sexta-feira, 20 de julho de 2012

II Encontro Cultural da AML





A descoberta do “bóson de Higgs”

Cesar Vanucci “

“Superamos uma etapa em nossa compreensão da Natureza.”
(Cientista Rolf Heur, diretor-geral do Centro Europeu de Pesquisas Nucleares)

Os intensos rumores dos últimos meses em torno de uma descoberta cientifica extraordinária no campo da física quântica parecem haver se confirmado. Cientistas vinculados aos programas do Centro Europeu de Pesquisas Nucleares admitiram a existência de uma nova partícula subatômica, descrita como sendo o chamado “bóson de Higgs”, também conhecido como a “Partícula de Deus”, elemento que ajudaria a explicar o que dá tamanho e forma a toda a matéria existente no Universo.

As imagens que percorreram o mundo, à hora da revelação em Genebra, para platéia constituída dos mais renomados cientistas do mundo, acerca do “bóson de Higgs”, deram a medida exata da magnitude da descoberta. Pelos aplausos entusiásticos e semblantes emocionados dos físicos ficou muito bem evidenciado que uma barreira transcendente no campo das pesquisas acabara de ser magistralmente transposta. O clima de exultação à volta do britânico Peter Higgs, cientista de 83 anos que, desde 1964, postula por dedução a existência da célebre partícula que leva seu nome, dimensionou também o significado histórico da divulgação feita. “Superamos uma nova etapa em nossa compreensão da Natureza. Esta partícula permitirá descobrir outros mistérios de nosso universo”, asseverou, eufórico, o cientista Rolf Heuer, diretor-geral da instituição (CEPN) em que se acha instalado o “grande colisor de hádrons” (LHC), o maior acelerador de partículas do mundo, onde foram desenvolvidas as pesquisas.

Arrisco, ancorado apenasmente na intuição, bastante consciente do elevado grau de meu analfabetismo cientifico, um singelo palpite: a descoberta, por mais avançada que tenha sido, não deverá representar, ao contrário do que muita gente tem sustentado, resposta definitiva para questões verdadeiramente essenciais da aventura humana. Em meu modesto entendimento das coisas, o atual estágio espiritual da humanidade não oferece condições para que a ciência, ou qualquer outro valioso instrumento nascido da inteligência humana, consiga decifrar por completo, de forma convincente, a charada da existência. Isso vai ter que ficar pra mais adiante.  Bem mais adiante nessa extensa caminhada humana, tão pontilhada de situações inexplicáveis. O “bóson de Higgs”, independentemente das extraordinárias faculdades que lhe sejam atribuídas, mesmo que os sábios o apontem como elemento-chave da estrutura fundamental da matéria, passará a ser enxergado, dentro em breve, em sua real proporção. Noutras palavras, como uma nova, importantíssima e promissora vereda no complexo esquema de identificação dos elementos componentes das chamadas partículas elementais. Assim como já aconteceu no passado com o átomo. A expressão “Partícula de Deus”, com que resolveram açodadamente batizá-lo, acabará sendo vista como um exagero colossal na descrição de suas singulares propriedades.



Tonico porteiro

“Como se arranjaria o Tonico, porteiro do prédio,
em circunstâncias parecidas?”
(Pergunta da filha mais nova do personagem da historinha)


A crise de tosse convulsiva, produzindo desconforto no corpo todo e acúleos fortes na musculatura abdominal, acordou de madrugada a casa inteira. Como não fosse possível debelá-la na base do xarope caseiro, ele tomou a decisão, com a mulher e os filhos, de deslocar-se até uma clínica de emergência. Pediu pelo telefone um carro de praça, juntou às pressas, por precaução, algumas peças de vestuário e utensílios de higiene pessoal e partiu rumo ao posto de atendimento contatado pelo telefone, em busca do médico indicado no guia do plano de saúde. Tossindo, espirrando, assoando o nariz e escarrando sem parar, apresentou-se no plantão da clínica. Forneceu as informações cadastrais solicitadas pelo sonolento plantonista, preencheu ficha, assinou autorização de consulta e ficou a aguardar, na sala de estar, ao lado de outros pacientes, o momento da chamada de seu nome. Já no consultório, depois de uns bons minutos de espera, descreveu para o médico seus incômodos presentes e passados para as anotações de praxe, no prontuário.

Foi submetido, na sequência, a exames introdutórios, envolvendo tomada de pressão, auscultação do peito, avaliação das condições da respiração, introdução de instrumentos no nariz, ouvido, garganta, por aí. Em outra sala, tirou chapas radiográficas em diversas posições. No desfecho dos procedimentos clínicos, o médico desfez, para seu alívio, a hipótese de uma enfermidade carecedora de atenções mais severas. Diagnosticou o incômodo como uma sinusite rebelde, mas passageira, prescrevendo uma pá de medicamentos.

Nosso paciente, voltando a enfrentar a noite fria e garoenta, tornou de novo um carro de praça, rodou alguns quarteirões até localizar uma drogaria de plantão. Deparou-se, na aquisição dos remédios, com situação extremamente desconfortável, pra lá de surpreendente. O atendimento no plantão de emergência noturna da drogaria, pertencente a uma rede poderosa, é feito na calçada fronteiriça à porta de entrada do estabelecimento. O farmacêutico, ou o vendedor, do lado de dentro, ouve, anota, cobra e entrega a mercadoria. O freguês permanece do lado de fora, ao relento. No caso em foco, nosso personagem permaneceu exposto ao vento gélido de uma das madrugadas em que os termômetros acusaram os índices mais baixos dos últimos tempos.

Mas eis que, concluída a operação da compra dos remédios, o paciente retornou ao aconchego do lar dando andamento às medidas terapêuticas recomendadas. Fez direitinho as contas, na ponta do lápis, constatando haver desembolsado, entre corridas de carro e remédios, o equivalente ao valor de um salário mínimo. Isso sem levar em conta o dispêndio mensal com a manutenção do plano de saúde. Por mera curiosidade, ligou noutra farmácia e constatou, tomado de santa ira, que os medicamentos poderiam ter sido adquiridos a valores menores, caso houvesse feito antes uma tomada de preços.

Todas essas indesejáveis circunstâncias à volta da crise de tosse, em plena madrugada de um domingo friorento, levaram a filha mais nova, estudante de Sociologia na PUC, a fazer uma observação que adicionou às vicissitudes do momento outra dilacerante preocupação :

-   Paiê, escuta aqui. O senhor gastou, relativamente, os tubos pra comprar um tiquinho de tranquilidade. Dispõe de seguro saúde e de dinheiro para transporte e para aviar receita de custos abusivos. Eu fico aqui matutando como é que o Tonico se arranjaria no seu lugar”.
-  “Mas de que Tonico você tá falando, minha filha?”
-  “Uai! Do Tonico porteiro, aqui do prédio. Como é que ele, trabalhador de salário mínimo, se arranjaria, repito, ganhando a mixaria que ganha, não contando com plano saúde, nem dinheiro para transporte e remédio, não sabendo a quem se dirigir, caso, de repente, se visse acometido do mesmo incômodo que tirou o senhor e nós todos da cama, nesta madrugada de domingo?”

Menos por causa da tosse, da extorsão na compra de remédios, dos incômodos todos, mas mais, muito mais, por culpa da indagação da filha, o personagem da historinha aqui narrada não teve como, jeito maneira, o resto da noite, retomar o sono.

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

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