sexta-feira, 18 de setembro de 2015




Veredicto inconfiável

Cesar Vanucci

“Por qual razão as agências de risco esqueceram-se de dar
 notas aos responsáveis pelo tsunami financeiro de 2008?”
(Antônio Luiz da Costa, educador)

Esse rebaixamento da nota de crédito do Brasil, de vários Estados e de um punhado de importantes organizações empresariais dá o que pensar. Oferece esplêndida chance para elucidativos comentários a respeito de “meia dúzia de seis ou sete revelações relevantes”. Registros que costumam, teimosamente, ficar de fora do noticiário de cada dia.

A maioria dos viventes não dispõe, compreensivelmente, de informações suficientes sobre o que rola no pedaço. Mas, dos muitos cidadãos que têm amplo conhecimento das coisas, boa parte finge não saber, ou se esquiva, por motivos nem sempre aceitáveis eticamente, de mencioná-las quando a questão vem à balha.

A legitimidade das “agências de classificação de riscos” é universalmente questionada pelas lideranças mais lúcidas do pensamento humanístico. Seria instrutivo que a mídia procurasse se inteirar do que o Papa Francisco pensa a respeito. Uma interrogação perturbadora irrompe, impetuosamente, no espírito dos estudiosos das questões econômicas e sociais: que poder superior (divino ou super-humano) confere a tais agências as prerrogativas de saírem por aí ditando regras a respeito do comportamento de países inteiros, de complexos produtivos comprometidos com a construção humana, econômica e social?

Por que, para certos setores – como se insinua em suspeitosas manifestações midiáticas –, as pontuações desses órgãos soam como versões de éditos imperiais típicos dos tempos medievais?

Por que são propagadas como dogmas fundamentalistas de fé, a serem acatados por multidões resignadas, sem choro nem vela?  Por que são alardeadas como “verdades intocáveis”? “Verdades” das quais meros mortais não podem, terminantemente, discordar, sob pena de castigo vindo do alto, ou pelo temor de serem indigitados, em doutos círculos, como cidadãos de terceira classe intelectual?

A “infalibilidade” das pontuações não passa de mito, astuciosamente sustentado por facções neoliberalistas atendendo a conveniências da megaespeculação no mundo dos negócios. A inamissível supervalorização dos “ratings” parece perseguir o objetivo de criar em determinados momentos e áreas, clima de “Deus nos acuda” conflitante com os autênticos interesses das sociedades alvejadas.

A credibilidade da “pontuação” é colocada em xeque permanentemente. Muitas as situações comprobatórias de que as agências se deixam emaranhar em ataques especulativos de dramáticos efeitos. O exemplo mais loquaz é de setembro de 2008. Nenhuma delas antecipou, diagnosticou, emitiu tempestivo alerta sobre o tsunami à vista. O banco de investimento “Lehman Brothers”, junto com numerosos “parceiros”, recebeu grau máximo de investimento em avaliação da “Standard&Poor’s” (a mesma que acaba de rebaixar as notas brasileiras), pouquíssimos dias antes do formidando estrondo financeiro que sacudiu o mundo. Seja lembrado que esse banco desempenhou papel de realce no enredo da desestruturante crise.

Já agora mesmo, por razões que a razão desconhece, o manjado sistema de “classificação de riscos” mantém-se mudo e quedo que nem penedo em relação aos problemas seríssimos que afligem países da comunidade europeia. Nada de olvidar que vários deles se veem às voltas com endividamentos bem acima dos valores do PIB.

De outro lado, a alegação de que o “rebaixamento” concernente ao Brasil significou uma reação ao anúncio, realmente indesejável e criticável, do déficit orçamentário nas contas, torna oportuna a lembrança de episódio ocorrido em 2011 envolvendo a mesma “agência” e o Governo estadunidense. Reagindo, também, como dito na época, a um anúncio de déficit no orçamento, o órgão classificador reduziu a nota dos EUA. O governo Obama, a mídia, as lideranças do país não deram, como é lógico supor, atenção desmesurada e sensacionalista ao fato. O “rombo” nas finanças já era alto em 2009: 1.4 trilhão de dólares. Caiu um tanto em 2010: 1.3 trilhão de dólares. O valor manteve-se inalterado em 2011, quando do “rebaixamento da nota”. Caiu um pouco mais em 2012: 1.1 trilhão de dólares. Chegou em 2013 a 680 bilhões de dólares e, em 2014, a 492 bilhões de dólares, como fruto de bom trabalho de recuperação levado a cabo pelo governo.

A conclusão a extrair do que está dito é uma só: nota de “agência de risco” não passa mesmo de um simples registro de uma “agência de risco”. Nada além disso. Trata-se de um dado a mais no conjunto de elementos informativos enfeixados para formulação de uma política de diretrizes políticas, econômicas e sociais. Não merece ser enxergada com óculos do doutor Pangloss, como sentença fatal, inapelável, condenatória de uma Nação inteira. Sobretudo de uma Nação com a dimensão da nossa. O acatamento pleno do “veredicto” de que tudo está perdido só faria algum sentido se nos deixássemos contaminar, desavisada e inconscientemente, por um complexo de viralatice derrotista irremediável. O Brasil e suas sólidas instituições, conscientes dos graves desafios a confrontar na busca por um país melhor, pairam acima, muito acima, dessas reações de origens nada confiáveis.


Novas fontes de receita

Cesar Vanucci

“Quem pode mais está obrigado a contribuir mais para a
solução dos problemas coletivos. Esta a regra socialmente justa.”
(Antônio Luiz da Costa, educador)

Os altos escalões governamentais, espaventados com os rumos dramáticos dos negócios administrativos, para os quais muito tem concorrido a ineficiência gerencial evidenciada em não poucos momentos, vêm dando tratos à bola no sentido de lobrigar fontes de receita novas capazes de cobrir o déficit orçamentário. A reinclusão da CPMF na lista tributária chegou a ser recentemente considerada. Mas acabou descartada, segundo alguns, muito menos pelo efeito cascata provocado do que pela sua capacidade em rastrear sonegadores.

O Ministro da Fazenda aventa a possibilidade de um “imposto transitório”, sem especificar bem do que se trata. O déficit de mais de trinta bilhões de reais no orçamento para 2016 carece ser coberto e a sociedade não esconde temores de que o acerto de contas acabe recaindo exclusivamente sobre os ombros do pessoal do andar térreo.

Com coragem cívica, disposição para diálogo, audácia administrativa, sensibilidade social, articulação política, os responsáveis pelas diretivas econômicas bem que poderiam enveredar por caminhos mais criativos na busca das soluções. O sentimento das ruas sabe apontá-los. Senão vejamos.

A revista “Forbes” acaba de divulgar a lista anual dos miliardários. As grandes fortunas arroladas alcançam altitudes inimagináveis. Compõem a lista 160 ilustres brasileiros. O patrimônio acumulado dos abonados patrícios é estimado em 806,66 bilhões. Em valores de 2014 equivale praticamente a 15% do PIB nacional.

Pelos dados chega-se à conclusão de que, apesar da crise, a riqueza dos 160 compatriotas foi largamente incrementada no ano que passou. O brasileiro do topo da relação conseguiu, com dois de seus sócios, em decorrência naturalmente da competência como empreendedor, duplicar seu respeitável acervo financeiro. Cálculos aritméticos dão conta do seguinte: com 10% da riqueza mencionada, o Brasil ficaria em condições de superar “de montão” a crise. Bastaria converter o percentual mencionado em tributos incidentes sobre rendas e fortunas elevadas. Não haveria, nesse caso, necessidade alguma de se recorrer a remédios amargos. De impactar negativamente a economia popular. De despejar a conta nas costas de 200 milhões de cidadãos. Noutros lugares do mundo, em situação de dificuldades, tal hipótese seria fatalmente cogitada. Caso, puxando exemplo, dos países da Escandinávia, onde uma avançada política distributiva da riqueza coletiva estipula para quem pode mais a obrigação de pagar (bem) mais.

Vamos e venhamos. Oitenta bilhões em tributos para quem possua 870 bilhões em haveres, com potencial permanente de ampliação da fortuna, não farão, certeiramente, tão grande falta assim. Se a alíquota “caísse” de dez por cento para cinco por cento ainda assim seriam quarenta bilhões, soma suficiente para atender a emergência.

Seguindo a mesma linha de raciocínio pode-se conceber, também, a criação de tributo sobre os lucros everestianos do sistema bancário. Os resultados trimestrais dos negócios nesse importante segmento falam  de curvas ascensionais ininterruptas, faça chuva, faça sol. Dez por cento da colossal bufunfa, recolhidos à guisa de impostos, representariam  contribuição valiosa ao esforço nacional voltado para o equilíbrio das contas e a retomada do desenvolvimento.
               
O combate em termos mais eficazes à sonegação que campeia solta por aí, com a adoção de medidas que resguardem o interesse coletivo de investidas desonestas, como as que foram detectadas pela “Operação Zelotes”, configura outra fórmula positiva de se incrementar a arrecadação. Outro item, inserido  também no capítulo da sonegação, de que se poderia cogitar  é o repatriamento, mediante eventual “acordo de leniência” (já que esse tipo de arranjo está em moda), dos capitais desviados para os chamados “paraísos fiscais”. Já imaginaram só a nota encardida que viria a ser carreada para as burras do Tesouro? Hein?


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