sexta-feira, 28 de junho de 2013

O que se espera dos governantes

Cesar Vanucci *

“Feliz do povo que pode vaiar seus governantes.”
(Frase atribuída ao inolvidável Presidente JK)

Botar tento nos recados copiosos passados pelas ruas. Manter permanentemente ligados os aparelhos pessoais de percepção social. Separar o joio do trigo. Noutras palavras, distinguir com clareza e exatidão as manifestações populares genuínas, brotadas de justo inconformismo, das ações provocadas por um insignificante (numericamente falando) bando de vândalos sem causa, adeptos da anárquica tese do “quanto pior, melhor”. Mostrar-se compreensivo com relação às forças sociais que acionam pacificamente os protestos, convocando-as a participação ativa, por meio de diálogo e exposição transparente de fatos, na busca das soluções almejadas.

Agir com severidade, inteligência e bom senso, na contenção dos abusos praticados pelos baderneiros, enquadrando-os exemplarmente nos devidos conformes legais. Passar por peneiragem as imagens das câmeras que andaram captando as malfeitorias perpetradas contra o patrimônio público e privado por esses bandidos infiltrados nas passeatas, chamando-os às falas na Justiça por formação de quadrilha e outros delitos graves capitulados no Código Penal. Fazer também a polícia entender que a repressão na base do gás lacrimogêneo, pata de cavalo e ponta de baioneta não passa de resquício indesejável de tempos sombrios que a consciência cívica da Nação rechaça com veemência. Nunca, jamais, reação legítima de uma ordem constitucional democrática empenhada em garantir a ordem, a paz e a tranquilidade públicas sem concessões a abusos e violações a direitos de qualquer gênero.

Manter acesa a fé nas potencialidades do país e nas virtualidades da gente do povo, mesmo que, eventualmente, à sua volta colaboradores, assessores e conselheiros despreparados hajam perdido essa fé. Não ceder jeito maneira, no exercício das funções de gerenciamento superior, à tentação que, às vezes, acomete dirigentes desprevenidos, embriagados pelo ópio da autossuficiência, em classificar as coisas sumariamente, rotulando-as impropriamente, antes de entendê-las suficientemente. Procurar interpretar com argúcia social e serenidade, o “porquê” dessa vibração contaminatória que tomou conta, de uma hora para outra, das praças, aparentemente contra tudo e contra todos.

Arrolar, de modo a que sejam objeto de apreciação por parte dos grupos de trabalho encarregados de aprimorar as políticas públicas em execução, de forma a atender aos clamores trazidos a lume, itens já enunciados como prioritários nas manifestações. Oportuno relembrar alguns deles: melhoria na assistência à saúde, no ensino, na segurança pública, no transporte coletivo dos grandes centros; combate cada vez mais intensivo à corrupção; fixação de critérios mais rígidos na aplicação dos recursos públicos, enfatizando-se prioridades e evitando-se desperdícios. No tocante ao transporte urbano, cogitar-se de sua imprescindível melhoria e, até mesmo, da possibilidade – por que não? – de subsidio total ou algo que chegue próximo disso de modo a facilitar as coisas para o povão, que ele merece. Abra-se parênteses para esclarecer que a fórmula extrema do subsidio total, ou do chamado “passe livre”, nada tem de mirabolante ou utópica. Tem sido adotada com êxito em vários lugares do mundo, inclusive em cidades estadunidenses, ancorando-se em alterações na forma de aplicação dos recursos do Erário. Estimulou contingentes apreciáveis de pessoas a utilizarem nos deslocamentos ônibus no lugar de veículos particulares.

Propagar, por todos os meios, sensatamente, que a democracia pujante dos sonhos gerais é um processo contínuo de paciente construção. Implica em transformações graduais, em rotas alternativas de mudanças, com o uso constante da inteligência e criatividade na superação dos obstáculos.

Entender que as sinalizações de agora podem levar a alvissareiras descobertas. Quanto mais cedo se consegue interpretar os sinais emitidos pela vida, mais cedo pode se chegar às soluções dos problemas. O poeta Robert Frost, dos Estados Unidos menciona o fato de que Newton intuiu a “lei da gravidade” depois de entender os sinais reveladores dos frutos pendurados que despencavam das macieiras sobre a cabeça das pessoas; que Franklin concebeu o para-raio depois de compreender a sinalização dos trovões.

Em suma, absorver bem a idéia de que uma mensagem propondo avanços sociais paira, neste momento, no ar. E, também, a idéia de que as ruas, conforme anda dizendo interessante jingle muito badalado nos intervalos comerciais destes dias de Copa, são as arquibancadas do país. Arquibancadas com voz, que vaiam e aplaudem. Isso é democracia pura.


Acelerar os avanços sociais

“Eu quero dizer a vocês que foram pacificamente às ruas: eu estou ouvindo vocês!”
(Compromisso da Presidenta Dilma em discurso à Nação)

Não desperdice, Presidenta Dilma, por favor, a chance histórica que a pujante democracia brasileira depositou em suas mãos de modo a que se sinta à vontade para imprimir maior celeridade ao processo dos avanços sociais das esperanças gerais da Nação. Faça-se voz do clamor das ruas. Intérprete dos sentimentos populares. Utilize com propriedade os créditos de sua inconteste popularidade no esforço de queimar novas e decisivas etapas, no resgate da colossal dívida contraída com as camadas mais humildes, ao longo de decênios de nossa vida republicana.

Ponha pressa, muita, na anunciada convocação das forças vivas da Nação, representativas de todas as correntes de idéias, para o debate amplo, geral e irrestrito acerca dos novos rumos que carecem ser trilhados nas conquistas do amanhã, vislumbrados na predestinação de grandeza do País. Não deixe os temas consistentes das agendas pontuadas nas reivindicações esfriarem. Cair no fosso da indiferença e frieza burocráticas.

Dialogue com firmeza, sem vacilações, com a sociedade, começando com representantes dos ativistas de cara pintada. Estique nos justos limites ditados pelo bom senso as negociações, as consultas, os estudos. Mas não permita que o papo espiche indefinidamente, ao gosto dos radicais interessados em bagunçar o coreto. Empenhados, alguns, em exigências descabidas, outros em garantir incólumes iníquos privilégios nascidos do imobilismo social abominado pela Nação. Uns e outros supostamente desejosos em promover alguma reforma com o fito de não fazer reforma alguma.

Defina com os demais Poderes, com os dirigentes maiores da vida política, sem se esquecer de pedir o apoio da própria oposição, planos de emergência que possam trazer respostas ágeis aos anseios populares em questões primordiais. Questões como a melhoria das condições de transporte público. Não perca de vista algo primordial: a concessão de subsídios maiores para o setor da mobilidade urbana não é nenhum bicho de sete cabeças. Contam-se numerosas as cidades do mundo, até mesmo no Brasil, ao que já se sabe, que optaram por modelos mais concessivos de subsídios com sucesso. Expeça convites aos grandes conglomerados financeiros, grandes corporações, parceiros do governo em grandes empreitadas do PAC e concessões de serviços, como os dos diversificados ramos do transporte, exploração de jazidas petrolíferas e outros mais para que, conscientes de suas responsabilidades no contexto, se disponham a uma participação mais ativa, com aportes de recursos, nos projetos de inclusão social. Exija das estruturas governamentais, em todos os níveis, ações eficazes de combate a desperdícios. Transparência solar nos procedimentos cotidianos.

Faça ver a todos, sobretudo aos dirigentes políticos, que o povão em suas postulações não pode ser subestimado. Exemplos de procedimentos desastrados, como os do despreparado governador de São Paulo e do deslumbrado prefeito da Capital bandeirante no iniciozinho da onda de protestos, precisam ser evitados a todo custo. Autossuficiência embriagante, arrogância, intransigência enfraquecem a autoridade.

Assuma, Presidenta Dilma, a condução do processo de construção de um novo pacto federativo, que preveja a implantação em prazos razoáveis das reformas básicas. A política, a tributária, a agrária, assim por diante. Chame a si a coordenação da renegociação das dívidas públicas dos demais entes federados com o poder central. Essas dívidas, todos sabemos, foram feitas em outros momentos da vida administrativa brasileira, nem sempre atendendo estritamente aos postulados corretos do interesse público, como não será difícil demonstrar por meio de auditagens. Mas, seja como for, a “batata quente” caiu em suas mãos para ser descascada. A alteração nos cálculos exorbitantes vigentes é de molde a liberar recursos significativos a serem direcionados aos serviços públicos essenciais, melhorando as condições de vida da população.

Estabeleça, Dilma, canal regular de comunicação para prestação de contas das iniciativas levadas avante e decisões tomadas dentro desse propósito, consoante com as legítimas aspirações populares, de acelerar as soluções dos problemas candentes deste momento.

Utilize, com sabedoria, seus dons de liderança neste instante preciso em que a democracia brasileira projeta de maneira tão nítida sua invejável vitalidade.

Brasil brasileiro

 “A juventude brasileira quer discutir as
causas polêmicas. A sociedade tem de debatê-las.”
(Virginia Barros, presidente da União Nacional dos Estudantes)

A perplexidade é a tônica dos comentários, das conversas. Projeta-se nos semblantes e nas interrogações que todos se fazem. Dirigentes políticos, lideres comunitários, antropólogos, sociólogos, jornalistas, estudiosos da realidade brasileira dedicados à instigante tarefa de interpretá-la não conseguem explicar adequadamente, até aqui, o que andou acontecendo. Alguns animam-se a fazer exercícios especulativos na busca do modelo padrão que teria servido de inspiração para essa pororoca de manifestações que sacode ruas e praças.

A chamada “primavera árabe”, sob tantos aspectos frustrante por conta de resultados no geral pífios, é apontada, aqui e acolá, como referencia para o que rolou. Comparação destituída de qualquer sentido. Em comum, as duas modalidades de protestos só conservam um liame: o emprego massivo no esforço de arregimentação popular dos formidáveis recursos das redes sociais. Quanto ao resto, tudo difere. As motivações são outras. O foco do movimento árabe concentrou-se na tentativa de uma ruptura definitiva com as estruturas de poderes despóticos. Já aqui, por estas bandas, foi a pujança invejável do regime democrático que assegurou o suporte valioso que os manifestantes dispuseram para propagar suas postulações.

O que se tem, de conseguinte, pra dizer, sem medo de errar na avaliação, a respeito dos acontecimentos vividos, que viraram de cabeça pra baixo tanta coisa, é que este brado retumbante das ruas brasileiras teve o toque único e irrepetivel do jeitinho brasileiro de fazer as coisas. Algo que foge por inteiro a estereótipos e paradigmas absorvidos noutras culturas e que é apontado, não poucas vezes equivocadamente, como traço pejorativo do comportamento humano.

As manifestações que levaram tanta gente boa a proclamar não estar entendendo bulhufas do que vem sucedendo é decorrência natural desse jeitinho especial que os brasileiros temos de vivenciar contradições e mesmo harmonizá-las.

Digam aí: em que outro canto deste planeta entregue à peregrinação do ser humano conseguirá alguém, algum dia, captar, simultaneamente, separadas umas das outras por curta distância, cenas como as que foram vistas recentemente neste nosso fascinante e desconcertante Brasil? Em estádios regurgitantes, cheios de colorido e calor humano, multidões a vibrarem com os jogos eletrizantes de uma competição sob o foco das atenções gerais. Em milhões de lares, bares, restaurantes, diante das telas de televisão, o mesmo contagiante clima e incomum entusiasmo. Em locais reservados a concentrações festivas, montadas pelo Poder Público em diferentes pontos das cidades, contingentes expressivos de apreciadores do esporte paixão nacional a exprimirem emoções com características de apelo à confraternidade. E, juntamente com tudo isso, precisamente no mesmo momento em que tudo isso ocorre, as passeatas reivindicatórias, envolvendo jovens, adultos, famílias inteiras, pondo a circular nas ruas das capitais e outras importantes cidade clamores por mudanças indispensáveis no trato das coisas públicas, compreensível inconformismo diante das perturbadoras desigualdades de vida do cenário brasileiro, desejos ardentes de que as conquistas sociais que tantos já estão a desfrutar possam se processar em ritmo mais veloz. Repito: em que outro lugar isso tudo pode ocorrer, ao mesmo tempo, com toda essa exuberância criativa popular?

Resta dizer alguma coisa sobre os distúrbios. Os atos de vandalismo. Os atentados cometidos contra bens públicos e privados. Ficou bem documentado que a Nação inteira repele essas demonstrações de selvageria. O apoio unânime conferido às causas agitadas nas passeatas ordeiras e pacíficas, processadas em termos rigorosamente democráticos, tem sido acompanhado de total indignação com relação ao comportamento bestial de uma minoria de malfeitores, composta, em parte menor de radicais amalucados, sem vínculos com a alma popular, e noutra parte por bandidos com prontuários repletos de passagens delituosas. Esses aí não têm nada a ver com o resto. São casos, esses, sim, pra polícia resolver com o rigor recomendado pela lei.

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