a respeito do tsunami de lama provocado com a ruptura das barragens em área de exploração minerária de Mariana, MG.
Para assisti-lo na integra é só clicar no link abaixo.

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