sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Celebração refulgente

Cesar Vanucci *

"Despertar nos corações o desejo de servir é missão de todo
 Leão e conduz a uma sociedade participativa responsavel... "
(Rosane T. Jahnke Vailatti)


Todos os anos, no mês de outubro, sempre circundada de refulgente brilho, acontece a celebração da “Semana Mundial do Serviço Leonistico”. Trata-se da promoção de maior relevo no calendário de comemorações do Movimento dos Lions Clubes em Minas Gerais. Patrocinada pela Governadoria do Distrito LC-4 de Lions, por clubes da circunscrição, e pela Academia Mineira de Leonismo, contando com o apoio da Assembléia Legislativa de Minas e Sistema Fiemg, a “Semana” de 2011, consagrada a uma reflexão sobre o papel da Mulher na sociedade contemporânea, abrangeu extensa programação. Os atos cívicos e culturais realizados foram acompanhados com vibração por públicos numerosos.

Reportando-nos aos principais eventos, merece destaque, primeiramente, a sessão festiva do dia 1º de outubro, no auditório da Federação das Indústrias. A Academia Mineira de Leonismo empossou, na ocasião, quatro novas Acadêmicas: Carmen Lúcia Camargos Redoan, Maria Celeste Martins, Sonia Maria Queiroga Ferreira e Vilma Raid Fernandes

A presidente da Junta Comercial de Minas, ex-Secretária de Estado Ângela Maria Pace Silva de Assis, proferiu aplaudida palestra sobre as lutas e conquistas da Mulher. A parte artística esteve a cargo da Professora de canto e cantora Renata Vanucci, que interpretou canções da MPB com nomes de mulheres nos títulos. Os trabalhos foram dirigidos por Sóter do Espírito Santo Baracho, presidente da Academia.

No dia 8 de outubro, pela manhã, outra assembléia festiva foi realizada, tendo por palco o majestoso Auditório JK, na Cidade Administrativa, que ficou com as dependências inteiramente tomadas. Autoridades, dirigentes de núcleos do leonismo em Minas e no Brasil, representantes de diversificados setores da comunidade, participaram de belo encontro de confraternização, que serviu para homenagear, de acordo com a temática da “Semana”, Mulheres de singular projeção nas atividades culturais, jurídicas, políticas e sociais.

Rosane T. Jahnke Vailatti, brasileira de Santa Catarina, ex-Diretora Internacional e primeira Mulher a se candidatar à Presidência Internacional do Lions, veio especialmente de Nova Iorque para receber a comenda “JK – Cultura, Desenvolvimento e Civismo”, conferida pela Academia Mineira de Leonismo. Discursou em nome de todas as personagens femininas agraciadas na cerimônia com o troféu “Lions – Solidariedade Social”. As homenageadas com o referido troféu foram Andréia Aparecida Silva Donadon leal, escritora; Ângela Maria Pace Silva de Assis, empresária e ex-Secretária de Estado; Ângela Togeiro Ferreira, escritora; Cely Maria Vilhena Falabella, escritora; Cláudia Brenke Diniz Vieira, dirigente de organizações sociais; Cleube de Freitas Pereira, desembargadora, vice-presidente do TRT; Consuelo Oliveira Schettini, coordenadora de ações sociais; Deli Maria Bianchetti dos Santos, dirigente de trabalhos sociais; Deoclécia Amorelli Dias, primeira mulher a ocupar o cargo de Presidente num Tribunal em Minas; Emília Facchini, desembargadora, Vice-Presidente do TRT de Minas; Geny Gomes de Abreu Labanca, líder comunitária de Aglomerado; Helena Jobim, escritora; Hérica Soraya Albano Teixeira, médica, com trabalhos sociais;  Íris de Avelar Paiva, mentora de ações assistenciais; Ivana Eva Novais de Souza, dirigente de creche; Luzia Maria Ferreira, deputada estadual, primeira mulher a presidir a Câmara Municipal de Belo Horizonte; Macaé Evaristo, Secretária Municipal de Educação de Belo Horizonte; Maria Aparecida Neves Thibau (Cecy Thibau), militante de instituições culturais e humanitárias; Maria Conceição A. Parreiras Abritta, presidente da Academia Feminina Mineira de Letras; Maria de Fátima da Silva Sanson, militante de organizações humanitárias; Maria de Nazareth G.Teixeira da Costa, dirigente de organizações sociais; Maria Edite Pereira Lopes (Didi), Secretária de Assistência Social em Pompeu; Maria José Lage Ottoni, dirigente de ongs voltadas para atividades sociais; Marisa Nogueira Souto Camargos, coordenadora de ações sociais; Maria Norma Moraes Silva, médica, com atuação em obras humanitárias; Rita Jardim Carnevalli, coordenadora da Pastoral da Criança na Arquidiocese de Belo Horizonte; Rosa do Menino de Jesus, dirigente comunitária; e Vera Lúcia Bernardo Teixeira, coordenadora de grupos sociais.

A governadora do Lions, Vilma Raid Fernandes, primeira mulher a exercer o cargo em Minas, explicou o sentido da celebração no discurso de abertura da festividade. Quem também discursou, enaltecendo a promoção, foi o presidente do Conselho de Governadores do Lions, Fábio de Oliveira. Coube a este escriba, como presidente da Comissão Organizadora, também discursar. O pronunciamento será publicado neste espaço na edição vindoura do jornal.

A parte artística da cerimônia, que contou como Mestres de Cerimônia com o jornalista Neymar Fernandes e a presidente do Sindicato dos Artistas de Minas, Magdalena Rodrigues, ficou entregue à magnífica Companhia de Danças do Sesiminas, dirigida pela consagrada coreógrafa Cristina Helena, e do excelente Coral da Assembléia Legislativa , regido pelo maestro Rodrigo Garcia.

Em tudo por tudo, a celebração encaixou-se nos anais do Lions como um momento de esplendor cívico e cultural, com realce para a expressiva homenagem, circundada de afeto, reconhecimento e gratidão, prestada pela instituição a conjunto valoroso de figuras femininas engajadas na construção de um mundo melhor.




Eco e Voz


“Deixei de ser eco. Passei a ser voz!”
(Elza Tamesi)

Este o pronunciamento que fiz, após as saudações protocolares, na celebração do “Dia Mundial do Serviço Leonistico” (8 de outubro), promovida pelo Distrito LC-4 e Academia Mineira de Leonismo, com o apoio da Assembléia Legislativa de Minas e do Sistema Fiemg.

“Saudamos Rosane Terezinha Jahnke Vailatti, tocados pela expectativa e esperança de vê-la galgar, em breve, na condição de primeira mulher a fazê-lo, o topo diretivo da maior organização de serviços do mundo. Recebemo-la aqui, caríssima Rosane, neste amorável encontro de confraternização, juntamente com as outras valorosas homenageadas e com nossa primeira governadora, Vilma, como um símbolo da Mulher deste século 21. Um ser humano na plenitude de suas prerrogativas, que soube sobrepujar penosos obstáculos em sua trajetória emancipacionista, erguidos por milenares despropósitos masculinizantes, nascidos de processos culturais despojados de humanismo e espiritualidade. Valho-me também da ocasião para registrar, com o mais intenso regozijo, o anúncio ontem feito da concessão do Premio Nobel da Paz deste ano, que contemplou três Mulheres valorosas. Da Libéria e do Iêmen, países um tanto quanto esquecidos do resto do mundo.


Minhas Senhoras e meus Senhores,
“Tirante a mulher, o resto é paisagem”. (Dante Milano, poeta)

A dolorida história da emancipação e promoção da mulher simboliza, melhor do que qualquer outro esforço humano de ascensão política, cultural, social, econômica, a história por inteiro das lutas pela conquista dos direitos da cidadania.
Nos óbices defrontados nessas lutas heróicas estão contundentemente inseridos abjetos preconceitos, aviltantes discriminações, asfixiantes camisas-de-força, dogmas esclerosados, presentes, a todo momento, na convivência humana. Frutos malsãos do obscurantismo, do machismo castrador, da insensibilidade para se compreender o sentimento do mundo, o sentido cósmico da vida.

Não é difícil detectar, em instantes de trevas, decretadas pelo preconceito e pela discriminação, que a mulher é invariavelmente penalizada em dobro, em relação ao homem. O racismo a alveja por ser negra, por ser cigana, por ser índia, por ser judia, ou por não ser negra, nem cigana, nem índia, nem judia, e por ser mulher. Ela paga o pato, por assim dizer, por pertencer à etnia errada, em lugares ou momentos errados, na concepção do radicalismo dominante em determinado cenário, e por ser mulher. Por pertencer à religião enjeitada, nas mesmas circunstâncias de ambiente e época, e por ser mulher. Assim por diante.

Comecinho da década de 50, uma cidade do Interior de Minas

Cena da infância, recolhida nas ladeiras da memória. Vejo desenhado ali o perfil da primeira líder feminista que provavelmente conheci. Uma moça de seus trinta anos, dona de semblante extremamente simpático e de corpo bem proporcionado. Trescalava obstinação pelos poros. Revejo-a descendo a ladeira que dava num campo de futebol improvisado, onde a molecada tocava suas peladas movidas a bola de pano, brigas inofensivas e um que outro palavrão ingênuo, às vezes punido com chinelada. A sensação passada era de que Verlaine teria descoberto naquele gracioso desfile vespertino - um gingado coreograficamente impecável - inspiração para seus versos: “Quando ela anda, eu diria que ela dança” (“Quand’elle marche, on dirait qu’elle dance”). Pontualidade, um atributo todinho seu. Podia-se acertar relógio à sua passagem. Naquele justo momento as janelas se fechavam estrepitosamente, em sinal de zanga malcontida. Olhares e murmurações recriminatórios acompanhavam-lhe a trajetória graciosa por detrás das venezianas, até que escapulisse por completo no raio de visão do falso puritanismo entocaiado. Tudo compunha clima de excitante e novelesco mistério. Mistério que aguçava demais da conta a cabeça da gente. Por que as coisas corriam daquela maneira? O que a nossa heroína andava aprontando?

Prepare-se a benevolente platéia para um baita impacto. A nossa personagem, apenas e simplesmente, foi a Mulher que primeiro ousou, naquela aprazível cidade do interior, a desfazer os laços indissolúveis e sagrados do casamento, por meio de proposta de ação de desquite, com um cidadão considerado de reputação ilibada no meio comunitário, ao se ver alvejada constantemente por atos de violência doméstica e pelo comportamento adúltero do parceiro. Ousou mais – “imaginem só o descaramento!” – foi a primeira mulher a desafiar a moral e os bons costumes da sociedade, ao sair vestida de calça comprida nas ruas. E o que é “pior”: às vezes, Santo Deus, fumava em público! Tais lembranças, até certo ponto hilárias, de simbólico surrealismo, chegam a propósito da temática que nos reúne neste amorável encontro de reflexão e confraternização.

Setembro de 2011, sede da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque

Pela primeira vez na historia da ONU, a Assembléia Geral das Nações Unidas é solenemente aberta com a fala de uma Mulher. Uma brasileira, a Presidenta Dilma Rousseff, Mulher torturada no cárcere, pelo terrorismo de Estado num instante trevoso da história, reconhece, sensatamente, que o Brasil, como os demais paises, ainda precisa fazer muito mais pela valorização e afirmação da mulher, confessando-se orgulhosa de representar, naquele instante, todas as mulheres do mundo. As anônimas que passam fome, as que padecem de doenças, as que sofrem violência e são discriminadas, por exploração econômica, pelo farisaísmo encapuzado, por fanatismo religioso, em diferentes latitudes geográficas e culturais do planeta.

São significativos, é bem verdade, em nosso País sobretudo depois da Constituição Cidadã de 88, os avanços conquistas constatados no desenvolvimento pessoal da Mulher. A trajetória de vida de nossas homenageadas oferece, aliás, relato auspicioso dessas conquistas. Mas existe, ainda, forçoso reconhecer, um oceano inteiro de problemas a ser navegado na busca das soluções mais compatíveis, neste capitulo da aventura humana, com a dignidade das criaturas. De qualquer forma há que se celebrar a utilização, cada dia mais acentuada, do real potencial humano criador do antigamente e impropriamente chamado sexo frágil. Considerada por Heidegger, autêntica “clareira do ser”, a Mulher vem assumindo gloriosamente a palavra, como propõe Elza Tamesi ao apontar o rumo a ser seguido: “Fiz um salto na vida. Deixei de ser eco e passei a ser voz!”

E, por derradeiro, como fruto de inquietação do espírito – consciente de que o espírito humano é que nem o páraquedas: só funciona aberto, como lembra Louis Pauwells  -; e, por derradeiro, repito, trago aqui à reflexão, por parte dos que trabalham incansavelmente em favor da construção de um mundo melhor, mas também dos que, por ignorância ou  miopia social, perseveram na pratica de atos que empobrecem e aviltam a dignidade feminina, uma singela interrogação.

Interrogação que pode parecer um tanto quanto  instigante. E se, de repente, no dia do Juízo final, na hora crucial e decisiva da prestação de contas dos atos praticados em nossa peregrinação pela pátria dos homens, cara a cara com a Suprema Divindade, carregando bem nítida a imagem que do Criador de todas as coisas conservamos em razão de amadurecidas convicções religiosas pessoais, e se nessa hora precisa, a gente descobrir, embargados pela emoção, muitos até tomados de santa estupefação, que Deus é mulher?
E negra?
“Negra – evocando belíssimo poema de Langston Hughes, decorado na adolescência distante -, negra  como a noite é negra.
Negra como as profundezas d’África.”     Palavra de Leão!”

* Jornalista (cantonius1@yahoo.com.br)

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